São Paulo, quinta-feira, 19 de outubro de 2006

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VINICIUS TORRES FREIRE

Neolulismo?

Governo promete "virada desenvolvimentista", com juro baixo. Se der certo, é um início, mas não uma solução

O VENERANDO colunista Clóvis Rossi publica hoje nesta Folha relato de uma viagem aos corredores econômicos do governo, em Brasília (a reportagem está na capa deste caderno). Coletou alguns espécimes de idéias novas e boas sobre a economia do neolulismo -o problema, como diz a velhíssima piada acadêmica, é que as idéias boas não são novas, e as idéias novas não são boas. Por último, ficou ainda a dúvida a respeito do futuro desses pensamentos.
Trata-se do último show pirotécnico da campanha petista, que se inclinou pelo esquerdismo retórico de resultados (eleitorais), ou de projetos que serão mesmo bancados por Lula, se eleito?
O governo Lula 2 reduziria os juros nominais, da taxa Selic, para 9% no ano que vem. Ontem, o Banco Central baixou a Selic para 13,75%. Por ora, bancos, outras instituições financeiras e consultorias estimam uma Selic de 12% no final de 2007.
Em termos reais e de mercado, a taxa de juros está em torno de 9% ao ano, no degrau mais baixo da história. A partir daí, não se sabe bem o que acontece na economia brasileira. A média do pessoal do mercado, que tem uma opinião tendenciosa sobre o assunto, mas não amalucada ou apenas chutada, acredita que, abaixo desse patamar, pode haver inflação por hiperaquecimento da atividade produtiva.
Entre o pessoal mais refinado e de mais bom senso nesse mesmo mercado, há gente para quem a formação de preços no Brasil mudou e que a "taxa de juros de equilíbrio" (a que não provoca inflação) seria mais baixa. Mas as expectativas da média do mercado tendem a enviesar uma parte da ação do BC, e, se o mercado fincar pé numa certa estimativa exagerada de inflação e de juros, o BC em parte será puxado por tal esperança tendenciosa.
Mas, se a inflação realmente parecer inerte, nem mesmo tais esperanças tendenciosas resistirão. Isso posto, levar os juros a 9% depende da inflação e das expectativas de mercado e do BC. Se o governo quiser ignorar tais fatores, terá de arrumar encrenca com o BC.
Digamos que tais probleminhas e imponderáveis sejam superados. Com taxa de 9%, e tudo mais constante, a despesa com juros cairia para uns 4% ou 5% do PIB (hoje, é de uns 8%). O déficit público nominal tenderia a cair a zero. A dívida pública começaria a cair a um ritmo anual de metade do crescimento do PIB. Tudo isso sem corte de gastos primários (as despesas públicas afora juros). Viria o "espetáculo do crescimento". Viria?
Bom, ter menos dívida pública é um bom começo. Se tal cenário fiscal ocorresse, tenderia haver mais valorização do real. O "neolulismo desenvolvimentista" então interviria mais no câmbio. O que pouco resolve, a não ser que se façam loucuras fiscais. Ainda assim, restariam tantos problemas.
O que fazer de inempregáveis e milhões de desempregados das metrópoles, que perderem para sempre os empregos devido à abertura comercial e à relocalização industrial pelo país? Por que a produtividade cresce tão devagar? De onde virá a energia se o país crescer mais rápido? Decerto crescimento puxa investimento, mas no curto prazo estamos de calças curtas.


vinitu@ol.com.br

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