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ARTIGO
Perda de bússola gera pânico
GILLIAN TETT
DO "FINANCIAL TIMES"
Enquanto os mercados tremiam ontem, a agência de classificação de crédito americana
Standard & Poor's detonava
mais uma granada, ainda que
pequena: depois de anunciar
em março projeções de prejuízos de cerca de US$ 285 bilhões
para ativos hipotecários dos
bancos, ela casualmente elevou
a cifra em mais de US$ 100 bilhões, devido à queda nos valores dos ativos. Diante dos dramas recentes, esses US$ 100 bilhões podem não parecer tão
desastrosos -o economista
Nouriel Roubini antecipa que
os prejuízos totais com créditos
atinjam US$ 2 trilhões antes
que a crise se encerre.
Mas a revisão da projeção da
S&P destaca um problema que
explica muito sobre a atual
tempestade -o fato de que os
recentes acontecimentos deixaram os investidores e instituições tão desorientados que
existe confusão generalizada
quanto ao valor de praticamente tudo. O mundo financeiro
perdeu a sua bússola.
E isso causou desorientação
tamanha entre os investidores
que eles ou estão correndo em
busca de segurança ou simplesmente se recusam a operar. O
resultado é impasse e pânico.
Isso marca a culminação de
problemas que vinham se intensificando silenciosamente
há um ano. Nesta década, os investidores vinham dependendo pesadamente das agências
de classificação para que servissem como bússola no mundo dos produtos financeiros
complexos. Mas quando elas
começaram a rebaixar alguns
dos títulos lastreados por hipotecas, na metade do ano passado -em certos casos reduzindo
classificações AAA diretamente ao status de "junk bonds"-, a
confiança em seu sistema de
classificação se deteriorou.
Naquela altura, alguns investidores começaram a recorrer
aos mercados para compreender os instrumentos financeiros complexos. Afinal, o capitalismo dos EUA têm reverência
inerente pelos sinais do mercado quanto a preços, a tal ponto
que as autoridades regulatórias
cada vez mais vêm forçando
instituições a contabilizar seus
ativos pelo valor de mercado.
No entanto, ao longo dos últimos 12 meses, as transações em
muitos quadrantes do complexo mundo das finanças escassearam, o que torna praticamente impossível descobrir
preços reais de mercado. Assim, em desespero, os investidores e auditores começaram a
usar outras fontes de avaliação,
potencialmente problemáticas
como o chamado índice "ABX",
que acompanha o custo de garantir títulos lastreados por hipotecas contra inadimplência.
A prática teve implicações
devastadoras aos bancos. Nos
últimos 12 meses, o ABX despencou: o preço implícito de
papéis com classificação AAA
estava em só 45% de seu valor.
Como resultado, instituições
financeiras, a exemplo da AIG
ou do Merrill Lynch, reportaram imensos prejuízos em termos de valor de mercado de
seus ativos e aparentemente de
maneira repentina.
Isso devastou sua base de capital. Além disso, também fez
com que os investidores cada
vez mais perdessem a confiança nos bancos e nas contas que
eles publicam. E à medida que
os investidores passavam a rejeitar os bancos, eles também
tropeçaram e encontraram
problemas de financiamento.
Os BCs tentaram conter essas preocupações imediatas
quanto à liquidez. Mas isso não
basta para combater a causa básica do problema, ou seja, o temor de que o sistema bancário
esteja desprovido do capital de
que necessita para cobrir seus
prejuízos cada vez maiores.
Pior, com as estimativas quanto ao rombo oscilando entre os
US$ 200 bilhões e os US$ 500
bilhões, os investidores não
conseguem ver de que maneira
esse montante poderia ser obtido de fontes privadas.
No longo prazo, a saga sem
dúvida reforçará os apelos por
uma reforma na estrutura regulatória. Mas o desafio mais
premente no momento é como
pôr fim à desorientação.
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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