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ESPECULAÇÃO
Ganho com títulos brasileiros no exterior é alto por
causa do deságio, afastando investidores de trazer dólares para o país
Dívidas dificultam queda dos juros
FERNANDO RODRIGUES
da Sucursal de Brasília
Se depender das cotações dos títulos brasileiros no exterior, o governo federal terá dificuldades para baixar os juros internos no país.
Apesar da alta das Bolsas de Valores na sexta-feira, os papéis de
empresas brasileiras no exterior
continuaram a apresentar cotação
abaixo do nível do final de 98 -e
muito mais abaixo do que há um
ano, em dezembro de 97, conforme mostra a tabela.
Quando a cotação dos títulos é
depreciada no mercado secundário, isso resulta num ganho muito
grande para quem investe nesses
papéis -considerando que os devedores honrarão as dívidas.
Como o ganho sobre títulos brasileiros está grande no exterior, isso atrai supostos interessados em
assumir algum risco relacionado
ao Brasil. É mais fácil assumir o risco lá fora do que aqui no país.
Além disso, agora os especuladores terão um risco a mais se trouxerem dinheiro para o Brasil e transformá-lo em reais: podem perder
na hora de sair, pois a variação do
real passou a ser imprevisível.
Trazer dólares para o Brasil e ganhar especulando no mercado financeiro só será vantagem quando
as taxas de juros estiverem muito
mais altas aqui do que as pagas por
papéis brasileiros no exterior.
No momento, vale mais a pena
para os especuladores ficar lá fora.
Se os juros caírem, a vantagem aumenta por causa do retorno oferecido pelos títulos do país emitidos
no exterior. O atual ganho maior
com aplicações em títulos brasileiros no exterior está ocorrendo porque o investidor compra o papel
com deságio, mas ganha os juros e
o principal pelo valor de face.
Por exemplo, a Sharp do Brasil
tem uma dívida de US$ 120 milhões que vence em 30 de outubro
de 2000, pagando 9,625% ao ano
de juros. Era possível comprar esse
papel por apenas 42% do valor de
face na última sexta-feira.
Com todo esse deságio, o papel
da Sharp rende para o seu comprador um retorno de 72,08% no ano.
Esse ganho é chamado, no jargão
do mercado, de "yield" (pronuncia-se "i-ild"). Além disso, se comparado a um título do Tesouro dos
EUA com mesmo prazo de vencimento, o papel da Sharp está pagando 67,45 pontos percentuais a
mais por ano -por causa do deságio no mercado secundário.
Essa diferença sobre os títulos
dos EUA é chamada de "spread"
(pronuncia-se "spréd"). O
"spread" é calculado em milésimos de pontos básicos. O "spread"
da Sharp é de 6.745 pontos.
A situação do Brasil é muito menos confortável do que a do México e a da Argentina. A tabela publicada hoje pela Folha traz a cotação
de 30 papéis brasileiros privados e
públicos. Desses, 26 títulos têm
"spread" acima de 1.000 pontos.
Na sexta-feira passada, a Merrill
Lynch cotou 50 papéis da Argentina e 69 mexicanos.
No caso da Argentina, dos 50 títulos cotados, apenas 17 têm
"spreads" acima de 1.000 pontos.
No México, de 69 papéis, 14 apresentaram "spreads" superiores a
1.000 pontos. No caso dos títulos
soberanos dos três países, a situação do Brasil também é ruim.
O título de 30 anos do governo do
Brasil que vence em 2027 está com
um "spread" de 1.116 pontos. O da
Argentina, com vencimento na
mesma data, paga um "spread" de
677 pontos. O do México, que vence em 2026, foi cotado com
"spread" de 504 pontos.
Álvaro Simões, diretor do Banco
Credit Agricole Indosuez, acha que
os "spreads" altos funcionam como um obstáculo para a queda dos
juros, mas não são o único problema. "As votações do ajuste fiscal
são fundamentais para que o clima
seja mais favorável", diz ele.
Para Jair Ribeiro Neto, diretor-executivo do Banco Patrimônio,
investidores especulativos que
aplicavam em renda fixa "já foram
embora". Por isso, a queda dos juros não teria um efeito imediato de
expelir do país quem procura ganho alto. Mas afastaria quem desejasse entrar.
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