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Economia chinesa tem problemas, afirma Pettis
Professor americano vê desaceleração econômica e pessimismo do consumidor
Professor da Universidade
de Pequim diz que
desmoronamento do
mercado de ações tem forte
impacto psicológico no país
RAUL JUSTE LORES
DE PEQUIM
"Há um ano, quando eu era o
único pessimista com o rumo
da China, chamavam-me para
balancear debates em que todos eram otimistas. Agora já tenho vários colegas no pessimismo", diz o economista norte-americano Michael Pettis, professor de finanças da Universidade de Pequim.
Pettis, que mora há seis anos
no país, acha que a China demorou para apreciar sua moeda, o yuan, e enfrenta vários
problemas ao mesmo tempo:
desaceleração da economia,
das exportações e da compra de
imóveis, inflação e pessimismo
do consumidor.
Leia os principais trechos da
entrevista que ele deu à Folha.
FOLHA - A medida anunciada ontem -de reduzir o imposto cobrado
na compra de ações- pode voltar a
estimular os mercados na China?
PETTIS - Não haverá um forte
impacto porque o mercado de
ações tem ainda um peso muito
pequeno no PIB chinês, mas
ver o mercado desmoronar tão
rápido tem um efeito psicológico. Mais importante é o mercado imobiliário. Consumidores,
bancos e grandes empresas investiram pesadamente em
imóveis, muito mais que em
ações, e os preços em queda vão
afetar toda a economia.
FOLHA - Fala-se de um pacote bilionário de investimentos em infra-estrutura para estimular a economia.
É suficiente?
PETTIS - Nenhum investimento
é feito em uma semana. Mesmo
que sejam US$ 50 bilhões, US$
100 bilhões, leva tempo para
que sejam implementados e
pode demorar dois anos para
ter algum efeito prático.
FOLHA - O consumo interno pode
compensar a desaceleração das importações e da construção civil?
PETTIS - O consumo na China é
muito baixo. Enquanto nos
EUA responde por 70% do PIB,
em diversos países são 60%,
aqui são 30%, 35%. O consumidor chinês é conservador, economiza muito. Como não há
aposentadorias nem sistema de
saúde gratuito, todos vivem
economizando. Já vi cenas horríveis, como o paciente que ficaria salvo com seis dias a mais
de tratamento deixar o hospital
para a morte por não ter como
pagar.
FOLHA - Os investimentos têm
mais peso que o consumo interno
no PIB. Pode faltar dinheiro nesse clima pessimista?
PETTIS - Não há falta de dinheiro na China para investimentos. Mas, se as exportações não
crescem, os empresários não
pensarão em produzir mais.
Mesmo que tenham acesso a
crédito, se as imobiliárias não
conseguirem vender apartamentos, não irão construir
mais. Existir dinheiro não basta. O Japão chegou a oferecer
empréstimos a taxa zero e ninguém queria pegar.
FOLHA - A redução na taxa de juros
e nos depósitos bancários para empréstimos pode ajudar pelo menos a
recuperar o mercado imobiliário?
PETTIS - Vai ter impacto pequeno. Um círculo virtuoso pode
facilmente se tornar um círculo
vicioso.
Os preços do metro quadrado
cresciam sem parar e ainda assim as pessoas compravam
porque esperar um mês significava comprar o mesmo apartamento bem mais caro.
Agora, diante desse mercado
mais pessimista, os futuros
compradores estão esperando
para ver, vêem que os preços
estão em baixa, aguardam mais
para ver até quanto podem baixar.
FOLHA - O governo chinês tem reservas de US$ 2 trilhões e os maiores
bancos são estatais. Ele tem margem muito maior para fugir da crise?
PETTIS - O governo está preocupado desde o ano passado. O
premiê Wen Jiabao falou que
2008 seria um ano muito difícil
e não estava brincando. Exportações, consumo e investimentos estão se desacelerando.
E a inflação ainda é um problema. Ainda que os preços ao
consumidor tenham declinado
nos últimos meses, a inflação
dos preços ao produtor, de matérias-primas e importações,
ainda está muito alta.
O risco é que eles afrouxem
as condições monetárias para
estimular a demanda e o investimento, mas, em vez de produzir isso, meramente causem o
aumento de preços.
FOLHA - Ao comprar US$ 400 bilhões em títulos de Freddie Mac e
Fannie Mae, a China apostou demais na mesma ficha? O país pode
deixar de investir tanto nos EUA?
PETTIS - Não há outra saída para a China investir seu capital
de exportações, com tantos superávits na balança comercial.
O yuan é subvalorizado. Se o
banco central não comprar dólares, vai comprar euros. É
muito barato para as empresas
estrangeiras comprarem aqui,
mas é caro para as chinesas investirem no exterior.
FOLHA - Teme-se um crescimento
de "apenas" 8% no PIB já no ano que
vem. É mesmo grave?
PETTIS - Se a economia crescer
menos de 10%, a China não
produzirá os empregos necessários para milhões de pessoas
todos os anos. O país está mudando rapidamente e em quatro ou cinco anos haverá menos
jovens, por causa da política do
filho único, mas o êxodo rural
continuará, milhões de pessoas
continuarão a buscar empregos
nas cidades.
Nos EUA, se houvesse um
crescimento de 10% do PIB, faltaria gente para os empregos, o
país teria de importar mão-de-obra. A China precisa disso.
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