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VINICIUS TORRES FREIRE
Ajudar um bancão: não tem preço
Para o Fed, despejar dinheiro e baixar juro já não basta: "o importante é participar" e ficar com uns papéis podres
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DAR DINHEIRO público ou deixar quebrar não parece mais
a alternativa em debate nos
EUA. A discussão agora é a respeito
dos recipientes do dinheiro: bancos
e/ou compradores de casas?
Um senador democrata dedou ontem que o governo dá tratos à bola
para permitir que empresas quase-estatais de crédito imobiliário expandam os empréstimos. Oferecer
mais crédito pode ajudar a conter a
depreciação dos imóveis, o que estimula calotes, desvaloriza papéis
imobiliários etc. Refinanciar dívida
antiga do consumidor é outra opção.
Mas ontem ficaram mais estridentes os pedidos para que o governo (o Tesouro ou o Fed) compre papéis podres dos bancos. Como isso é
estrambótico, ainda mais em ano de
recessão e eleição, a alternativa é o
Fed, o Banco Central dos EUA, "garantir" tais papéis, oferecendo empréstimos "sine die", sem data certa
de pagamento, em troca da papelada. O Fed não precisa vender tais títulos na xepa, como as instituições
financeiras têm sido obrigadas a fazer a fim de levantar dinheiro.
No que diz respeito à finança, na
prática o Fed já adotou a segunda alternativa. Primeiro, de forma tímida, por meio de um redesconto disfarçado e mais em conta, a "Term
Auction Facility", que o Fed vai renovando. O redesconto "oficial" dos
BCs é onde bancos tomam empréstimos caros para cobrir buracos de
caixa temporários e excepcionais.
Na semana passada, o Fed marcara para o dia 27 o início da oferta de
troca (empréstimo temporário) de
títulos da dívida pública, do Tesouro, os "treasuries", por papéis imobiliários que ninguém quer -os "treasuries" servem de garantia para empréstimos no mercado. Essa "Term
Securities Lending Facility" ajudaria agentes de mercado do Fed
("dealers", como bancos de investimento que cheiram queimado).
No domingo, o Fed enfim abriu o
redesconto para bancos de investimento (como o Bear, que quebrou,
como Lehman, Goldman etc). No
domingo ainda emprestou US$ 30
bilhões para o Bear, devorado pelo
JPMorgan, a fim de cobrir eventual
depreciação dos papéis do banco
-se os papéis perdem valor, o prejuízo fica no Fed, não no JPMorgan.
Um probleminha adicional é que
os títulos podres já não são apenas
aqueles lastreados por hipotecas de
segunda ("subprime"), mas também
aqueles que dependem de hipotecas
menos tóxicas, de empréstimos
concedidos para aquisições de empresas, de empréstimos pessoais sacados contra o valor da casa etc.
O socorro do Fed, porém, não dá
conta do fato de que a engrenagem
da recessão já começou a girar. Muitos consumidores americanos simplesmente quebraram depois de
anos de superendividamento. Outros quebrarão, pois o desemprego
cresce. Quebrados não pagam dívidas, arrebentam ainda mais a banca,
e consomem menos, avariando as
por enquanto saudáveis empresas
americanas. O "grande resgate" do
sistema financeiro poderia, sim, evitar ou atenuar novas ondas de contágio da economia "real" pela ruína
da finança. Mas se desconhece o tamanho do dano que a crise financeira já provocou no "mundo real".
É aí que mora o perigo para economia como o Brasil. Um colapso profundo no consumo americano vai
espalhar brasa da China até nós.
vinit@uol.com.br
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