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PREÇOS
Sojicultores devem viver dias difíceis a partir de agora devido ao aumento das safras nos EUA e na América do Sul
Soja cai, e o Brasil perde competitividade
MAURO ZAFALON
DA REDAÇÃO
As vantagens brasileiras no
mercado mundial de soja podem
começar a desaparecer. Os produtores trocam a euforia dos últimos anos por momentos de preocupação às vésperas de começar o
plantio nacional.
Nada é definitivo ainda no mercado, mas os números atuais colocam grande incerteza sobre um
setor que passou a ser o carro-chefe do agronegócio brasileiro
nos últimos anos. Somente em
2003 e neste ano o setor deverá gerar receitas externas de US$ 18 bilhões para o país.
Nos últimos anos, o Brasil só teve motivos para comemorar no
setor de soja. A safra dos Estados
Unidos -o líder mundial em
produção- teve quebras constantes, a China entrou no mercado com forte apetite e a seca na
Europa gerou uma demanda ainda maior pela oleaginosa. Até a
desvalorização do real auxiliou
nas exportações brasileiras.
Os estoques mundiais recuaram
para níveis perigosos. Esse quadro provocou forte alta nos preços e atraiu mais produtores para
o setor, principalmente no Brasil.
"Agosto ainda é mês de estimativas, mas os novos números indicam recordes de produção para a
safra 2004/5", diz Fernando Muraro, um dos especialistas nesse
setor e diretor da Agência Rural,
de Curitiba.
Safra mundial maior
Os Estados Unidos estão iniciando a colheita, e os números
indicam uma safra de 78,3 milhões de toneladas, próxima do
recorde de 78,6 milhões obtido
em 2001/2.
Na América do Sul, a safra vai
superar, pela primeira vez, o patamar de 100 milhões de toneladas.
Brasil e Argentina vão plantar 37
milhões de hectares, 150% a mais
do que na safra 1990/1.
E a China, país que desequilibrou o mercado mundial nos últimos anos devido ao volume importado, pôs um pé no freio nas
compras e promete uma safra recorde de 18 milhões de toneladas
para 2004/5.
Com tanta produção, a safra
mundial sobe para 223 milhões de
toneladas, 18% a mais do que a
anterior. O consumo fica em 209
milhões, com evolução de apenas
9%. Os preços reagiram e a Bolsa
de Chicago, a principal do mundo
nas negociações futuras de soja, já
indica queda de 43% nos valores
que devem ser praticados em
março de 2005 em relação aos
ocorridos no mesmo mês deste
ano.
Essa forte queda nos preços já é
evidente nas negociações brasileiras. Em agosto do ano passado,
pelo menos 35% da safra brasileira de 2003/4 (a que foi colhida em
março e abril deste ano) já tinha
sido negociada antecipadamente
pelos produtores. Neste ano, o
percentual de negociação da safra
2004/5 (a que vai ser colhida no
início de 2005) é de apenas 5%.
"Será um ano muito difícil", diz
Muraro. Afinal, só a América do
Sul deverá despejar 109 milhões
de toneladas de soja no mercado
no primeiro semestre do próximo
ano, afirma.
Menor área plantada
A queda nos preços da soja já
começa a influenciar a intenção
de plantio dos produtores. Prevista inicialmente em 23 milhões de
hectares, a área destinada à oleaginosa deve recuar para 22,6 milhões na safra 2004/5, afirma o
analista.
Alguns fatores pesam na decisão desses produtores. A sinalização da soja de US$ 5 a US$ 6 por
bushel (27,2 quilos) traria os preços para US$ 12 por saca em Paranaguá. Neste ano, o produto chegou a ser negociado a US$ 18,5 no
porto paranaense.
Os investimentos nas novas
fronteiras brasileiras começam a
ser de alto risco. Se os preços para
o próximo ano se confirmarem
baixos, os arrendatários de terra
terão prejuízo de R$ 150 por hectare. Já os proprietários de terra
empatam investimentos com receitas em R$ 1.350.
Outro fator preocupante na
produção de soja é o aparecimento de novas doenças. Foi caso da
ferrugem asiática, que se espalhou por praticamente todo o país
neste ano. Só no combate à doença os produtores tiveram gasto
extra de R$ 3 bilhões neste ano,
segundo cálculos da Consultoria
Céleres, de Uberlândia (MG).
Os produtores vão enfrentar,
ainda, custos bem mais elevados
neste ano do que em 2003. Os insumos acompanharam a alta da
soja, mas não devem cair na mesma intensidade. Adubos e fertilizantes tiveram elevação de 30% a
35%, diz Muraro.
Competitividade menor
Com a supersafra prevista e o
aumento dos estoques mundiais
-antes eram suficientes para
dois meses de consumo; agora são
para três-, o mercado de soja
volta ao patamar normal, antes do
"boom" provocado pela quebra
de safra nos Estados Unidos e a
elevação das compras chinesas.
Nesse patamar normal, no entanto, os brasileiros perdem competitividade. Grande parte da produção brasileira está distante dos
portos de escoamento, e os meios
de transportes são deficientes
-problemas que os norte-americanos e argentinos não têm.
Os norte-americanos têm, ainda, uma salvaguarda extra em relação a brasileiros e a argentinos:
os subsídios. "Se a China não voltar ao mercado e as estimativas de
safra se concretizarem, o mercado
terá uma nova formação de preços", diz Muraro.
O preço mínimo para os norte-americanos é de US$ 5 por bushel
(27,2 quilos). Toda vez que o produto é negociado por valor inferior a esse, o Tesouro norte-americano banca a diferença.
"Esperar para ver"
O analista de agronegócio José
Pitoli diz que os produtores brasileiros devem aguardar até o final
deste mês para decidir parte (pelo
menos 10%) do que plantar nesta
safra 2004/5. No final deste mês já
se terá uma visão melhor da safra
norte-americana, acrescenta.
Uma safra por lá acima de 78
milhões de toneladas, o que não é
descartado, vai derrubar os preços ainda mais.
Um volume inferior a 78 milhões de toneladas, o que também
é possível porque o clima registra
um frio acima do normal para este período do ano, também é possível. Nesse caso, os preços da soja
subiriam.
Na avaliação de Pitoli, se a safra
norte-americana não se confirmar, o produtor poderia optar pela soja. Caso os Estados Unidos
atinjam ou superem os 78 milhões de toneladas, o produtor,
principalmente o do Centro-Oeste, pode desviar parte de seu plantio para o algodão.
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