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OPINIÃO
Prever o passado...
DAVID ZYLBERSZTAJN
ESPECIAL PARA A FOLHA
NO CALOR de uma até
então improvável "popularização", ninguém
poderia imaginar que a questão
dos royalties e das participações especiais no setor de petróleo e gás tornar-se-ia o centro das grandes discussões e
querelas nacionais.
Para ajudar a fundamentar
esse embate e melhor entender
esse imbróglio, algumas considerações são necessárias.
Até a promulgação da lei
9.478 (Lei do Petróleo), em
1997, a única participação governamental eram os royalties,
cobrados pela alíquota de 5%
do valor da produção bruta, ou
seja, preço do barril de petróleo
bruto vezes a produção. Nessa
época, essa produção era de
cerca de 1 milhão de barris/dia
a preços médios de meros US$
14 o barril.
Com a Lei do Petróleo, o valor dos royalties dobrou, passando de 5% para 10%. Além
disso foram criadas as participações especiais, cobradas de
campos de alta produção, por
meio de uma alíquota variável
(de até 40%) da receita líquida
do campo.
Então, o que ocorre hoje, se
comparamos com a época em
que nossos parlamentares discutiram a Lei do Petróleo?
1) O preço do petróleo está
cinco vezes maior (já chegou a
US$ 150 em 2008);
2) a produção foi duplicada,
estando, em média, nos dias de
hoje, em 2 milhões de barris
diários.
Isso significa que, apenas
considerando os royalties e o
volume de produção, temos um
montante, um valor, dez vezes
maior. Levando em conta que
os valores da participação especial, atualmente, são mais expressivos que os royalties, começamos a compreender a fúria retroativa da maioria do
parlamento sobre um sistema
que o próprio parlamento havia
estabelecido.
A título de comparação, em
1997, as participações governamentais foram de R$ 200 milhões, enquanto em 2008 esses
valores ultrapassaram os R$ 22
bilhões. Em outros termos, em
dez anos o valor desses impostos cresceu mais de cem vezes!
Quando o governo encaminhou ao Congresso as propostas de modificação do modelo
atual de concessões (alterações
completamente desnecessárias, mas isso já foi mote de artigos anteriores), a Câmara dos
Deputados pouco se importou
com as alterações conceituais
dos modelos. Não se tem notícia de nenhuma discussão edificante ou que representasse os
interesses dos cidadãos.
No entanto, avançou ferozmente no valioso butim, como
salteadores do dinheiro alheio.
O demagógico discurso de redistribuição dos recursos por
meio de sua pulverização é risível. O saudoso Mário Covas dizia que, se você tem um saco de
pólvora, utilize o máximo de
pólvora para poucos tiros. Se
você dividir essa mesma pólvora com colherinhas de café, você não conseguirá sequer matar
uma formiga.
Ou seja, o que hoje forma um
robusto Orçamento para os Estados produtores será transformado em poeira, sem beneficiar ninguém, diluído na burocracia e na politicagem mesquinha. E é inacreditável imaginar
um Congresso que revogue leis
em caráter retroativo!
As explicações sobre a finalidade dos royalties e das participações especiais já foram fartamente discutidas nesta e em
muitas outras folhas. O que importa neste momento é o precedente de uma inusitada decisão da Câmara, que, além de
tungar o Rio de Janeiro e o Espírito Santo, demonstra o caráter rasteiro de uma medida que,
se aprovada, escancara as portas para que, daqui para a frente, não valha o que está escrito.
DAVID ZYLBERSZTAJN , 55, engenheiro, doutor
em economia da energia pela Universidade de
Grenoble (França), foi secretário de Energia de
São Paulo (governo Covas) e diretor-geral da ANP
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