São Paulo, segunda-feira, 19 de março de 2007

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Governo e Bradesco irão renegociar Banco Postal

Hélio Costa reclama que contrato atual é ruim; banco diz que não teve retorno esperado

Segundo o ministro, governo não tem lucro com parceria, que rendeu à União receita de R$ 628,1 milhões entre 2002 e 2006

SHEILA D'AMORIM
HUMBERTO MEDINA

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Depois da ameaça do ministro Hélio Costa (Comunicações) de retomar o Banco Postal, governo e Bradesco começam a rediscutir a parceria firmada em 2001. Em jogo está um investimento de cerca de R$ 262 milhões do maior banco privado do país num contrato polêmico para explorar serviços bancários nas agências dos Correios, que rendeu ao governo receita de R$ 628,1 milhões entre 2002 e 2006.
Apesar da quantia envolvida, o ministro afirmou que o Banco Postal é um negócio ruim para o governo. "Estamos apenas pagando as despesas dessa operação. Empata. E o lucro? Fica todo com o Bradesco", disse.
"Banco no Brasil só dá errado se a pessoa ficar na frente da agência com uma pá, jogando dinheiro fora", ironiza. Apesar da certeza de que o negócio é rentável, ele afirma não ter idéia do lucro gerado até agora nem se ele já foi suficiente para recuperar o investimento inicial feito pelo Bradesco -R$ 200 milhões pagos na licitação. "O resultado financeiro não é contabilizado pela ECT [Correios], só pelo Bradesco."
O Bradesco informou que não divulgaria o resultado financeiro do Banco Postal por ser uma "informação não disponível por razão estratégica".
Na visão do Tribunal de Contas da União, a lucratividade do Bradesco está clara, uma vez que o banco privado concordou em pagar, sem necessidade, um valor a mais por um aditivo ao contrato. "A lucratividade do Bradesco com o Banco Postal resta evidente no fato de ter concordado com o pagamento adicional de R$ 62 milhões, ainda que não houvesse qualquer obrigação legal de fazê-lo", escrevem os técnicos que analisaram o contrato.
Como não é uma empresa independente (o Banco Postal é, na verdade, uma marca para designar serviços bancários prestados nos Correios), não há uma contabilidade separada.
Os números obtidos pela Folha referentes às receitas que a ECT recebe por cada operação feita mostram apenas um lado da equação. Por eles, é possível notar que, quatro anos após a sua criação, o Banco Postal vem mudando o foco de atuação e deixando de lado um perfil mais social em busca de operações mais rentáveis.
O microcrédito, por exemplo, um dos carros-chefe nas atividades do correspondente bancário, está em franco declínio: o volume dessas operações subiu de R$ 20,937 milhões em 2003 para R$ 183,8 milhões em 2004. Em seguida, despencou para R$ 57 milhões, em 2005, e apenas R$ 2 milhões em 2006. O Bradesco afirma que o aumento da inadimplência o forçou a ser mais "seletivo".
Nesse mesmo período, os empréstimos com taxas mais altas, para pessoas de maior renda, subiram de R$ 126 milhões em 2003 para R$ 654 milhões em 2005. Em 2006, o total cai para R$ 433 milhões, mas a quantidade de operações cresce de 505 mil para 604 mil.
Os demais números do banco indicam crescimento exponencial: os depósitos saltaram de R$ 852,5 milhões em 2002 para R$ 11,7 bilhões em 2006. O montante de transações executadas saiu de R$ 10,5 mil para R$ 221,3 mil no período.
Os Correios levam uma fatia desse crescimento, que aumenta a cada ano. Em 2002, foi de R$ 8,2 milhões. No ano passado, chegou a R$ 147,8 milhões.
Para Costa, as tarifas pagas têm de ser reavaliadas. "São as menores taxas a serem pagas em qualquer acordo. Essa figura de correspondente tem de mudar. É prejuízo à empresa. Perdemos milhões em razão de um contrato malfeito."
Segundo especialistas do governo e do setor privado nessa área, o volume de transações feitas é essencial para viabilizar o negócio de correspondente-bancário, modelo em que se baseia o Banco Postal. Em segundo, está o crédito. Isso porque, em muitos casos, as tarifas que o banco cobra para fazer um determinado serviço não cobre o custo. O recebimento de faturas e fichas de compensação é um exemplo. O banco cobra da empresa uma taxa para emitir e receber o boleto. Essa taxa não é tão maior do que o valor que o banco pagará ao correspondente-bancário que recebeu o pagamento do consumidor.
A declaração de Costa de que iria retirar do Bradesco a gestão do Postal deu o que falar. Um integrante da equipe do presidente Lula chegou a dizer que o Bradesco teria interesse na discussão, uma vez que o Postal não gerou o retorno esperado. O interesse do Bradesco é tanto que o próprio presidente, Márcio Cypriano, avisou que quer acompanhar as reuniões.


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