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OPINIÃO ECONÔMICA
Escutem a voz da economia
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
O grande sábio da política
brasileira Ulisses Guimarães
dizia que o conselho mais importante que, depois de uma carreira
especial, ele poderia dar aos políticos mais jovens era: "Escutem
sempre a voz das ruas para orientar sua ação". Creio que o mesmo
conselho possa ser dado aos economistas: "Acompanhem com
cuidado os agregados macroeconômicos, mas escutem sempre a
voz da economia real".
Esse caminho, que venho trilhando há bastante tempo, não é
o mais fácil que se pode escolher.
Uma alternativa mais confortável é a de se esconder atrás dos
modelos econométricos e de alguns dogmas de fácil entendimento, deixando de lado o acompanhamento das pulsações, nem
sempre lineares, da chamada economia real.
Vivemos hoje no Brasil um desses momentos em que a falta de
capacidade para ouvir as vozes
da economia está provocando um
custo imenso. O Copom, na sua
última reunião, decidiu seguir o
consenso do mercado, e não os sinais emitidos pela economia real.
Mais de dois terços dos economistas ligados ao sistema financeiro
esperavam um corte de juros de
dois pontos percentuais, de 22%
para 20%. Isso apesar de os mercados futuros de juros apontarem
uma taxa Selic de 18% para todo
o ano de 2004.
A primeira pergunta que um
analista mais perspicaz faria é a
seguinte: se o mercado espera juros de 18% anuais para todo o
ano de 2004 e a economia está tão
fraca, por que não antecipar esse
cenário para agora? Os benefícios
seriam evidentes: menor conta de
juros para o Tesouro e devedores
privados, uma antecipação do
aumento do consumo e uma força a menos no processo de valorização de nossa moeda.
Se os membros do Copom tivessem o hábito saudável de olhar
para os sinais que a economia
vem emitindo nos últimos meses,
a tomada dessa decisão poderia
ser fortalecida. As mais recentes
previsões sobre o crescimento do
PIB, neste ano, já apontam um
número entre 0,5% e 0%. Alguns
analistas sussurram baixinho,
longe dos microfones, que poderemos ter, pela primeira vez depois
de 1990, uma queda do PIB.
De qualquer forma, não há dúvidas de que a desaceleração econômica vem se aprofundando
nestas últimas semanas. Os sinais
estão ao alcance daqueles que
não estão tomados por uma conivência, interessada ou não, com a
política de juros elevados do BC.
A arrecadação de tributos do governo federal vem caindo, de maneira acentuada, e em agosto já
foi R$ 800 milhões menor do que
a estimada pelo mercado financeiro; o saldo de nossa balança comercial surpreende a todos, mostrando que, a cada mês que passa,
um maior volume de produção é
desviado do mercado interno para o exterior e que o volume de
importações se reduz; o desemprego industrial também segue
uma tendência monotônica de
queda.
Manter os juros elevados por
mais dois ou três meses é uma opção inexplicável do Banco Central. Basta um olhar desinteressado, mas inteligente, para a curva
dos juros futuros do mercado para entender esse meu mau humor
com o sr. Meirelles e a equipe que
o acompanha. Não são os bancos
e operadores do mercado financeiro os responsáveis por essa distorção, mas sim os sábios sem sabedoria do Copom.
Mas vamos aprofundar um
pouco nosso andar de economista
curioso pelos caminhos de economia brasileira, neste final do primeiro ano de mandato do presidente Lula. A queda real da renda do trabalhador brasileiro nestes últimos 12 meses é impressionante. Primeiro pelo recrudescimento da inflação a partir do último trimestre do ano passado.
Com as empresas reduzindo seus
níveis de produção, os dissídios
coletivos anuais trouxeram aos
trabalhadores aumentos salariais
que não recuperaram as perdas
passadas. O Dieese informou que
menos da metade dos trabalhadores conseguiu reposição total
da inflação passada.
Depois veio a violenta correção
dos preços indexados, tarifas públicas, as mensalidades escolares
e os planos de saúde, que reduziram ainda mais a parcela dos salários alocada ao consumo menos
essencial. Um grande banco brasileiro calcula que o peso dos serviços essenciais, que representavam cerca de 16% da renda dos
brasileiros em 2002, tenha passado para mais de 23% neste ano.
Uma redução de mais de 7% na
parcela livre para consumo.
Finalmente, o número de trabalhadores sem colocação vem aumentando mês a mês. Com isso, o
consumo interno, que move quase dois terços de nossa economia,
reduziu-se de forma impressionante. A situação só não foi pior
porque as empresas brasileiras
mais eficientes desviaram parte
importante de sua produção para
o exterior.
Somente surdos para não ouvir
essas vozes do lado real!
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 60,
engenheiro e economista, é sócio e editor do site de economia e política Primeira Leitura. Foi presidente do BNDES e
ministro das Comunicações (governo
FHC).
Internet: www.primeiraleitura.com.br
E-mail - lcmb2@terra.com.br
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