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BLINDAGEM FINANCEIRA
Até economias mais liberais, como os EUA e o Reino Unido, usam mecanismos de regulamentação
Apenas 10 países não têm controle de capital
NEY HAYASHI DA CRUZ
LEONARDO SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Dos 186 países membros do
Fundo Monetário Internacional,
somente dez não adotam nenhum tipo de controle de capitais,
segundo levantamento feito pelo
próprio FMI. Até mesmo Estados
Unidos e Reino Unido contam
com regulamentação sobre entrada ou saída de recursos.
A utilização de mecanismos para limitar o movimento de capitais no Brasil voltou à pauta, no
momento em que o Plano Real
completa dez anos.
O FMI define como controle de
capitais todos os instrumentos
que resultem em limitações para
que investidores estrangeiros
apliquem seus recursos no país.
Exemplos: exigência de autorização prévia para ingresso de capitais, impostos sobre recursos financeiros, taxas de câmbio diferenciadas para investidores nacionais e estrangeiros e limites para remeter dinheiro ao exterior.
O levantamento feito pelo FMI,
com dados de 2002, não chega a
avaliar a extensão e a eficácia que
o controle de capitais tem em cada país. Mas mostra que a grande
maioria dos governos adota algum tipo de regulação nessa área.
Apesar de alguns economistas
defenderem uma maior liberalização, a existência de limites para
o fluxo de capitais pelo mundo é
defendida pelo FMI: o artigo 6º de
seu estatuto diz que os países "podem impor os controles necessários para regular os movimentos
internacionais de capitais".
O documento dá ao FMI o direito de "requisitar a um país membro que exerça esse controle para
prevenir" fuga de capitais em momentos de crise. Aquele que não
obedecer pode ser impedido de
"utilizar os recursos do Fundo".
Em artigo publicado recentemente, o economista Persio Arida, um dos mentores do Plano
Real, defendeu a extinção desses
controles, levando a um regime
de plena conversibilidade da
moeda que consolidaria a estabilização macroeconômica. "O tripé
hoje vigente de políticas (superávit fiscal primário expressivo
-economia de receitas para o
pagamento de juros da dívida pública-, taxa de juros norteada
pela meta inflacionária e câmbio
flutuante) deveria ser aprofundado através de um programa pré-anunciado e gradual de erradicação dos controles no mercado de
câmbio", escreveu Arida.
No Brasil, são citados pelo FMI
como exemplos de instrumentos
de controle de capitais "as restrições legais para participação [de
empresas estrangeiras] em setores da economia" e a "proibição
de realização de operações domésticas em moeda estrangeira".
Distorções
Há uma linha do pensamento
econômico que sustenta a tese de
que, em certos casos, controles de
capital podem ser úteis para corrigir distorções no mercado.
Há poucos anos foi redescoberta a "Teoria Geral do Segundo
Ótimo", elaborada em meados do
século passado pelos economistas
Kelvin Lancaster e Richard Lipsey
e que tem, entre seus defensores,
nomes de peso como os professores Paul Krugman (Universidade
Princeton), Joseph Stiglitz (prêmio Nobel de Economia) e Dani
Rodrik (Harvard).
O corolário desenvolvido por
Lancaster e Lipsey parte do seguinte princípio: "na presença de
uma distorção que não pode ser
removida, introduzir uma segunda distorção pode ser uma boa
política econômica".
Na crise do Sudeste da Ásia, em
1997-1998, Coréia do Sul, Tailândia e Indonésia recorreram ao
FMI para enfrentar as turbulências financeiras: adotaram regimes de câmbio flutuante, aumentaram os juros e se comprometeram a realizar ajustes fiscais, exatamente como fez o Brasil após a
crise do real, em janeiro de 1999.
No caminho oposto de seus pares, a Malásia adotou suas próprias receitas, o que incluiu a implantação de controles rígidos para a saída de capitais, redução dos
juros e aumento dos gastos públicos. Segundo Dani Rodrik, a Malásia cresceu e se recuperou mais
rapidamente do que os que seguiram o receituário do FMI.
No caso do Brasil, a "distorção"
a que se referem Lancaster e Lipsey poderia ser a introdução de
uma quarentena ou um tipo de
pedágio para o capital que entra
no país, de modo a desvincular a
taxa de juros do mercado doméstico da taxa de risco-país (juros
cobrados acima da taxa dos títulos do Tesouro americano). Isso
permitiria uma redução mais rápida dos juros internos.
Devido à grande mobilidade do
capital internacional, historicamente os juros internos da economia brasileira seguiram de perto o
risco-país. O problema dessa conexão estreita é que o risco-país
costuma impedir a queda da taxa
básica de juros a partir de determinado limite, como já ocorreu
diversas vezes no passado.
Para um investidor que compra
um título do Tesouro Nacional ou
um papel da dívida externa brasileira, o risco é o mesmo. Assim,
ele transfere a aplicação de um para o outro de acordo com a maior
taxa. É a chamada arbitragem.
Se o Banco Central tenta cortar
a taxa básica de juros (Selic) muito abaixo do risco-país, os investidores migram para os papéis da
dívida externa. Assim, para aceitar comprar títulos do Tesouro
internamente, exigem taxas
maiores, próximas às dos títulos
da dívida externa. Um pedágio e a
quarentena acabariam com a facilidade de arbitragem.
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