São Paulo, domingo, 18 de maio de 2008

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Brasileiro de Wall Street retorna ao país

Executivos do mercado financeiro trocam Nova York por São Paulo atraídos por oportunidades ou repelidos pela crise

Enquanto salários em Manhattan são diluídos por dólar desvalorizado e alto custo de vida, bancos no Brasil ampliam benefícios


DANIEL BERGAMASCO
DE NOVA YORK

DENYSE GODOY
DA REPORTAGEM LOCAL

A corrente de brasileiros em Nova York que têm voltado à terra natal -em geral fugindo dos salários mais baixos e da perda de suas casas por execução de hipotecas- tem incluído nos últimos meses um grupo de trabalhadores mais graduados.
São os profissionais do mercado financeiro, que se tornam exceção no fluxo por voltarem especialmente motivados por boas notícias.
O crescimento do PIB (5,4% no ano passado, o maior desde 2004) e o ingresso de mais empresas no mercado financeiro nacional aumentam a demanda por profissionais treinados em Wall Street, onde sofrem atualmente os efeitos da crise econômica detonada em agosto de 2007 pelo colapso do financiamento imobiliário, que apertou muito o mercado de trabalho.
"Estou bastante inclinado a ir ao Brasil e aproveitar essa fase boa. Há muito campo para crescer junto com a expansão da economia", diz Marcello Hallake, 38, carioca que vive há 31 anos fora do país.
Formado em direito, consultor de empresas para transações financeiras internacionais no escritório Thompson & Knight, Hallake diz que seus colegas que já fizeram a troca não se arrependeram. "Os que já foram estão bem. O Brasil tem atraído empresas para o mercado financeiro e isso favorece quem quer oferecer um trabalho mais sofisticado, serviços que temos aqui [nos EUA], mas não existem lá." Para ele, assim como para outros profissionais que pensam em voltar ouvidos pela Folha, a violência no Brasil é a maior desvantagem sobre Nova York, onde não costuma ser problema andar na rua com iPods, Rolex e notebooks à mostra.
Já a lista de vantagens de deixar Nova York inclui os valores de moradia. Enquanto no bairro de Pinheiros, em São Paulo, o aluguel mensal médio de um apartamento de 80 m2 é de R$ 1.220, segundo o Secovi (o sindicato da habitação), uma quitinete de 20 m2 em Manhattan raramente sai por menos de US$ 1.500 (cerca de R$ 2.500) ao mês e há apartamentos de um quarto de US$ 1,5 milhão nas áreas mais nobres.
As despesas e a desvalorização do dólar diluem as vantagens dos salários pagos em Wall Street -entre US$ 150 mil e US$ 200 mil anuais para um profissional médio, além de bônus que chegam aos seis dígitos. Na ânsia de atrair tais profissionais para o país, bancos e corretoras estabelecidos no Brasil estão oferecendo pacotes de remuneração que podem chegar a US$ 2 milhões por ano -a parte variável é inflada pelo bom desempenho dessas companhias.
Soma-se a isso o temor do desemprego. Nos primeiros dez meses de crise, 49 mil vagas foram extintas em Manhattan pelas grandes instituições financeiras. O Citigroup fechou 15.200 vagas, o Merrill Lynch, 5.220, e o Lehman Brothers, 4.990. Este último exemplifica bem a gangorra -enquanto demitiu funcionários em Nova York, abriu escritório no Brasil, comandado por executivo vindo de Manhattan.
A obtenção do grau de investimento pelo país no final de abril e a fusão da Bovespa e da BM&F (Bolsa de Mercadorias & Futuros), que criará a segunda maior Bolsa das Américas e a terceira do mundo, devem amplificar o fenômeno por chamar ainda mais a atenção dos estrangeiros para o mercado financeiro local.

Saideira
Claudio Oskenberg, também nascido no Rio de Janeiro, retornou ao Brasil no ano passado, pouco antes do início da crise e depois de três anos em Nova York. Ele se diz satisfeito com a escolha.
"A temporada em Nova York foi ótima para aprimoramento, para entender como funcionam grandes escritórios nos Estados Unidos. Voltei por uma questão pessoal", diz ele, que dá consultoria a empresas brasileiras interessadas em acessar o mercado americano.
"Em Nova York as pessoas não são tanto de almoçar juntas, não têm muita sociabilidade. As pessoas estão ali de passagem, focadas apenas em ganhar dinheiro. No Rio, a maioria é carioca. Já em São Paulo, existe um equilíbrio entre ser cosmopolita, mas ainda assim em um ambiente um pouco mais à vontade."


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