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A hora de Bernanke
Os olhos do mundo estão voltados para a forma como o presidente do banco central americano responde ao tumulto que reina nos mercados financeiros nas últimas semanas
Brian Snyder - 10.jul.07/Reuters
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O presidente do Fed (Federal Reserve, o Banco Central dos EUA), Ben Bernanke
KRISHNA GUHA
DO "FINANCIAL TIMES"
No retiro anual do Federal
Reserve (Fed, o BC dos EUA),
há quase exatos oito anos, Ben
Bernanke apresentou um estudo a Alan Greenspan e outros
dirigentes de bancos centrais
de todo o mundo que estavam
tentando decidir como responder a mudanças nos preços das
ações, títulos e outros ativos.
Na época, Bernanke era diretor do departamento de economia da Universidade Princeton
e um dos mais renomados economistas acadêmicos de sua
geração, ainda que seu nome
fosse quase desconhecido fora
dos círculos de sua profissão.
Passados oito anos, Bernanke substituiu Greenspan como
presidente do Fed. Os olhos do
mundo estão voltados para ele,
à medida que enfrenta dilemas
reais, e não teóricos, sobre como responder ao tumulto que
reina nos mercados financeiros. A resposta dramática, sexta-feira, às medidas adotadas
pelo Fed para colocar mais dinheiro, sob condições menos
punitivas, à disposição das instituições famintas de crédito e à
indicação da possibilidade de
um corte de juros demonstram
de que maneira as decisões dele
afetam as perspectivas da economia real.
No estudo apresentado em
1999, Bernanke e seu co-autor,
Mark Gertler, diziam que um
BC deveria alterar as taxas de
juros em resposta a mudanças
nos preços dos ativos, mas apenas na extensão em que essas
afetem a economia real. No ano
seguinte, ele escreveu sobre o
tema em termos laicos na "Foreign Policy": "Se Wall Street
entrar em colapso, o mundo
real seguirá o mesmo caminho?
Não necessariamente".
Bernanke continua a acreditar que os dirigentes de bancos
centrais mais inteligentes deveriam se manter concentrados na economia real. É esse o
paradigma pelo qual ele pretende avaliar se deve ou não
cortar a taxa de juros. Mas o
mundo real não é tão claro
quanto a vida acadêmica.
O presidente do Fed enfrenta
incertezas para determinar que
efeito os tumultos do mercado
estão exercendo sobre a economia real. Gertler, hoje professor da Universidade de Nova
York e pesquisador convidado
no Fed de Nova York, diz que
"eu seria o primeiro a admitir
que existem áreas cinzentas".
A decisão requer a administração de grupos de pressão
ruidosos e muitas vezes antagônicos. Os operadores de mercado estão em sua maioria desesperados por corte nos juros.
Jim Cramer, administrador de
um fundo de hedge e irreverente comentarista financeiro em
uma rede de TV, apelou -ou
melhor, gritou- por eles ao exigir que o Fed acorde e corte os
juros. "Bernanke está sendo
acadêmico. Ele não faz idéia do
quanto a situação é ruim aqui
fora. Ele não faz idéia!"
Mas muitos economistas e
dirigentes de BCs acreditam
que um corte de juros acarrete
o chamado "risco moral" envolvido no socorro a investidores
irresponsáveis. Bill Poole, presidente do Fed regional de St.
Louis, disse que só uma "calamidade" justificaria um corte
agora. A decisão de anteontem
representa um compromisso
entre os dois campos. Mas os
operadores se regozijaram, e
um analista de TV disse que
Bernanke é um "astro do rock".
Os investidores amavam
Greenspan, que ao longo dos
anos conseguiu evitar uma série de crises financeiras. Mas
alguns economistas atribuem a
ele a responsabilidade por fazer
com que os investidores acreditem que, caso as coisas estejam
indo realmente mal, o Fed irá
socorrer os mercados.
