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Duração das incertezas e EUA ditarão a extensão da crise
Desaquecimento americano pode afetar China e exportadores de commodities
Países como o Brasil, ainda
dependentes da venda de
produtos básicos a mercados
como o chinês, podem
reduzir saldo comercial
DA REPORTAGEM LOCAL
O quanto vai durar a atual
crise financeira e quais impactos ela terá na maior economia
do mundo, a dos EUA, são as
duas incógnitas que mais preocupam empresários e analistas.
Grande parte da poupança
dos americanos está no mercado de ações, e o consumo no
país é financiado, basicamente,
por crédito. Se as ações continuarem se desvalorizando e a
concessão de empréstimos se
tornar mais seletiva como resultado da atual crise (que é
uma crise de crédito), os americanos terão menos dinheiro para gastar com o consumo.
Nos EUA, o volume de crédito na economia equivale a quase 150% do PIB (quase US$ 17
trilhões). No Brasil, ainda é de
cerca de 35% do PIB.
Hoje, os EUA são os principais compradores de produtos
da China, que, por sua vez, vem
se abastecendo largamente de
commodities (alimentos, minérios etc.) de países como o
Brasil para sustentar um crescimento acima de 10% ao ano.
Na semana passada, o temor
de queda da atividade nos EUA
(e na China) já levou à redução
no valor de commodities, que
hoje sustentam boa parte do
saldo comercial do Brasil.
Se os EUA "esfriarem", é natural que a China e o resto do
mundo esfriem. Em 2006, os
EUA foram responsáveis por
19,7% do crescimento global. A
China, por 15,1%; a União Européia, por 14,7%; e o Brasil, por
2,6%. Ou seja, 35% do crescimento mundial foi determinado por EUA e China, umbilicalmente ligados por uma relação
comercial e financeira onde os
americanos gastam e o chineses os financiam.
"Uma diminuição na atividade nos Estados Unidos vai testar a tese de alguns de que a
economia mundial se descolou
da influência norte-americana.
Pessoalmente, não acredito
nessa tese", afirma José Francisco Gonçalves, economista-chefe do banco Fator.
Dependência dos EUA
Apesar da diversificação recente de pauta e destino das exportações brasileiras, o Brasil
continua muito dependente da
economia americana. Em 1998,
19,3% das vendas externas do
Brasil tinham os EUA como
destino. Hoje, ainda são 18%.
A China também se tornou
mais importante para o Brasil,
com as exportações subindo de
1,8% para 6,1% no período.
"A vulnerabilidade brasileira
em relação aos EUA diminuiu.
Mas a pergunta de US$ 1 milhão é saber se a crise americana será moderada ou se estamos falando de algo mais sério", afirma Fabio Giambiagi,
economista do Ipea.
Para Celso Toledo, da MCM
Consultores, uma das principais incógnitas da crise atual
nos EUA "é que ninguém sabe
ao certo onde está o problema".
"Não há certeza se a crise se
restringe ao mercado de créditos de segunda linha no setor
imobiliário. Na dúvida, pode
haver um enxugamento da
oferta de crédito até para bons
pagadores, o que afetará a economia real", diz. Ele argumenta
que quanto mais a crise se arrastar, maior será o risco.
Sérgio Vale, economista da
MB Associados, concorda. "Estamos lidando com o estouro
de uma bolha de valorização de
ativos como ações. Se a crise for
muito duradoura, com muita
volatilidade, pode acabar afetando o mundo real e inibir investimentos. Mas não creio que
já tenhamos chegado ao fim do
atual ciclo de crescimento. É
um ajuste no caminho", diz.
Se for confirmada a previsão
de crescimento mundial ao redor de 5% neste ano, 2007 completará um ciclo de cinco anos
de forte crescimento -o mais
longo em mais de três décadas.
Contágio clássico
O contágio clássico de uma
crise como a atual no Brasil
ocorre via câmbio, quando há
uma saída pronunciada de dólares do mercado local, o que
eleva as cotações da moeda
norte-americana.
Como boa parte da demanda
interna é hoje atendida pelas
importações (o comércio cresceu 9,9% no primeiro semestre,
mas a indústria local apenas
4,8% -a diferença foi importada), um dólar mais caro significa risco direto de mais inflação.
Se a inflação ameaça subir, o
Banco Central tende a aumentar os juros para conter o consumo e os preços. Isso acaba esfriando a economia.
Para o economista Sidnei
Nehme, diretor-executivo da
NGO Corretora de Câmbio, o
risco de valorização excessiva
do dólar ainda é limitado.
"Passada a pressão de saída
de dólares, o mercado vai voltar
à vidinha normal, com fluxo
positivo. Nos últimos dias, ao
ficarem sem liquidez [dinheiro] nos EUA, os investidores
vieram aqui e "limparam a prateleira'", diz Nehme, para explicar a forte venda de ações na
Bovespa por estrangeiros e as
remessas que levaram o dólar
acima de R$ 2 na semana passada.
(FERNANDO CANZIAN)
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