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Deficit externo é "herança maldita" de Lula
Depois de saldo favorável nas transações com o exterior de 2003 a 2007, rombo em 2010 deve atingir pior patamar da década
Presidente deixará para o
sucessor o mesmo problema
que criticou nos anos FHC;
analistas divergem se deficit
limita o crescimento ou não
SHEILA D'AMORIM
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Com as famílias e o governo
consumindo cada vez mais e
poupando pouco, o Brasil elevou a sua dependência do capital externo para conseguir realizar os investimentos de que
necessita. Isso significa que o
dinheiro estrangeiro será ainda
mais importante para o próximo presidente cobrir o saldo
negativo nas contas externas e
manter o país crescendo.
Depois de cinco anos com as
transações com o resto do
mundo fechando no azul, elas
voltaram a ser deficitárias no
fim de 2008. A situação se agravará neste último ano da gestão
de Luiz Inácio Lula da Silva. A
perspectiva para 2010 é, no mínimo, dobrar o rombo, repetindo o ritmo em 2011. Esse buraco precisa ser coberto por recursos que virão do exterior via
empréstimos, investimentos
produtivos e na Bolsa.
Segundo as projeções do
Banco Central, o deficit externo -que consolida as compras
e vendas de bens e serviços, pagamento de juros, viagens, doações e remessas de lucros- encerrará 2010 em US$ 40 bilhões (cerca de 2% do PIB), ante os US$ 22 bilhões (1,4% do
PIB) estimados em 2009.
Enquanto isso, os analistas
de mercado falam em deficit de
até US$ 64 bilhões (acima de
3,3% do PIB). Para 2011, as estimativas do setor privado são de
saldo negativo de até US$ 90 bilhões (4% do PIB).
Com isso, o Brasil retomará
um nível de dependência do capital externo semelhante ao
que vivia antes da gestão Lula e
que foi tachado pela equipe do
atual governo como uma "herança maldita".
Divisão
O aumento do deficit nas
contas externas divide especialistas. Alguns afirmam que isso
não será problema porque não
faltarão investidores interessados em aplicar no Brasil e o dinheiro será usado para investimentos que garantirão mais
crescimento econômico.
Outros, ao contrário, afirmam que a dependência externa será um limitador de crescimento no próximo governo e
constituirá a "herança maldita"
do governo Lula.
"Sem dúvida alguma, é um
problema deste governo que
ele deixará para o próximo", diz
Reinaldo Gonçalves, professor
de economia da Universidade
Federal do Rio de Janeiro.
Para ele, o Brasil tem dois
problemas estruturais graves:
uma ineficiência sistêmica, traduzida em falta de competitividade que afeta as exportações, e
também um enorme passivo
externo, "fruto da internacionalização que leva a volumes
elevados de remessas de lucros
e dividendos para o exterior".
Com isso, diz, o Brasil está
sempre sensível à conjuntura
internacional. "A economia fica
muito vulnerável, o que tem repercussão no crescimento e nas
expectativas por causa do risco
de volatilidade nas taxas de juros e de câmbio. O país continua patinando. A imprevisibilidade reduz os investimentos."
Cristiano Souza, economista
do grupo Santander, não vê
problema no deficit externo retomar patamares elevados.
"Não é algo negativo porque o
deficit está ligado a mais investimentos que vão sustentar o
crescimento futuro."
Darwin Dib, economista do
Itaú Unibanco, faz coro: "Se é
para ter mais investimento, o
país completará a escassa taxa
de poupança doméstica com
recursos externos. A ideia de
que isso é ruim é do século 17".
Ele e Souza dizem que hoje o
país tem um regime de câmbio
flutuante que ajusta desequilíbrios. "Se o mundo ficar menos
disposto a nos financiar, haverá
um ajuste cambial, com desvalorização do real", diz Dib.
Já a alta na remessa de lucros
e dividendos criticada por alguns, defende Dib, é reflexo da
mudança de padrão do financiamento externo. "Antes, era
focado em emissão de dívida,
que gerava pagamento de juros;
agora, temos investimentos estrangeiros diretos e em carteira. O custo disso é a remessa
de lucros e dividendos."
Professor do Departamento
Econômico da PUC-SP, Antônio Corrêa de Lacerda diz que
em 2010/11 não deverá haver
problema para financiar o deficit, mas, ainda assim, considera
a situação ruim. "Mais pela rapidez da deterioração do que
pelo tamanho do deficit externo." Para ele, o próximo presidente terá de atacar problemas
estruturais que fazem com que
remessas de lucro anulem ganhos com saldo comercial.
As exportações deverão superar as importações em US$
15 bilhões neste ano, valor insuficiente para compensar os US$
30 bilhões que deverão deixar o
país devido aos lucros obtidos
por empresas estrangeiras que
atuam no país e remeterão os
ganhos para suas matrizes.
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