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PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
O poder dos bancos no Brasil
Interessa à economia ter um sistema bancário lucrativo. Mas, no Brasil, o poder dos bancos passou dos limites
ONTEM, RECEBI notícias das
barbaridades que estão
acontecendo nos bastidores
de um dos grandes bancos brasileiros. O meu sangue ferveu. Resolvi,
então, fazer no artigo de hoje algumas considerações sobre essas instituições.
Nas economias modernas, os bancos sempre são poderosos. No Brasil, entretanto, o poder dos bancos é
extraordinário e já constitui há muito tempo uma agressão ao interesse
público.
Os balanços dos principais bancos
privados e públicos, divulgados nos
últimos dias, mostraram lucros
muito volumosos, que chegam a ser
estarrecedores. Enquanto a maior
parte da economia brasileira patina
na mediocridade, enquanto a maior
parte dos brasileiros vegeta na pobreza ou na miséria, os grandes conglomerados bancários expõem resultados exuberantes. Exuberantes,
não. Nas circunstâncias do país, não
é exagero usar uma palavra mais forte: indecentes.
O que explica tal lucratividade? A
versão benevolente, que nem os
porta-vozes dos bancos se animam a
defender com muita convicção, é
que esses lucros refletem a sua excepcional eficiência e competência
como organizações empresariais. As
instituições bancárias brasileiras
têm os seus méritos, não nego, mas a
principal explicação é outra: os bancos detêm grande poder de mercado. São poucos os setores da economia com tanto poder e tanta lucratividade.
O sistema bancário é muito concentrado, e o grau de concentração
vem aumentando. Poucos bancos
detêm a quase totalidade dos ativos,
dos depósitos e do capital. Um punhado de instituições comanda o
mercado. A competição é imperfeita
e limitada. Os bancos têm poder de
mercado "vis-à-vis" dos seus depositantes, por exemplo, e conseguem
impor pesadas tarifas de serviços
bancários, especialmente aos pequenos clientes. Conseguem também praticar taxas elevadíssimas de
juro nos empréstimos que fazem a
empresas e pessoas físicas. As empresas de menor porte e as pessoas
físicas pagam taxas especialmente
selvagens.
O chamado "spread" bancário, isto é, a diferença entre as taxas de
empréstimo e as de captação, é muito alto. Em operações com recursos
livres, para pessoas jurídicas e físicas, o "spread" médio foi de 28 pontos percentuais em junho, segundo o
Banco Central. Nos últimos 18 meses até junho, esse "spread" manteve-se bastante estável, oscilando entre um mínimo de 27,6 e um máximo de 30,2 pontos percentuais. Como as taxas de captação também são
elevadas, o custo do crédito no segmento não-direcionado do mercado
fica muito pesado: 43,2% em média,
em junho, quase 40% em termos
reais! Essa é uma das principais razões do reduzido nível de investimento e crescimento da economia
do país.
O poder econômico dos bancos é
sustentado por ampla rede de influência política e ideológica. O comando do Banco Central, por exemplo, mantém há muito tempo uma
relação promíscua com o sistema financeiro. O famigerado Copom (Comitê de Política Monetária do Banco
Central) é uma espécie de comitê
executivo da Febraban (Federação
dos Bancos Brasileiros). Entra governo, sai governo e o quadro não
muda: a diretoria do Banco Central é
sempre dominada por pessoas que
vêm do sistema financeiro ou que
para lá desejam ir. A influência dos
bancos se estende para outros segmentos do Poder Executivo, como o
Ministério da Fazenda. Com freqüência, essas instituições conseguem obter tratamento tributário
leniente e concessões de outros tipos.
No Poder Legislativo, os bancos financiam campanhas e têm a sua
bancada. Na mídia, a sua presença é
sempre muito forte. A cada momento, o brasileiro indefeso é exposto às
"teorias" e explicações dos "economistas do mercado", uma verdadeira legião a serviço dos interesses do
sistema financeiro.
É óbvio que interessa a qualquer
economia moderna ter um sistema
bancário sólido e lucrativo. Mas, no
caso do Brasil, o poder dos bancos
passou dos limites e está prejudicando seriamente grande parte da
economia. Se o próximo governo
quiser realmente colocar a economia em movimento, não poderá deixar de enfrentar esse problema.
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR. , 51, economista e professor da FGV-EAESP, escreve às quintas-feiras nesta coluna. É autor do livro "O Brasil e a Economia Internacional:
Recuperação e Defesa da Autonomia Nacional" (Campus/
Elsevier, 2005).
pnbjr@attglobal.net
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