São Paulo, domingo, 20 de fevereiro de 2005

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"RATING"

Instabilidade política e econômica afasta país do grau de investimento; para analistas, endividamento ainda precisa ser reduzido

Brasil fica atrás em corrida por boa avaliação

CÍNTIA CARDOSO
DA REPORTAGEM LOCAL

O desempenho inconstante da economia brasileira tem afastado o país da possibilidade de alcançar o topo das classificações das principais agências de risco do mundo. Algumas incertezas políticas também.
Levantamento feito pela Standard & Poor's a pedido da Folha mostra que, em 1994, havia 35 países na categoria de "investment grade" (grau de investimento) no ranking da agência. No final de 2004, o número estava em 62. No caso da agência Fitch, 22 eram avaliados como "investment grade" em 1994 e, em 2004, eram 55.
Entre as economias mais sólidas da América Latina -México, Chile e Brasil-, só o Brasil permanece na situação de "grau especulativo". Mesmo a Rússia, que decretou moratória em 1998 e desencadeou uma crise nos emergentes, foi elevada recentemente à categoria de "investment grade" pelas duas agências.
Atualmente, a S&P concede ao Brasil a nota BB- para dívida denominada em moeda estrangeira e BB para dívida em moeda local. A Fitch avaliou o Brasil com um BB- para ambas. As duas agências dão um prognóstico "estável" para as notas de crédito do Brasil. Isso significa que não deve haver alteração da classificação de seis meses a um ano. Os "ratings" (notas de crédito) são uma modalidade de avaliação criada pelas agências de risco para indicar a capacidade de um país honrar o pagamento de sua dívida. Na maioria dos casos, são os próprios governos que pedem para ser avaliados.
Na avaliação de Roberto Rigobon, do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts), o Brasil ainda "não está pronto" para esse passo. Diferentemente dos economistas das agências internacionais de risco, que apontam as fragilidades macroeconômicas como os principais obstáculos, o economista do MIT enfatiza aspectos políticos.
"O governo tem administrado a economia muito bem, mas, na campanha presidencial, Lula fez críticas duras à política econômica do presidente Fernando Henrique Cardoso e agora viu que ela não era tão ruim assim e continua a adotá-la. O mercado tem gostado [da continuidade], mas não dá para fazer campanha populista, criticar tudo e fazer tudo igual. Sempre fica uma desconfiança", disse o economista à Folha.
Para Lisa Schineller, analista de crédito para o Brasil da Standard & Poor's, em Nova York, o fato de 2006 ser um ano eleitoral no Brasil vai ajudar a causar mais alguma lentidão nas tão aguardadas reformas. "Percebemos que o momento de aprovação das reformas [independência do Banco Central, mercado de trabalho] parece estar com um ritmo mais lento, mas elas são cruciais", afirmou.
Morgan Harting, da Fitch, também aponta "problemas na natureza da política" do Brasil. "Tem muitos "veto players" ["atores" com poder de veto]. É muito difícil e moroso passar leis. Muita coisa necessita de mudanças na Constituição", argumentou. Mas ele destaca que percebe um "sólido consenso" político em aspectos econômicos importantes, como a flutuação cambial e a manutenção do superávit primário.

Fundamentos previsíveis
No âmbito econômico, o principal obstáculo do Brasil para ser alçado ao patamar de grau de investimento continua a ser a alta proporção entre a dívida líquida pública e o PIB (Produto Interno Bruto). Segundo a S&P, a relação líquida entre dívida governamental e PIB no Brasil deve ficar um pouco abaixo de 58% ao final deste ano. Essa relação de dívida é quase 20% mais alta que a dos países na mesma categoria do Brasil e na BB e duas vezes superior à dos países BBB (primeiro nível do "investment grade').
O Brasil, diz Schineller, precisa ter "fundamentos econômicos mais previsíveis". Mas a agência elogia a queda da necessidade de financiamento externo (déficit em conta corrente, dívida de curto prazo, amortizações de médio e longo prazo) para menos de 110% do volume de reservas cambiais no período em 2004, ante quase 200% em 2002 e 300% no biênio 2000/2001.
O analista da Fitch argumenta também que a manutenção das perspectivas de crescimento são fatores importantes. "2004 foi um bom ano, e o Brasil ainda sente os reflexos, mas o horizonte da nossa classificação é de longo prazo. Avaliamos títulos da dívida com maturidade de 10 anos, por exemplo", diz.

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