Pressões
Essa não é a primeira vez que
Bernanke coloca sua reputação
em jogo. No segundo trimestre
de 2006, com apenas dois meses de experiência no cargo, os
investidores começaram a embutir em suas decisões uma alta
na expectativa inflacionária. Os
operadores zombavam de "Ben
Helicóptero", apelido surgido
de declarações do dirigente
-ele disse que o Fed poderia
sempre deter a deflação jogando dinheiro de um helicóptero.
Bernanke provou, então, que
não aceita pressões. Respondeu com um discurso duro, no
qual criticava aqueles que punham em dúvida sua credibilidade como líder na luta contra
a inflação. Poucos meses mais
tarde, ele decidiu suspender
uma seqüência de altas nas taxas de juros, o que lhe valeu a
admiração de seus colegas no
Fed, por não ter imposto riscos
desnecessários à economia somente para preservar a sua reputação pessoal.
"Uma das coisas que ele tem
em comum com Greenspan é a
calma. Na verdade, o termo
mais correto seria dizer que é
um homem inabalável", afirma
Alan Blinder, também professor em Princeton e ex-vice-presidente do Fed. "Greenspan era
calmo em meio à tempestade.
Bernanke é igual".
Mesmo que lhe falte o toque
político astuto de seu predecessor, Bernanke não ignora o
contexto político de suas decisões. Antes de assumir o comando do Fed, ele foi presidente de uma unidade regional do
BC e do conselho econômico da
Casa Branca. E continua bem
relacionado com funcionários
da Casa Branca, mas também
se aproximou de lideranças democratas no Congresso, onde
figuras importantes apreciam
sua humildade, se comparada
ao comportamento do "tio Al".
No entanto, são seus instintos de historiador e teórico da
economia, estudioso da Grande
Depressão e de outras crises financeiras, que servirão para
orientá-lo agora. Larry Meyer,
ex-presidente de uma unidade
do Fed e presidente do conselho da Macroeconomic Advisers, diz que Bernanke sabe
melhor que a maioria dos estudiosos como o sistema de crédito funciona e o papel que a caução exerce nele, já que escreveu
extensamente sobre o tema.
Acima de tudo, ele tem a confiança intelectual necessária
para tomar grandes decisões,
reforçada por uma infância
precoce, em que entrou direto
para a segunda série da escola e
foi o primeiro colocado nos
exames de admissão universitária na Carolina do Sul, antes
de optar para seus estudos pela
Universidade Harvard e pelo
Instituto de Tecnologia de
Massachusetts.
Confiança
Os observadores casuais
muitas vezes confundem seu
comportamento modesto e estilo consensual com falta de assertividade. Mas o fato é que
Bernanke é muito confiante e
firme nas discussões. "Não se
pode blefar contra ele intelectualmente", diz Gertler, que já
dividiu uma casa com ele.
Gertler diz que a única ocasião em que viu Bernanke sair
derrotado intelectualmente foi
quando os dois e Anna, a mulher de Bernanke, enfrentaram
Ken Rogoff, hoje professor de
Harvard, no xadrez. "Ken jogou
de costas para o tabuleiro e ainda assim derrotou nós três."
Mas mesmo os admiradores
de Bernanke admitem que lhe
faltam as décadas de experiência de mercado e a lendária intuição de seu predecessor
quanto aos dados sobre a economia real, que muitas vezes se
provaram cruciais em momentos de crise. Bernanke confia
mais profundamente em seus
assessores e recorre a um círculo mais amplo deles, se comparado a Greenspan.
Mas suas ações determinarão se ele dispõe da capacidade
de julgamento e de liderança
para determinar quando uma
crise financeira corre o risco de
se tornar crise econômica e, caso isso aconteça, se sabe como
intervir para resolvê-la.
"Ele leva muito a sério a
questão do risco moral", diz
Blinder. "Isso posto, também
está muito consciente da responsabilidade do Fed em não
permitir que a economia vá por
água abaixo. Eis o dilema."
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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