São Paulo, domingo, 18 de agosto de 2002

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EM TRANSE

Alta do dólar e tensão eleitoral levam bancos, consultorias e empresários a refazer para baixo estimativas do PIB

Projeções minguam e país deve crescer só 1%

FÁTIMA FERNANDES
ADRIANA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

As projeções de crescimento da economia brasileira mais uma vez são revistas para baixo. Bancos, consultorias econômicas e empresários refizeram seus cálculos na última semana e consideram agora que o país tem chance de crescer algo perto de 1% neste ano, 2,5 pontos percentuais menos do que o mercado previu para 2002 logo no início do ano.
A situação está tão nebulosa que há instituições, como o Unibanco, que nem sequer arriscam novos números agora. Preferem aguardar os dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) que saem no dia 30 deste mês.
O que levou os economistas a rever o número que mede o ritmo de atividade do Brasil é o movimento de alta do dólar somado à ansiedade criada no mercado em relação à condução da política econômica pelo novo governo, subida da inflação, demanda contraída e expectativa de que a economia internacional vai continuar travada -ruim, portanto, para as exportações.
Bancos e consultorias ouvidos pela Folha estão mais pessimistas por causa do sufoco financeiro pelo qual passam as empresas, especialmente as que têm dívidas em dólar e/ou são dependentes de matérias-primas importadas.
Apenas nos últimos 30 dias -de 18 de julho até agora-, o real perdeu 9,5% de seu valor. O que torna mais caro os insumos cotados em dólar. O crédito também está mais escasso -o corte para as empresas, em média, é da ordem de 20%- e as taxas de juros estão mais altas -mais um inibidor de produção, consumo e investimentos.
Se as empresas ficam com as finanças espremidas, elas produzem menos. Se o ritmo da fábrica diminui, a possibilidade de demissões aumenta. Sem emprego, o consumidor não compra e, portanto, a economia não cresce. "Estamos bem no olho do furacão. A previsão para este semestre não é animadora", diz Fábio Silveira, economista da MB Associados.
A MB Associados prevê agora crescimento de 1,3% para o PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro. Duas semanas atrás projetava 1,8%. O grupo de conjuntura da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) considera algo perto de 1% e não mais 1,3%, como na previsão anterior.
Há instituições um pouco mais otimistas. O Citibank reduziu de 2,3% para 1,8%. O Lloyds reviu para 1,5% e o BBV, para 1,7% -a projeção anterior dos dois era 2%. "Esse ainda é um dado preliminar. Estamos esperando os números do IBGE neste final de mês para finalizarmos nossa estimativa", diz Octávio de Barros, economista-chefe do BBV. O IBGE divulgará dados sobre o volume do PIB no segundo trimestre.
O relatório Focus do Banco Central de julho reviu para baixo o crescimento do PIB para este ano. A projeção média, que estava acima de 2%, mudou para 1,8%. Esse número é resultado da média das projeções de cinco instituições financeiras que mais acertaram nas projeções anteriores.

Incertezas
"A alta do dólar é a manifestação de incerteza que vive o país. Significa que os bancos e os investidores estrangeiros estão tirando dinheiro do Brasil. Sem financiamento externo, teremos de fazer um ajuste mais rigoroso, mais duro. Isso significa que a produção neste semestre deve ser menor do que a do primeiro, o que é atípico", diz Francisco Eduardo Pires de Souza, coordenador do grupo de conjuntura da UFRJ.
Souza reforça a questão da produção porque é um termômetro de peso na formação do PIB de um país. Dados da FGV (Fundação Getúlio Vargas) mostram que a ociosidade das indústrias ainda é elevada -está em 20,4%; um ano atrás, no auge da crise energética, a taxa era menor (19,1%).
Uma entre cada três companhias no país informou, em julho, que o nível de demanda estava fraco. Em abril, duas entre cada dez afirmavam a mesma coisa. Esses dados fazem parte de levantamento da fundação feito com 1.220 empresas em julho.
A produção é mais elevada no caso dos setores exportadores, como siderúrgico, máquinas e alimentos. "O setor agrícola exportador deve sair ileso dessa crise", afirma Silveira.
A situação mais confortável para os exportadores de soja, suco de laranja e açúcar, que têm quase um mercado cativo lá fora, entretanto, não contribui para substancial elevação do PIB. Isso porque houve queda no preço de vários produtos exportados e, mesmo que exista crescimento no volume enviado para fora, nem sempre há elevação na receita obtida com a exportação.
"O desempenho está melhor do que o esperado para alguns setores exportadores, mas isso está longe de garantir crescimento econômico", diz Odair Abate, economista-chefe do Lloyds.

Queda das importações
Até a terceira semana de julho, a balança comercial acumulava um superávit de US$ 3,509 bilhões, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento. "O resultado foi alcançado, basicamente, mais por causa de uma queda nas importações do que por uma elevação nas exportações. E isso não é nada saudável", diz Barros.
Há outro agravante. O país perdeu espaço em alguns de seus mercados exportadores principais e tenta achar novos destinos. No primeiro semestre, houve redução nas vendas para os principais mercados externos, em especial para a Argentina, de 66%, e para a União Européia, de 18,5%. Isso porque a demanda naqueles países também se retraiu.
A perspectiva das empresas para os próximos seis meses não é das melhores. Em abril, 44% das empresas consultadas pela FGV acreditavam que o cenário seria mais positivo. Em julho, esse percentual caiu para 18%. "Diante dessa evidência, a retomada da produção, anteriormente esperada para o segundo semestre, está agora em xeque", conclui relatório da FGV.


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