São Paulo, quarta-feira, 19 de julho de 2006

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Lula pressiona banco federal por juro menor

Com apoio de ministros, presidente-candidato quer que as instituições reduzam as taxas cobradas em empréstimos

Pressão do governo gera desconforto entre os dirigentes dos bancos oficiais e alguns membros do Ministério da Fazenda

SHEILA D'AMORIM
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva pressiona os bancos federais, nos bastidores, a baixar as taxas de juros cobradas nos empréstimos aos seus clientes. A determinação tem causado um desconforto na área econômica.
Embora a economia seja um dos trunfos eleitorais de Lula, o governo enfrenta desgastes com as taxas de juros, o câmbio sobrevalorizado e a crise na agricultura.
Nos dois últimos casos, ontem foi ampliado o seguro-desemprego para setores prejudicados pelo dólar barato, enquanto o BNDES anunciou mais prazo para as dívidas rurais (leia textos nesta página).
As instituições financeiras oficiais, tendo à frente o Banco do Brasil -a única que não é 100% da União e tem ações negociadas na Bolsa-, ainda resistem a reduzir o custo dos financiamentos "na canetada".
O argumento defendido por técnicos do Ministério da Fazenda é que isso gera perdas de receitas que afetarão o desempenho dos bancos e não há garantia de que isso será compensado com o aumento do volume de crédito.
O tema tem sido a pauta de várias reuniões recentes com Lula. Ontem, os dirigentes dos bancos públicos foram convocados para mais uma rodada de conversas. Durante as mais de três horas de reunião, os executivos ouviram novo pedido de Lula.
"O presidente reiterou o esforço no sentido de que os spreads [diferença entre juros cobrados nos empréstimos e o pago às aplicações] bancários sejam revistos", afirmou ao final do encontro Roberto Smith, presidente do Banco do Nordeste (BNB). Segundo ele, "o tempo todo" o presidente falou nesse assunto.
"O pedido é para que isso seja conduzido dentro do equilíbrio das contas das instituições", explicou, destacando ainda que a orientação é ampliar investimentos produtivos. No entanto, reconheceu que o tema é delicado. "O assunto é complicado. Noto o esforço do presidente Lula e da ministra Dilma [Rousseff, da Casa Civil] no sentido de que o país não seja recordista em termos de taxa de juros e spreads bancários".
O secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, abriu o encontro, que teve também a presença do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, no primeiro dia em que os diretores da instituição discutem se farão um novo corte da taxa básica dos juros, a Selic. Appy fez uma longa exposição sobre a evolução dos juros e dos spreads bancários no país. Depois foi aberta a discussão.

Fundos constitucionais
Uma alternativa para satisfazer o presidente, mas que ainda faz muita gente no governo torcer o nariz, é diminuir os juros nas linhas de financiamento que usam recursos dos fundos constitucionais.
Criados em 1989, esses fundos têm o objetivo de promover o desenvolvimento produtivo nas regiões Norte (FNO), Nordeste (FNE) e Centro-Oeste (FCO), dando preferência para pequenos produtores rurais e micro e pequenas empresas que usam muita mão-de-obra.

Desde 2001, com mudanças em suas normas, esses fundos podem financiar também obras privadas de infra-estrutura. E aí entram projetos de energia, telecomunicações, transporte e abastecimento de gás e redes de esgoto.
Esses setores têm merecido atenção especial do governo porque empregam muita mão-de-obra e têm repercussão sobre toda a economia local, gerando dividendos políticos para campanha lulista.
A idéia apresentada na reunião de ontem pelo presidente do Banco do Nordeste (BNB), Roberto Smith, é criar uma forma para que o custo dos empréstimos com recursos dos fundos constitucionais seja reduzido automaticamente toda vez que a TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo) cair. A TJLP é a taxa que serve de referência para as operações do BNDES.
"Os fundos constitucionais estão em desvantagem em relação ao BNDES", disse Smith, ressaltando que, na região Nordeste, o custo desses financiamentos pode chegar a 14% ao ano, contra 7,5% da TJLP. Os empréstimos do BNB com dinheiro do FNE somam R$ 13 bilhões, mais de 70% da carteira de crédito de R$ 18 bilhões. Neste ano, o BNB pretende emprestar R$ 8 bilhões -R$ 5 bilhões por meio do FNE.
Smith explicou ainda que, pelas regras em vigor, a taxa dos empréstimos desses fundos só pode acompanhar automaticamente a TJLP se a variação dessa taxa superar 30%. "O legislador estava preocupado com o empresário quando fez essa lei, porque ela o protege no caso de alta", explicou.

Apoio de ministros
Segundo a Folha apurou, a área econômica já está consciente de que dificilmente os bancos oficiais conseguirão sair dessa situação sem oferecer alguma proposta que satisfaça o presidente Lula. Nessa disputa, ele conta com integral apoio dos ministros de peso e que, ontem, estavam estrategicamente sentados na bancada em frente aos dirigentes dos bancos públicos.
À esquerda de Lula, estavam os ministros Dilma Rousseff (Casa Civil), Guido Mantega (Fazenda), Luiz Fernando Furlan (Desenvolvimento), além dos secretários do Ministério da Fazenda, Júlio Sérgio Almeida (Política Econômica) e Bernard Appy (secretário-executivo).
Do outro lado da bancada estavam os presidentes dos bancos oficiais e o ministro Paulo Bernardo (Planejamento).


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