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PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
Banco do Sul?
O momento é propício para tratar do tema, pois a posição externa das economias sul-americanas é bastante forte
UM DOS TEMAS discutidos à
margem da recém-concluída reunião de primavera do
FMI (Fundo Monetário Internacional) e do Banco Mundial foi a
proposta de criação do Banco do
Sul. Não é um assunto da órbita das
entidades financeiras de Washington, pois a decisão de criá-lo cabe
aos países. Mas a formação de um
novo banco apareceu com destaque
nos encontros paralelos à reunião,
que aconteceram em Washington
entre ministros de finanças e delegações da Argentina, da Bolívia, do
Brasil, do Equador e da Venezuela.
A questão é polêmica. Alguns temem que a iniciativa possa ter um
caráter apenas político ou ideológico sem estar bem fundamentada do
ponto de vista técnico. É uma preocupação relevante, pois os objetivos
políticos e econômicos pretendidos
só serão alcançados se a nova instituição dispuser de um volume adequado de recursos e for construída
de forma cuidadosa e financeiramente sustentável. Se isso não
acontecer, acabará dando prejuízo
ou caindo no vazio.
A iniciativa faz sentido do ponto
de vista dos nossos países. Primeiro,
porque poderá fortalecer a dimensão financeira do processo de integração da América do Sul. Segundo,
porque poderá aumentar o poder de
barganha dos nossos países em relação ao FMI, ao Banco Mundial e ao
BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento).
O momento é propício para tratar
do tema, uma vez que a posição externa das economias sul-americanas é bastante forte. A situação de
balanço de pagamentos é tranqüila
e nossas reservas internacionais aumentaram. Além disso, a evolução
política em diversos países da região favorece, de maneira geral, iniciativas que aumentem a nossa autonomia e margem de manobra no
campo internacional. Novas crises
externas virão, cedo ou tarde, e temos de estar preparados para enfrentá-las sem comprometer a independência de nossas nações e solapar o processo de integração regional.
A discussão apenas começou e
muitas questões ainda estão obscuras. Fala-se, por exemplo, que o
Banco do Sul trataria não só de
apoiar projetos de desenvolvimento econômico e social (como fazem
o Banco Mundial, o BID e o
BNDES), mas também de financiar
desequilíbrios de balanço de pagamentos (como faz o FMI). São funções muito distintas. Tão distintas
que o melhor talvez seja criar duas
instituições separadas. Digamos: o
Banco de Desenvolvimento do Sul e
o Fundo Monetário do Sul. Não por
acaso, em Bretton Woods, foram
criadas duas instituições: o FMI e o
Banco Mundial.
Como se sabe, em outras regiões
do mundo já existem iniciativas
desse tipo. No leste da Ásia foi estabelecido, depois da crise de 1997/
98, sem muito estardalhaço, um sistema de cooperação monetária que
pode ser (e tem sido) visto como o
embrião de um Fundo Monetário
Asiático. Esse tipo de iniciativa aumentou a segurança externa dos
países da região e a sua influência
em organismos como o FMI.
Um Fundo Monetário do Sul, ou
algum esquema estruturado de cooperação monetária e cambial, apresentaria semelhanças com essa iniciativa asiática. No leste da Ásia, os
países que dão solidez técnica e financeira à iniciativa são principalmente o Japão e a China. Na América do Sul, esse papel teria de caber à
Argentina, ao Brasil e à Venezuela.
Um dos objetivos seria impedir que,
em caso de crises de balanço de pagamentos, os países pequenos e médios da região ficassem submetidos
ao controle e à influência de forças
políticas extra-regionais.
Em comparação com as entidades
de Washington, o banco ou os bancos do Sul teriam de ser mais igualitários e democráticos -sem deixar
de refletir as diferenças de tamanho
e contribuição financeira dos países
participantes. Os seus desembolsos
teriam de ser mais rápidos -sem
deixar de estar respaldados em garantias ou condicionalidades.
Um dos países do grupo que represento no FMI -o Equador- está
entusiasmado com a idéia do Banco
do Sul. O Brasil, ainda que com mais
hesitações, também deseja participar da formulação da iniciativa.
Tendo acabado de assumir a representação desses dois e mais sete países do Sul em um dos "bancos do
Norte", procurarei seguir de perto o
desenvolvimento da discussão.
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR., 52, escreve às quintas-feiras nesta coluna. Diretor-executivo no FMI, representa um grupo de nove países (Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago).
pnbjr@attglobal.net
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