São Paulo, sexta, 18 de dezembro de 1998

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ARTIGO
Vitória da competência



FERNANDO TADEU PEREZ
O acordo firmado na semana passada entre a Volkswagen do Brasil e os sindicatos de metalúrgicos do ABC e de Taubaté tem um grande denominador comum: a competência.
A competência dos sindicalistas, que exigiram sem transigir, defenderam sem brigar, negociaram sem sonhar; e a dos técnicos em relações trabalhistas da Volkswagen, que criaram uma equação matemática, uma engenharia financeira na qual se avança aqui, recua-se acolá e ninguém perde.
Frutos dessa competência foram a aprovação maciça dos trabalhadores em assembléia, a preservação de 7.500 empregos e o estabelecimento de uma política de parceria de longo prazo entre empresa e trabalhadores, em que todos têm consciência de que as modernas relações capital-trabalho não se limitam mais ao "ou dá ou desce". Hoje, sentam-se à mesa de negociação com posições maduras, vislumbrando não o dia seguinte nem o futuro imediato, mas o futuro de longo prazo.
O acordo quebra um paradigma dentro das grandes empresas e dos grandes sindicatos. A redução do trabalho, acompanhada de uma redução de salário, sem prejuízo da renda mensal, é uma fórmula moderna, dos dias de hoje.Talvez não seja para os de amanhã, mas, seguramente, é a saída para os dias atuais.
A "vitória da competência" pode ser evidenciada pelo pagamento do INPC integral, pela manutenção do 13º salário e do abono de férias, pela antecipação das verbas referentes à participação nos lucros e resultados de um exercício (1999) que nem os grandes futurólogos sabem como será.
Ela está consubstanciada na adequação da jornada de trabalho às necessidades de produção, no equilíbrio da redução de custos com o fluxo de caixa, na percepção correta de que existe a necessidade de um "turnover", seja ele executado da forma que for.
O acordo traz embutida, ainda, uma radical mudança terminológica: pode-se considerar definitivamente banida a palavra "perda". No mundo das negociações modernas, ninguém mais perde. Perde quem não negocia, quem radicaliza, quem não sabe levantar os olhos além do nariz.
Chegaram a insinuar que o Estado estaria perdendo, deixando de recolher impostos sobre uma parcela salarial que não chega, em média, a 10%.
Perdeu? Não, ganhou. Imagine-se o Estado tendo de arcar com a manutenção de 7.500 desempregados, mais dependentes (num cálculo otimista, uma população de pelo menos 30 mil pessoas, sem falar no efeito na cadeia produtiva). Imagine-se toda essa população sem dinheiro para comer, para vestir, para ter assistência médico-odontológica.
Ah, mas os empregados perderam. Não, ganharam! Tiveram os empregos mantidos, a renda mensal garantida, vão trabalhar um pouco menos -e ter um pouco mais de qualidade de vida.
Tudo isso nos obriga a uma séria reflexão: por que a Volkswagen debruçou-se durante centenas de horas sobre variantes e mais variantes para evitar o desemprego quando a maioria das empresas opta pelo caminho mais simples, o da demissão?
A Volkswagen fez isso porque sabe da responsabilidade que tem dentro da sociedade brasileira e da importância de seu compromisso social. Ela tem instalações modernas, muitos robôs, usa na fabricação de seus produtos as mais recentes conquistas tecnológicas existentes em todo o mundo, mas -e isso ela não esquece- ainda é feita por gente.
Quando sugeri que a população brasileira, ao adquirir qualquer tipo de produto, seja ele um automóvel ou um simples clipe, verifique quem está por trás desses produtos, queria mostrar que devemos preservar aqueles que nos preservam. Quem tira emprego merece ser prestigiado?
Chegaram a dizer que essa posição era de "marqueteiro". A princípio, neguei. Mas, pensando bem, realmente é uma posição de marketing: do marketing do emprego e da competência.


Fernando Tadeu Perez, 44, é diretor de recursos humanos da Volkswagen do Brasil.





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