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Calote em cartão cresce nos EUA
Crise chega ao bolso dos consumidores, que deixaram de pagar dívidas no prazo
Cartões são largamente usados pelos consumidores norte-americanos; Fed diz que inadimplência teve aumento de mais de 50%
FERNANDO CANZIAN
ENVIADO ESPECIAL A WASHINGTON
A crise financeira nos Estados Unidos também já invadiu
os bolsos e as carteiras dos norte-americanos. Grandes bancos no país e o próprio Fed (o
banco central dos EUA) já registram aumentos superiores a
50% no não-pagamento de dívidas de cartões de crédito.
No mercado de automóveis,
também houve aumento de
mais de 40% no total exigido à
vista do comprador para adquirir um veículo financiado.
Em meio à crise do crédito,
vários bancos já são obrigados a
fazer provisões maiores no caixa para compensar perdas nos
balanços com inadimplentes.
Depois dos salários, os cartões de crédito são a principal
fonte de dinheiro das famílias
norte-americanas -em média,
cada família tem 13 deles.
Nos últimos dez anos, as dívidas dos norte-americanos em
cartões de crédito aumentaram
75%. No mesmo período, com
variações ao longo do caminho,
tanto a renda como o nível de
emprego no país se mantiveram praticamente estáveis.
Os cartões são usados largamente pelos consumidores
americanos. Mais de 40% deles
"rodam" mensalmente dívidas,
que integram o total de US$ 14
trilhões em débitos das famílias
no país -o equivalente a mais
do que o PIB (Produto Interno
Bruto) dos Estados Unidos.
Para isso, usam principalmente o crédito rotativo dos
cartões, fazendo quase sempre
pagamentos mínimos. No último ano, 25% dos usuários afirmaram ter elevado suas dívidas
no cartão, segundo pesquisa da
Universidade de Harvard.
Foi esse sólido aumento do
endividamento que tirou o país
rapidamente da recessão de
2000. Ele também é a prova de
que os norte-americanos vivem
há anos acima de suas possibilidades financeiras.
O aumento do calote entre
usuários de cartões começou
antes da piora da crise financeira, em meados de setembro.
O maior banco dos EUA, o
JPMorgan Chase, registrou entre julho e setembro deste ano
crescimento de 45% na inadimplência de seus usuários de
cartão na comparação com o
mesmo trimestre de 2007. Hoje, cerca de 7% dos empréstimos feitos pelo JPMorgan via
cartões estão inadimplentes.
No Capital One, o volume de
inadimplentes cresceu de 5,8%
para 6,4% no mesmo período.
O próprio Fed afirma que, em
média, o crescimento da inadimplência no mercado de cartões neste ano já bateu em 54%.
Mais exigências
Outro levantamento do Fed
mostra que 65% das empresas
de cartões de crédito no país já
apertaram neste ano as exigências para a emissão de novos
cartões. Isso vem impossibilitando outra prática comum entre os norte-americanos: adquirir um novo cartão, com juros menores, para pagar as dívidas de outros cartões, com juros maiores.
Enquanto os preços dos imóveis estavam subindo nos EUA,
muitas famílias também pegavam financiamentos periódicos dando como lastro suas residências, cujos preços em alta
garantiam os empréstimos.
Com o estouro da bolha imobiliária, a situação se inverteu
completamente.
"O que importa é a tendência
que tudo isso vem tomando.
Com as empresas começando a
cortar custos e empregos, as
perspectivas para o emprego e
a renda são terríveis", afirma
Ian Shepherdson, economista
da empresa de análises High
Frequency Economics.
Em setembro, as vendas do
comércio nos EUA caíram
1,2%. Com o resultado, foi a primeira vez em mais de 16 anos
que os consumidores norte-americanos compraram menos
de um trimestre para o outro.
"Os consumidores colocaram o pé no freio antes da piora
da crise, o que é uma má notícia
para todos", diz Joel Naroff, da
Naroff Economic Advisors.
Além dos cartões, o mercado
de financiamento de veículos
também já revela o aperto entre as famílias norte-americanas para obter crédito.
Na média, as grandes revendedoras de veículos nos Estados Unidos estão exigindo uma
entrada mínima na compra de
um automóvel 42% maior agora do que o faziam há dois anos,
segundo a consultoria Edmunds.com, especializada no
ramo. O valor médio mínimo
exigido hoje é de US$ 3.108.
De julho a agosto passados,
caiu de 95% para 88% o valor
total médio financiado na compra de veículos.
Também na média, as vendas
das maiores montadoras do
país caíram cerca de 20% em
setembro, levando a rumores
de possível falência da General
Motors ou de sua fusão com outra grande empresa do setor.
A única boa notícia nesse setor -e para as famílias americanas- está na recente e forte
queda no preço do petróleo,
que pode voltar a impulsionar a
venda de veículos e o consumo.
Segundo cálculos de Lawrence Goldstein, economista da
área de energia, mantidos os
preços no patamar atual (50%
abaixo do pico de julho, mais de
US$ 145 por barril), as famílias
norte-americanas terão, nos
próximos 12 meses, uma "folga" total de US$ 250 bilhões no
orçamento por conta da gasolina mais barata.
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