|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
MARCOS CINTRA
É preciso cortar gastos públicos
O quadro econômico e social atual não dispensaria as ações distributivistas que o governo vem adotando
|
O CORTE NOS gastos públicos é
quase unanimemente recomendado como a receita para corrigir supostos desequilíbrios
nos juros e no câmbio, e para acelerar o crescimento do PIB.
Vale lembrar que no início do Plano Real o controle da inflação e o
crescimento econômico foram obtidos com a combinação de câmbio
valorizado e política fiscal expansionista. Segundo cálculos de Amir
Khair, entre 1995 e 2004 as despesas
consolidadas de custeio saltaram de
28% para 32% do PIB, sendo metade desse aumento devido à previdência, 32% a pessoal e 18% a outros
custeios.
O resultado foi a geração de déficits nas contas externas, o crescimento da dívida pública interna, a
escalada dos juros e o aumento da
carga tributária. O "crowding-out"
do setor privado reduziu os investimentos e inibiu o crescimento econômico.
No entanto, durante os últimos
anos, a aplicação de uma política
econômica baseada nas metas de inflação, na liberdade cambial e na
contenção fiscal produziu resultados positivos no controle inflacionário (o IPCA, que fora de 8,9% em
1999, caiu para 3,1% em 2006), na
superação dos déficits externos (o
saldo saiu de déficit de US$ 6,6 bilhões em 1998 para superávit de US$
46,1 bilhões em 2006) e na contenção da dívida pública. A continuidade dessa política poderá conceder ao
Brasil a qualidade de "investment
grade".
Contudo ainda não chegamos lá. A
dívida líquida interna pública ultrapassa 50% do PIB e as despesas com
juros nos setores público e privado
absorvem 18% do PIB, em parte por
causa da Selic e dos "spreads" bancários elevados. Apesar da carga tributária de 40% do PIB, o déficit público é de cerca de 3,5% do PIB.
Esse quadro de forte extração fiscal e de alto custo do capital reduz
investimentos no setor privado que,
de outro lado, sofre pela falta de infra-estrutura, totalmente negligenciada pelo governo federal como
parte de seu esforço de obtenção de
superávits primários. Não surpreende, portanto, que o crescimento econômico acha-se estagnado.
Por outro lado, qualquer tentativa
voluntarista de alterar os juros e administrar a taxa de câmbio poderia
desajustar gravemente as condições
macroeconômicas atuais.
Nessas circunstâncias, o corte nos
gastos públicos é de fato uma importante variável de ajuste, capaz de
manter o atual "equilíbrio" macroeconômico e, ao mesmo tempo, criar
condições para reduzir os juros e
desvalorizar o real, o que resultaria
em aceleração do crescimento e formação de um círculo virtuoso de
crescimento.
Infelizmente, cortar gastos públicos não é tão simples. A atual administração, que manteve a política
macroeconômica iniciada nos governos anteriores, foi eleita com a
marca política do "welfare state". O
quadro econômico e social brasileiro não dispensaria com facilidade as
ações distributivistas que o governo
vem adotando.
Mesmo que a concepção e a gestão
desses programas possam ensejar
fortes reparos, a verdade é que a
adoção dessa política tem sido capaz
de trazer maior estabilidade política, menos "social unrest", a expansão do mercado interno e maior inclusão social. Graças a isso, o núcleo
moderno e globalizado da economia
brasileira tem sido capaz de crescer
continuamente, sem sobressaltos, e
prosseguir absorvendo novos espaços econômicos e sociais de expansão.
Sem o corte de gastos o país estará
condenado à estagnação econômica
e fadado a ser um gigante emasculado, flácido, modorrento e incapaz de
assumir um papel de relevância na
economia mundial? Ou haveria como manter os programas sociais e
ao mesmo tempo ampliar os investimentos em infra-estrutura e reduzir
a relação dívida pública/PIB, abrindo caminho para mais crescimento
econômico?
Creio que sim. Basta que o crescimento ocorra a taxas mais elevadas
que a expansão dos gastos. Maior
crescimento e continuidade do atual
sistema de metas de inflação, do
câmbio flutuante e da contenção fiscal reduziriam a relação dívida/PIB
e os juros e permitiriam a desvalorização do real.
Mas esse é o dilema. Como acelerar o crescimento sem cortar os gastos públicos?
Voltaremos ao tema na próxima
coluna.
MARCOS CINTRA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE , 60,
doutor pela Universidade Harvard (EUA), professor titular
e vice-presidente da Fundação Getulio Vargas, foi deputado federal (1999-2003). É autor de "A verdade sobre o Imposto Único" (LCTE, 2003). Escreve às segundas-feiras, a
cada 15 dias, nesta coluna.
Internet: www.marcoscintra.org
mcintra@marcoscintra.org
Texto Anterior: AL deve crescer 4,5% neste ano, prevê banco Próximo Texto: Governo e Bradesco irão renegociar Banco Postal Índice
|