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LUÍS NASSIF
O nascimento do Brasil
Ainda há pouca literatura
econômica sobre o período
do pós-guerra no Brasil, que vai
do governo Dutra ao início do governo JK. Os estudos concentram-se em alguns pontos, como
as missões econômicas norte-americanas, a queima de divisas
da era Dutra; os investimentos
em infra-estrutura do segundo
governo Vargas. No entanto o período 1947 a 1953 foi de um crescimento vertiginoso.
A suposta queima de reservas
do governo Dutra merece um
pouco mais de investigação. Em
1977, colhi um longo depoimento
de Mário Bittencourt Sampaio,
ex-diretor do poderoso Dasp (Departamento de Administração
do Serviço Público) e homem incumbido, do lado brasileiro, da
implantação do Plano Salte (de
cooperação com o governo norte-americano para investimento em
infra-estrutura). Ele negava a
queima irresponsável de divisas e
sustentava que os dólares permitiram a implantação das primeiras refinarias no país.
Recentemente, conversei longamente com um desses personagens que convivem com as salas
do poder desde o governo Dutra.
A Inglaterra tinha imensa dívida
de guerra e se recusava a pagar.
Houve pressão norte-americana,
e decidiu-se que o pagamento seria efetuado por meio de cartas
de importação. As importações
eram a única maneira de recuperar as divisas brasileiras acumuladas, disse ele. Mas as reservas
efetivas de ouro teriam ficado intocadas.
O governo Vargas
O segundo governo Vargas foi
histórico. Em geral, não é lembrado nem por tudo de bom que
fez nem pelos erros graves que
cometeu. Um dos erros graves foi
o crescimento desvairado das
importações, baseado em uma
hipótese que não se concretizou:
o da Terceira Guerra Mundial,
interrompendo o fornecimento
de equipamentos necessários para a industrialização brasileira.
Essa análise me foi passada pelo
embaixador Walther Moreira
Salles, que, à época, dirigia a Sumoc (Superintendência de Moeda e Crédito) e, na qualidade de
assessor do então ministro da
Fazenda, Horácio Lafer, participou da histórica 4ª Reunião de
Consulta dos Chanceleres, que
resultou na Comissão Mista Brasil-Estados Unidos.
O receio da Terceira Guerra estimulou um pan-americanismo
do governo Truman, que convocou a reunião. Do lado brasileiro, havia um pragmatismo absoluto, de aproveitar o momento
para obter vantagens econômicas.
A estratégia diplomática, definida pelo chanceler João Neves
da Fontoura, era a de que a preparação dos países aliados não
se poderia dar exclusivamente
em torno da entrega de equipamentos bélicos, mas da sua consolidação econômica. O ministro
Lafer e o chefe da assessoria econômica, Rômulo de Almeida,
coordenaram grupos de trabalho que consolidaram um documento com a identificação precisa das principais carências brasileiras, o chamado "Plano Lafer".
Da reunião nasceu a Comissão
Mista Brasil-EUA, cujos trabalhos duraram um ano, mas que
marcariam para sempre a história do Brasil, em parte pelos investimentos consolidados em infra-estrutura -US$ 300 milhões
da parte dos EUA-, em parte
pela criação do BNDE.
Em um país praticamente sem
poupança, o "funding" para o
banco foi montado em cima de
um adicional do Imposto de
Renda, e, para a Petrobras, da
venda de ações para prefeituras,
em reuniões em Petrópolis na
casa de Wolf Klabin, com o engenheiro Glycon de Paiva fazendo
as contas, e Lafer, Roberto Campos e Walther Moreira Salles
ajudando nas sugestões.
Foram definidos 42 projetos
para financiamento em conjunto. Os trabalhos duraram um
ano, resultaram em investimentos pesados em energia, rodovias, sistema portuário, navegação, indústrias.
Importante também foi o fato
de Vargas ter começado a dar
forma às comissões para estudo
de projetos econômicos e que serviriam de modelo para as futuras comissões de JK.
Foi montada uma Comissão
de Desenvolvimento Industrial
que juntou os primeiros elementos para um trabalho de mapeamento de indústrias inexistentes
no país, de ampliação do parque
instalado, de implantação da indústria automobilística, fábricas
de locomotivas etc.
O governo JK começou a nascer ali.
E-mail -Luisnassif@uol.com.br
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