São Paulo, terça-feira, 19 de setembro de 2006

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VINICIUS TORRES FREIRE

As famílias ricas de São Paulo

Diferença de renda entre as famílias cresce no Sudeste, o que explica redução menor da desigualdade no Brasil

AS FAMÍLIAS mais ricas do Sudeste, aquelas em que a renda mensal média é R$ 18,6 mil, são menos de meio por cento dos domicílios do Brasil. Somada, a renda dessas pessoas equivale à renda de quase 30% das casas dos brasileiros mais pobres (devem equivaler a mais, pois os rendimentos dos juros de aplicações financeiras são subestimados nas pesquisas).
A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios de 2005, a Pnad do IBGE, mostra que a desigualdade entre as famílias cresceu no Sudeste.
A fatia 10% mais rica das casas do Sudeste passou a abocanhar mais renda do Sudeste (40,6% do total) e do Brasil (21,4%). O aumento da renda dos 5% ou 10% mais ricos parece explicar a queda no ritmo de redução da desigualdade em 2005.
Em São Paulo, Santa Catarina e Goiás, houve ligeiro aumento no índice de desigualdade, mas importa mesmo o peso de São Paulo. Os moradores mais pobres de São Paulo e do Sudeste em geral perderam renda? Não. Os brasileiros mais pobres, aliás, tiveram razoáveis aumentos de renda (15%, de 2004 para 2005, no caso do fundo do poço da miséria, os 10% mais pobres). A perda ocorreu entre quem ganha entre R$ 1.600 e R$ 2.400 mensais.
O dado paulista é relevante porque ajuda a explicar a dinâmica da redução da desigualdade no Brasil neste início de milênio. Fazia uma década que não se verificava aumento de renda entre os mais ricos. Fazia nove anos, aliás, que a renda média do brasileiro não crescia.
Não se trata de lamentar que, num quadro de estagnação econômica, os mais ricos tenham sofrido mais. O problema é que, na primeira vez em dez anos que os mais ricos, e os mais ricos do Sudeste, vêem sua renda aumentar, o ritmo de redução da desigualdade caia para um ritmo menor que o da média dos anos FHC.
Tal resultado, associado aos fatores que devem ter influenciado a melhoria da renda dos mais pobres nos anos Lula, levanta dúvidas sobre o futuro da redução da extravagante injustiça brasileira. Nesses anos, entre 50% e 75% da redução da desigualdade de renda se deveu ao aumento da renda do trabalho. O restante, na maior parte, deveu-se a programas assistenciais.
É duvidoso, dado o aumento insustentável dos gastos do governo, que os programas de renda mínima (como Previdência rural ou Bolsa-Escola) possam distribuir a renda dos impostos no ritmo em que vinham fazendo até agora. Outro fator importante de redução de desigualdade de renda do trabalho foi a transferência de empregos melhores das metrópoles para o interior, em parte devido à desconcentração industrial, em parte devido ao sucesso do agronegócio (embora a renda do trabalho, de 2004 para 2005, tenha crescido mais para quem não tem carteira assinada).
Tais fatores não devem manter o mesmo dinamismo. Parece se esgotar o ciclo de redistribuição via impostos (e impostos crescentes), em quadro de estagnação. Para evitar que o ciclo de desconcentração da renda se interrompa, é preciso mais crescimento, educação e emprego para a mão-de-obra mais desqualificada, e tributos progressivos (pró-pobres). Isto é, o bolo dos fundos públicos deverá ser fatiado de forma diferente, o que será doloroso para os perdedores.


vinit@uol.com.br

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