São Paulo, sexta-feira, 19 de setembro de 2008

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Dólar vai a R$ 1,96, e BC decide intervir

Meirelles anuncia de NY que banco fará leilão de venda de dólares a partir de hoje e interrompe escalada da moeda na BM&F

Será a primeira ação desse tipo do Banco Central brasileiro desde fevereiro de 2003; dólar sobe 3,32% e fecha o dia cotado a R$ 1,93

DANIEL BERGAMASCO
DE NOVA YORK
FABRICIO VIEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

No dia em que o dólar superou R$ 1,96, o presidente do BC, Henrique Meirelles, anunciou que a instituição passará a promover leilões de venda de dólares, com compromisso de recompra futura. Esse tipo de operação não era feita desde fevereiro de 2003. A reação do mercado foi imediata, com a moeda estrangeira perdendo força. No pregão da BM&F, a divisa americana chegou a ser cotada a R$ 1,89 no fim do dia.
A primeira intervenção do Banco Central ocorrerá hoje, com um leilão no qual serão ofertados US$ 500 milhões. Para explicar a alta expressiva do dólar nos últimos dias, analistas apontaram a crescente procura pela moeda, em um mercado de oferta restrita.
Como o anúncio ocorreu muito próximo do fechamento do mercado de câmbio à vista, que encerra às 16h, o impacto nesse segmento foi menos intenso, e o dólar fechou vendido a R$ 1,93, com alta de 3,32%. As negociações nos pregões da BM&F (Bolsa de Mercadorias & Futuros) se estendem por mais uma hora, o que permitiu que a cotação descesse de forma mais acentuada. Dessa forma, espera-se que na abertura do mercado de câmbio hoje o dólar inicie em rota de queda.
"A liquidez em real continua normal, devido às condições de bom funcionamento da economia brasileira hoje (...) [Mas há] a questão da liquidez em dólares. Na medida em que existe um problema de liquidez do sistema financeiro americano, isso se reflete nas linhas interbancárias de dólares. Em função disso, o Banco Central do Brasil tomou a decisão, hoje, de promover leilões de venda de dólares conjugada com uma compra futura", declarou, em entrevista coletiva na sede do Consulado-Geral do Brasil em Nova York.
"Isto é: o Banco Central vai estar provendo liquidez no mercado interbancário de moeda estrangeira. Portanto, o BC vai estar atuando no sentido de corrigir uma distorção nos mecanismos de fornecimento de liquidez dos mercados internacionais", reforçou.
Após bater em R$ 1,56 no fim de julho, o dólar foi aos poucos se apreciando até atingir o atual patamar, que é o maior em mais de um ano. Apenas em setembro, a divisa norte-americana registra apreciação de 18% diante do real.
No início da tarde de ontem, a procura por dólares se acelerou rápida e fortemente, o que fez com que a moeda dos EUA chegasse a registrar valorização de 5,09%, cotada a R$ 1,963.
Meirelles afirmou que a ação não está relacionado à disparada do dólar no país. "Não temos nenhum objetivo de influenciar as cotações de câmbio, mas simplesmente de corrigir problemas eventuais de liquidez nos mercados, como qualquer Banco Central do mundo."
Às maiores dificuldades em se conseguir linhas de crédito especialmente para o setor exportador, decorrentes da piora na crise internacional, somou-se uma troca de posições dos bancos e investidores estrangeiros. Até agosto, havia uma aposta -sinalizada por operações feitas no mercado futuro- na continuidade da apreciação do real, que se reverteu intensamente nos últimos pregões.
"O que temos visto nos últimos dias no câmbio é um movimento especulativo", resume Mário Battistel, diretor de câmbio da Fair Corretora.

Em busca de informação
Meirelles chegou anteontem aos EUA para encontros com "autoridades americanas e [representantes] do setor privado" para, segundo ele, se informar sobre as perspectivas do sistema financeiro e da macroeconomia. "A crise, de fato, é séria, como já está claro para todos, e não está debelada", disse ele, que insistiu que o Brasil está em condição favorável, com economia "sólida".
"O Brasil, nos últimos anos, reforçou fundamentalmente seu mecanismo de resistência a choques externos, como está sendo demonstrado agora. O Brasil se preparou para um cenário internacional de maior dificuldade".
Meirelles disse ainda que não sabia da possibilidade da ação coordenada entre bancos centrais no mundo, anunciada ontem. "Minha capacidade de previsão não chegou ainda a esse ponto", brincou. "Concluímos que estava havendo uma deterioração e uma agudização da liquidez e portanto tomamos a decisão de vir."
No leilão de hoje, no qual serão vendidos US$ 500 milhões no mercado de câmbio, os bancos que participarem da operação se comprometerão a revender a mesma quantia de volta para o BC dentro de 30 dias.
Por meio de sua assessoria, o BC informou que a decisão foi tomada "em função da restrição de liquidez observada nos mercados financeiros internacionais [...], é de caráter temporário e não tem como objetivo influir na taxa de câmbio".
Os dólares que serão vendidos saem das reservas internacionais do governo, que anteontem estava em US$ 208,6 bilhões. Leilões de venda de dólar com compromisso de recompra, como o anunciado ontem, não são feitos pelo BC desde fevereiro de 2003. Naquela época, o país ainda se recuperava da crise do ano anterior, quando as linhas de crédito internacionais para o país se reduziram repentinamente e o BC passou a ser uma das principais fontes de dólares do mercado. Dependendo do resultado do leilão de hoje, o BC avaliará se fará outras operações do tipo na próxima semana.


Colaborou a Sucursal de Brasília


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