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Clima mudará economia, diz pesquisador
Para analista, é muito difícil conciliar crescimento de países em desenvolvimento e redução de emissões em setores como aço
Kurt Reiman, do banco UBS,
diz que etanol do Brasil tem um "futuro brilhante", mas
que biocombustível não é solução para todos os países
Aly Song - 5.fev.07/Reuters
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Chaminés de usina de energia nos arredores de Shangai, na China |
CLÁUDIA TREVISAN
DA REPORTAGEM LOCAL
Reduzir as emissões de gases
que provocam o aquecimento
global e, ao mesmo tempo,
manter altos índices de crescimento dos mercados emergentes vai exigir mudanças de hábitos dos habitantes dos países
desenvolvidos, principais responsáveis pelo efeito estufa.
A afirmação é de Kurt Reiman, diretor de pesquisas temáticas do banco suíço UBS e
um dos autores de longo estudo
sobre os impactos econômicos
do aquecimento global publicado pela instituição em janeiro.
Reiman considera improváveis reduções significativas nas
emissões de gases por indústrias como aço e cimento, que
são grandes poluidoras, mas estão na base da economia global.
"Não dá para construir um prédio sem cimento e aço. É parte
do desenvolvimento", diz.
A seguir, trechos da entrevista concedida à Folha, por telefone, de Zurique, na Suíça:
FOLHA - Qual é o impacto econômico da mudança climática?
KURT REIMAN - A compreensão
do impacto econômico é algo
que ainda está em um estágio
inicial. A maioria dos estudos
acadêmicos mostra que impacto é cada vez mais negativo na
medida em que aumenta a temperatura global. Uma grande
mudança climática é geralmente associada a um maior impacto em termos de redução do nível do PIB global em algum momento do futuro.
FOLHA - E quão distante esse "momento do futuro" está?
REIMAN - Isso não está sempre
especificado. O que podemos
dizer é que os trabalhos acadêmicos apontam que a direção é
negativa e que esse valor negativo cresce na medida em que
as temperaturas sobem.
FOLHA - Quais os setores mais vulneráveis à mudança climática?
REIMAN - É difícil dar a gradação exata das indústrias que seriam mais afetadas pela mudança climática. Mas podemos
identificar aquelas para as
quais as mudanças climáticas
seriam positivas ou negativas.
Regulações devem emergir
com o objetivo de enfrentar esse problema [aquecimento global]. Elas estimulam mudanças
de comportamentos, e o efeito
dessas mudanças se espalha
por toda a economia, com impacto no modelo de negócios de
várias indústrias.
Há oportunidades e riscos.
Existem riscos físicos, como o
maior nível do mar, que pode
ameaçar atividades imobiliárias no litoral. Algumas empresas nos EUA decidiram não fazer seguro para imóveis na Flórida, como resultado direto da
mudança climática. É uma região que seria inundada em caso de aumento do nível do mar.
FOLHA - E quais os setores com
maior risco de enfrentar regulações
mais rigorosas?
REIMAN - Nós dividimos o ambiente regulatório em duas categorias. Primeiro, os emissores diretos, como geradores de
energia e produtores de aço, cimento, alumínio e papel. Esses
são grandes emissores de gases
que provocam o efeito estufa e
são facilmente identificáveis
por reguladores e agências que
tentam reduzir as emissões.
Gerar eletricidade, produzir
aço, cimento, todas essas coisas, só por sua natureza, envolvem a emissão de gases. Órgãos
regulatórios viram isso e decidiram minimizar emissões por
meio da regulação.
Outro tipo de emissor são os
pequenos, múltiplos e de difícil
identificação: seu carro, sua casa, equipamentos eletrônicos.
Do ponto de vista regulatório,
eles não são facilmente identificáveis e são administrados de
maneira diferente.
Reduzir emissões de transporte rodoviário envolveria
coisas como padrões de emissões para os carros e taxas sobre combustível. Coisas que
poderiam incentivar as pessoas
a usar o transporte público.
FOLHA - Os setores que o sr. mencionou, como aço, cimento e energia, estão na base da economia global. É possível obter uma redução
significativa de gases sem afetar o
ritmo de crescimento mundial?
REIMAN - Nós olhamos para as
indústrias de cimento, aço e de
outros grandes emissores e
concluímos que é muito difícil
ter o crescimento econômico
projetado para os países em desenvolvimento e, ao mesmo
tempo, reduzir emissões desses
setores. Se há aumento de demanda, é necessário ter ganhos
de eficiência mais do que suficientes para compensar esse
aumento, para se obter uma redução nas emissões de gases.
Não vemos isso como provável em nossos cenários. Esse fato coloca o ônus da redução em
áreas em que há potencial para
ela, em que há soluções tecnológicas e em que há oportunidades para mudar o comportamento das pessoas e criar incentivos para que elas façam as
coisas de maneira diferente.
Não dá para construir um
prédio sem cimento e aço. É
parte do desenvolvimento. Parece muito improvável reduzir
emissões de cimento e aço e ter
grande crescimento econômico. São coisas incompatíveis.
FOLHA - Como o sr. vê o uso de etanol como combustível, área em que
o Brasil tem particular interesse?
REIMAN - Etanol tem um futuro
brilhante como combustível. A
quantidade de gasolina que
existe para ser substituída é
enorme. Mas biocombustíveis
não podem ser a solução para
todos os países no seu formato
tecnológico atual. Não é possível para todas as regiões do
mundo produzirem esse tipo
de combustível de uma maneira que tenha um custo viável e
permita redução de emissões.
Também há questões relativas ao suprimento de alimentos e ao potencial de desmatamento pelo uso de plantações
para fabricar combustíveis. Se
tivermos que cultivar mais terra e cortar mais árvores para ter
combustível, isso não é sustentável no longo prazo.
FOLHA - Existe um "investidor verde", que busca produtos relacionados à preservação ambiental?
REIMAN - Há uma demanda
crescente por produtos que
ofereçam soluções para a mudança climática. A regulação e
os produtos andam lado a lado.
Nos EUA, houve um impacto
no número de companhias que
lançaram ações no ano em que
o presidente Bush anunciou
que etanol seria um combustível importante. Esse tipo de
produto vai ficar cada vez mais
disponível, à medida que a regulação fique mais rigorosa.
FOLHA - Como conciliar a redução
de emissões com a emergência econômica de China e Índia, que têm
40% da população mundial?
REIMAN - O crescimento da
renda per capita de países em
desenvolvimento superpopulosos vai elevar o uso de energia, se trabalharmos com a continuidade do cenário atual. O
principal motor do uso de energia nas próximas décadas será a
expansão de países em desenvolvimento. É possível reduzir
emissões e ter crescimento da
renda per capita nos países
emergentes? A resposta é sim.
FOLHA - Como?
REIMAN - A primeira questão é
o uso de energia, que deve aumentar em termos per capita
no cenário em que nada é feito.
Se isso ocorrer, o volume de
emissões subirá muito.
O uso de energia e as emissões são intimamente relacionados, porque a queima de
combustíveis fósseis responde
por 80% do total da energia utilizada. E a produção de energia
responde por cerca de 60% das
emissões de gases que causam o
efeito estufa. A ligação é clara.
Se você tem elevação do uso
de energia per capita nesses
países em desenvolvimento
muito dinâmicos, isso vai aumentar as emissões. Mas é possível ter crescimento na utilização de energia em mercados
emergentes e haver uma redução global de emissões se houver um correspondente ganho
de eficiência no uso de energia
no mundo desenvolvido que
compense esse movimento.
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