São Paulo, domingo, 18 de maio de 2008

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Desonerar é melhor que fundo, diz Jorge

Ministro defende uso do excedente do superávit primário para corte de tributos, em vez da aplicação no fundo soberano

Miguel Jorge estima que o país terá saldo comercial de US$ 25 bi a US$ 30 bi neste ano e que as exportações chegarão a US$ 180 bi


AGNALDO BRITO
DA REPORTAGEM LOCAL

O ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge, sugeriu, em entrevista à Folha, que o governo use a receita excedente do superávit primário (economia feita para pagamento de juros) para cortar tributos, e não para criar um fundo soberano. Na última segunda, o presidente Lula anunciou um pacote de R$ 21 bilhões em desoneração para o setor industrial.
No dia seguinte, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, fez uma apresentação do fundo soberano. A idéia é usar os recursos economizados além dos 3,8% do PIB (compromisso atual do superávit primário) para a formação do fundo, que tem entre seus objetivos financiar a internacionalização de empresas brasileiras. Miguel Jorge disse que ainda não entendeu o funcionamento do fundo. A seguir os principais trechos da entrevista.

 

FOLHA - O sr. já entendeu como o fundo soberano vai funcionar?
MIGUEL JORGE
- Não está claro ainda o funcionamento do fundo, sobre como vai ser usado ou quem poderá usá-lo. Uma coisa que foi dita é que esse dinheiro seria dado ao BNDES para que o banco financiasse a empresa. Não sei como vai funcionar.

FOLHA - O governo afirma que o excedente do superávit primário será a principal fonte para a formação do fundo soberano. O sr. acha que essa sobra poderia ser usada para ampliar a desoneração, em vez ir para o fundo?
JORGE
- Poderia, poderia. Mas depende do que se pretende fazer com o dinheiro excedente do superávit primário.

FOLHA - O sr. vai propor isso, caso o governo de fato tenha como objetivo usar a economia além dos 3,8% de superávit primário como fonte para o fundo soberano?
JORGE
- Não está claro como será, mas, se for para esse caminho [de usar o superávit para o fundo soberano], acho que proporíamos, discutiríamos isso com o ministro da Fazenda. Mas precisamos ver ainda os efeitos da desoneração que foi feita. Você pode fazer a desoneração e não ter efeito nenhum. Então, para que vai ampliar a desoneração? Se houver efeito grande, poderemos discutir essa possibilidade de ampliar a desoneração. No início do ano passado, essa discussão sobre desoneração era muito difícil, a arrecadação era muito menor.

FOLHA - Por que o governo só desonerou a folha de pagamento da indústria de tecnologia da informação? Por que não foi mais ampla?
JORGE
- Não podemos fazer isso para bens industriais, isso traria problema ao país lá fora pelas regras da OMC. Só podemos fazer isso para o setor de serviços. E escolhemos o setor de tecnologia da informação porque é uma área capaz de disseminar conhecimento e inovação. Este é o ponto central para redução de custos nas empresas de tecnologia.

FOLHA - O governo teme a concentração dos recursos disponíveis na nova política industrial por setores organizados, como o automotivo?
JORGE
- Essa é uma questão interessante, que precisa ser observada e certamente fará parte das obrigações da gestão que estamos criando. Durante a semana, foram apresentados projetos de investimento ao conselho de administração do BNDES. Dos 20 projetos, só 1 era do setor automobilístico.

FOLHA - O governo teme apropriação de recursos concentrada?
JORGE
- Não chegamos a pensar nisso, porque a idéia é premiar todos, e não um setor. Teremos um acompanhamento próximo e discussões muito abertas. Os setores mesmos serão vigilantes e os próprios concorrentes ficarão de olho. Não acho que haverá concentração. De qualquer forma, a secretária-executiva que acompanhará a gestão da nova política ficará atenta a isso.

FOLHA - A tendência atual da balança comercial é de queda livre. Há alguma expectativa do governo de que a nova política industrial possa segurá-la ainda neste ano?
JORGE
- A política industrial não tem como objetivo de curto prazo reverter o resultado da balança comercial. Achamos que pode ajudar, mas não foi feita para isso. Estamos com algumas questões na balança comercial hoje que não devem se repetir em 2009. É o caso das importações de petróleo. Há neste momento um déficit superior a US$ 2 bilhões na balança do petróleo. Projetado, teremos um déficit de US$ 8 bilhões a US$ 10 bilhões no ano.

FOLHA - Qual a meta que o governo trabalha então?
JORGE
- Para as exportações, temos uma meta de US$ 180 bilhões neste ano. A minha expectativa é que tenhamos um saldo comercial de US$ 25 bilhões a US$ 30 bilhões no ano.

FOLHA - O que o governo fará para garantir que os R$ 210 bilhões previstos para desembolsos do BNDES até 2010 cheguem também ao pequeno e médio empresários?
JORGE
- A maior parte dos recursos será negociada diretamente com o BNDES, principalmente para os planos de investimento. Dos R$ 210 bilhões, cerca de 70% será liberado pelo banco. Mesmo para o pequeno empresário. O grande problema da pequena e média empresa não é chegar ao BNDES, há dificuldades nos bancos privados também. O problema está na falta de oferta de garantias e de plano de governança nessas empresas. Hoje, com Basiléia 2 [que redefine a exposição ao risco de crédito pelos bancos], há condições muito restritas para as instituições concederem financiamento para as pequenas e médias, -às micro, então, nem se fala.


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