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BENJAMIN STEINBRUCH
Ilhas de prosperidade não existem
O mais apropriado,
em um momento como este, é tratar de
fortalecer o mercado interno
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VIVEMOS tempos de ansiedade.
No momento em que o Brasil
comemora os 5,4% de crescimento do PIB (Produto interno
Bruto) do ano passado, há uma crescente certeza de que a economia
americana foi atingida. A dúvida
agora é sobre a profundidade dessa
crise e os efeitos que ela terá na Ásia
-leia-se, principalmente, China- e
por aqui.
Nem os mais sábios arriscam previsões. É sintomático observar que o
ilustre colunista do "Financial Times" Martin Wolf terminou seu artigo da semana passada sugerindo
que "precisamos rezar" para que o
banco central dos Estados Unidos, o
Fed, possa colocar tudo em ordem.
Antes de chegar a essa conclusão,
Wolf enumerou estimativas variadas sobre o volume de perdas que serão provocadas pela crise das hipotecas americanas, desde os US$ 100
bilhões sugeridos por Ben Bernanke
(um número claramente superado)
até os US$ 500 bilhões citados pelo
Goldman Sachs e os US$ 2 trilhões a
US$ 3 trilhões pelo professor Nouriel Roubini, da Universidade de Nova York.
Há uma enorme diferença entre
essas estimativas. Dependendo do
valor das perdas e da forma como
elas serão absorvidas, a economia
global será mais ou menos machucada. Poderá haver prejuízos e quebras em massa nos EUA ou inflação
-ou ambas as coisas ao mesmo tempo. Em qualquer hipótese, a tendência do consumidor americano será
contrair gastos, com efeitos evidentes na demanda mundial.
Enquanto essa discussão se desenvolve, nós por aqui seguimos
com a economia em alta e forte crescimento da produção industrial e do
emprego, como atestam os números
do primeiro bimestre. Os preços das
commodities industriais e agrícolas,
que exportamos em grande escala,
seguem também em alta, a ponto de
alguns analistas já apontarem a existência de uma bolha especulativa
nesse setor.
Nesse cenário, não se pode mais
uma vez incorrer no erro, como se
fez em crises passadas, de achar que
o Brasil é uma ilha de prosperidade.
Ilhas econômicas já não existiam no
século passado, quando o Brasil foi
nocauteado pelas crises do petróleo,
muito menos existem hoje, com o
avanço da globalização.
Mas há algo que pode atenuar os
efeitos dessa crise. Foram bem-vindas as medidas da semana passada,
quando o governo procurou desestimular o ingresso de capital estrangeiro para aplicações de curto prazo
e elevar a lucratividade das exportações. Não há segurança de que essas
medidas poderão produzir os efeitos
desejados, até porque a política monetária segue na direção contrária,
mas o simples fato de adotá-las é um
sinal importante, porque mostra intenção de agir e repulsa à perigosa
teoria da "ilha de prosperidade".
O mais apropriado, em um momento como este, é tratar de fortalecer o mercado interno. No ano passado, como mostraram os dados do
PIB, o mercado interno já foi o suporte do crescimento. A demanda
interna contribuiu para uma expansão de 6,9% no produto, enquanto a
externa influiu negativamente em
1,4%. O consumo das famílias, por
sua vez, aumentou 6,5%. Diante dessa tendência, os investimentos para
atender à demanda aquecida reagiram e cresceram 13,4%.
Fica claro, portanto, a importância do mercado interno brasileiro.
Sua preservação pode atenuar os
efeitos da crise externa e, para isso, o
caminho é cuidar da manutenção do
emprego, da renda e do crédito. Como fazer isso? Com redução do custo do dinheiro e com aumento da
eficiência dos gastos do governo para poder dar prioridade a investimentos públicos.
BENJAMIN STEINBRUCH , 54, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp.
bvictoria@psi.com.br
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