São Paulo, domingo, 18 de março de 2007

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VINICIUS TORRES FREIRE

Lula e o conservadorismo de coalizão


Festa no apê do PMDB é só a volta ao padrão de escambo que estabiliza a fratura social, política e econômica do país

LULA LEVOU quatro anos para fazer o curso básico de direção do Congresso. Sem carteira de motorista e turbinado pelo gás da boquinha petista, Lula 1 bateu no poste do mensalão, que ele mesmo plantara em seu caminho.
A predominância do PT no ministério de Lula 1 só não superou a do PMDB no governo Sarney. Mas então o PMDB dominava o Congresso e todos os Estados menos um, vitorioso que fora em 1986 graças ao estelionato eleitoral do Cruzado.
O ministério de Lula 2 é a redistribuição mais ponderada de cargos entre os partidos que lhe prometem votos no Congresso, em especial para o PMDB, o único dos partidões que não faz oposição maciça a Lula.
A probabilidade de um governo ser mais instável aumenta quando o partido do presidente é minoritário e leva ministérios demais. Bidu.
Sim, trata-se de conhecimento cediço para os práticos em política brasileira, além do mais documentado pela literatura acadêmica. Sim, José Dirceu sabia disso. Logo após a eleição de Lula, costurava com o PMDB serrista, que tinha Michel Temer como porta-voz.
Dirceu entregou de público dois ministérios ao PMDB, Minas e Energia e Integração Nacional. Foi desautorizado pelo presidente eleito. Lula então era instigado por Roberto Requião e José Sarney.
Em janeiro de 2004, Lula e o PT fecharam um escambo de ministérios por alianças políticas para a eleição municipal. O PMDB levou Comunicações e Previdência, mas se queixava de que era pouco.
Depois que se descobriu que o governo e o PT arrendavam deputados de PL, PP e PTB, Lula teve de engolir os sapos peemedebistas que antes cuspira em Dirceu. No escambo de julho de 2005, desandava o monopólio petista. Na reforma ministerial deste ano, o PMDB levou Minas e Energia e Saúde, além de ficar nas Comunicações. O PT, das 20 pastas do início de Lula 1, caía para 14.
Só agora o petismo-lulismo dá prioridade a um escambo político satisfatório. A ala tucana do PMDB enfim leva a Integração Nacional, prometida por Dirceu em 2002. Mas o vício do arrendamento mercantil do mensalão passou? Por que o PR, ex-PL mensaleiro, cresce tanto?
E daí? Nada, ou quase isso, em termos de políticas públicas:
1) As idas e vindas de ministros pouco afetaram o vetor principal das políticas, definidas pelo presidente e por seus economistas;
2) O governo sempre acaba por conceder títulos de nobreza e partes menores do patrimônio ao caciquismo, forma política da fragmentação regional e socioeconômica do país;
3) Conflitos centrais sobre a divisão de fundos públicos e a regulação dos fluxos privados de renda são decididos em várias esferas, não necessariamente no Congresso e ainda menos nos ministérios. Vide o poder de Banco Central, BNDES, estatais e fundos de pensão, agências reguladoras e partes da burocracia. Setores sociais negociam no Congresso e com tais blocos do Estado;
4) Cooptar partidos com ministérios é fazer o seguro da estabilização desse sistema. A médio prazo, reformas políticas não dariam conta do retalhamento do governo, que é a expressão de um problema social e político real. E também do "conservadorismo de coalizão" brasileiro.

vinit@uol.com.br


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