São Paulo, quarta-feira, 18 de outubro de 2006

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VINICIUS TORRES FREIRE

Enquanto isso, no mundo real

País assiste ao debate burro de Lula contra Alckmin, que ignora ruína das bases para o crescimento de 2007, 2008...

É MAIS FÁCIL um camelo, o risco-país do dia e os nossos tantos índices de inflação passarem pelo buraco da agulha dos noticiários de TV que a gente saber quantos fiandeiros perderam o emprego. Chamemos assim, de fiandeiros, de modo arcaico e simpático, pessoas que trabalham na indústria têxtil. Pelo andar da carruagem que traz importações chinesas, o fiandeiro nacional tende a ser mesmo arcaica figura de museu. Terá a companhia de sapateiros, carpinteiros, metalúrgicos, químicos e o povo da pequena manufatura em geral.
Os dados da indústria em setembro devem voltar ao vermelho. As informações mais recentes das fábricas no terceiro trimestre confirmam tendências aflitivas observadas no meio do ano por economistas que se ocupam do mundo real.
Antonio Barros de Castro e Fernando Pires de Souza, do BNDES, notaram que a indústria, até junho, apresentava um comportamento aberrante: a quantidade de setores que encolhia era típica de anos de recessão. A hipótese, longe de conclusiva mas já preocupante, era que teria começado uma especialização precoce da indústria brasileira: risco de desindustrialização. No terceiro trimestre, a tendência aberrante continuou. Desindustrialização e especialização são coisas que se confirmam apenas depois de anos de observação. Mas, quando e se confirmada, a vaca já atolou no brejo.
As suspeitas do impacto do câmbio na indústria são agora quase provas, com muitas digitais e DNAs. Um dado pouco pop, a rentabilidade do comércio exterior, indica grande coincidência entre setores à míngua e aqueles em que é forte a queda da rentabilidade das exportações. Os setores que mais crescem, máquinas de escritório, de informática e elétricas, têm muito componente importado. Ou vendem produtos básicos para alimentar a indústria asiática.
O economista padrão diz que importações vitimam os ineficientes (nem sempre) e melhoram produtos nacionais (por meio de componentes baratos e de qualidade e máquinas mais eficazes). O problema do argumento é: qual o limite da destruição de setores tidos como ineficientes? E se não se tratar de "destruição criadora" (isto é, os capitais seriam dirigidos para a produção de bens em que o país seria eficiente)?
No curto e no médio prazos, em que todos vivemos, queimam-se empregos. Trata-se de outro fator a restringir a expansão econômica nos próximos anos.
A expansão da renda por meios fiscais (Bolsas sociais, Previdência, aumentos de salário mínimo) chegou ao limite. De resto, para fazer uma redução caricata do argumento dos economista José Roberto Mendonça de Barros e Lídia Goldenstein, parte das "Bolsas" virou consumo de importados baratos. A velocidade de aumento do crédito, que ainda vai bem, depende do aumento do total de salários, que não tem cara de superar, no ano que vem, a de 2006. O comércio exterior parou de sustentar a produção industrial. O investimento público não crescerá, pois o Estado chegou ao limite do gasto. O externo não terá apetite por uma economia que não cresce.
Enquanto isso, olhamos só para o risco-país, para nossas dúzias de índices de inflação e para a estupidez do confronto de Lula e Alckmin.


vinit@uol.com.br

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