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Pacote não deverá reduzir juro bancário
Especialistas apontam que propostas do governo para aumentar a concorrência no setor financeiro não são novas nem eficazes
Para economistas, taxa só cai com menos compulsório e mais oferta de crédito; debate já gerou mal-estar entre governo e bancos
SANDRA BALBI
DA REPORTAGEM LOCAL
Não são novas nem terão impacto significativo sobre o
"spread" bancário e os juros as
medidas em estudo no governo
para tentar aumentar a concorrência no setor financeiro, de
acordo com especialistas consultados pela Folha.
Das propostas divulgadas pelo ministro Guido Mantega
-criação do cadastro positivo,
portabilidade do crédito, DOC
reverso e redução da contribuição dos bancos ao Fundo Garantidor de Crédito-, quase
todas já existem na prática. O
debate já gerou ruídos entre a
Fazenda e a Febraban (federação dos bancos), que chegou a
desautorizar seu economista-chefe anteontem após ele ter
feito críticas às propostas do
governo.
A medida considerada mais
eficaz, o cadastro positivo -relação dos bons pagadores acessível a todas as instituições financeira-, vem sendo estudada desde o governo passado.
Mas, de fato, já existe.
Há dois anos os bancos informam ao Banco Central o saldo
de todas as operações superiores a R$ 5.000, o que permite
saber o grau de endividamento
de cada tomador de recursos.
"Se isso for feito com as operações menores, pode ser mais
factível que o cadastro positivo", diz Mário Sérgio Vasconcelos, diretor de relações institucionais da Febraban.
O "DOC reverso" -transferência de salários depositados
em um banco para outro com
menos burocracia- já está na
pauta dos bancos, que disputam as contas de funcionários
municipais e estaduais. E a
transferência de créditos também já vem sendo praticada na
disputa por novos clientes.
"Spread" em alta
Para especialistas, os juros e
o "spread" -diferença entre as
taxas que os bancos pagam para
captar recursos e as que cobram ao emprestar ao cliente-
são altos porque a oferta de crédito é menor que a demanda.
"A demanda potencial de crédito equivale a 100% do PIB
[Produto Interno Bruto], mas o
crédito concedido corresponde
a apenas de 32% do PIB", observa Alberto Borges Matias,
professor da USP de Ribeirão
Preto. Ele se baseia no fato de
que na maioria dos países o volume de crédito supera o PIB.
Estudo do Inepad (Instituto
de Ensino e Pesquisa em Administração), feito a pedido da Folha com base nos balanços do
primeiro semestre, mostra que
desde 2004 o "spread" financeiro não pára de crescer.
Ele saiu de 7,5% em junho
daquele ano para 8,6% em
2006. Em dezembro do ano
passado, esse percentual era ligeiramente menor -8,4%. Já o
"spread" total calculado pelo
Inepad, que inclui as tarifas
bancárias na conta, saiu de
12,2% para 12,5% no período.
"Houve um leve aumento do
"spread", mas chama a atenção a
mudança na sua composição",
diz Edson Carminatti, analista
do Inepad. Os lucro dos bancos,
que representava 22% do
"spread" em dezembro passado, em junho passou para 25%.
Os impostos caíram de 16% para 11%, e a inadimplência saltou
de 16% para 22%.
O maior componente do
"spread", entretanto, continua
sendo o custo estrutural dos
bancos -representava 46% em
dezembro de 2005 e em junho
deste ano caiu para 42%.
Medidas inócuas
Com base nesse estudo, Borges Matias, que é também presidente do Inepad, diz que as
medidas em gestação no governo nada têm a ver com o
"spread" bancário, já que seu
principal componente são os
custos estruturais dos bancos.
"O custo dos bancos brasileiros
é semelhante ao dos americanos, que têm um volume de
operações quatro vezes maior."
Para ele, a concorrência no
setor só ocorrerá com o aumento da oferta de crédito por meio
da redução do compulsório.
Hoje, 45% dos depósitos à vista
nos bancos são recolhidos ao
Banco Central, sem remuneração. Outros 8% também ficam
retidos pelo BC, que paga por
eles a Selic (14,75% ao ano).
Miguel Oliveira, vice-presidente da Anefac, diz que, "se
não crescer a oferta de crédito
para haver disputa de clientes
entre os bancos, o "spread" não
cairá de forma significativa.
Segundo ele, "só quando
houver muito dinheiro disputando clientes é que o "spread"
vai baixar". Nesse sentido, ele
defende a redução escalonada
do compulsório, condicionada
ao direcionamento dos recursos para crédito.
Para Guilherme Maia, economista da Tendências, o
"spread" é alto porque há uma
"assimetria de informações" no
mercado. Ou seja, os bancos
não conseguem diferenciar o
bom e o mau pagador, por isso
cobra juros altos nos empréstimos, elevando o "spread" para
se proteger do risco de inadimplência. "Com um cadastro dos
bons pagadores, seria possível
expandir a carteira de crédito
com juros menores."
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