São Paulo, domingo, 20 de fevereiro de 2005

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Investimento não depende do PIB

PHILIP COGGAN
DO "FINANCIAL TIMES"

Oleg Romanov - 12.fev.05/Associated Press
Soldados em Moscou à frente de um cartaz publicitário; mesmo após moratória recente, Rússia alcançou grau de investimento


O investimento mundial deveria ser simples. Bastaria selecionar países com crescimento mais alto a longo prazo, comprar ações em suas Bolsas e esperar a chegada dos retornos.
A estratégia não funcionou. Trabalho de pesquisa dos professores Elroy Dimson, Paul Marsh e Mike Staunton, da London Business School, com o banco ABN Amro, demonstra que, no longo prazo, não existe, virtualmente, correlação entre crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) e retornos sobre o investimento.
A conclusão pode parecer exótica. Mas há diversas maneiras de demonstrá-la. Primeiro, da amostra de 53 países, os professores estudaram os 17 para os quais dispunham de dados referentes a 105 anos. Havia uma correlação pouco importante entre o crescimento do PIB e os retornos das Bolsas, mas correlação negativa entre os retornos e a renda per capita. Seria possível alegar que o segundo indicador é mais importante, porque demonstra se os indivíduos estão enriquecendo.
Segundo, os professores verificaram se o crescimento anterior do PIB estava vinculado a futuros retornos. Tomaram dados de todos os 53 países e os dividiram em cinco grupos com base no crescimento de seu PIB ao longo dos cinco anos anteriores. Depois, estudaram os retornos do mercado de ações no ano subseqüente a cada período. Os investidores que aplicaram no grupo de mais baixo crescimento obtiveram retorno anual médio de 12%, e os que investiram no grupo de mais alto rendimento obtiveram apenas 6%. Por fim, eles estudaram os 53 países para determinar se existia alguma correlação entre o crescimento do PIB em um determinado ano e os retornos sobre o investimento no ano seguinte. Em nenhum país foi constatada relação estatisticamente relevante.
O que isso tudo nos diz? Sugere que os países de bom crescimento podem se assemelhar às ações de bom crescimento. Os investidores se entusiasmam com o potencial da China ou com o uso da internet, de modo que levam as ações a uma alta. Do patamar elevado, os retornos subseqüentes em geral se provam baixos. A China é um exemplo: seu PIB cresceu em 9,5% no ano passado, mas seus mercados de ações ofereceram retorno médio negativo em 21%.

Dividendos
A explicação parece mais convincente se observarmos os detalhes. Os leitores podem estar familiarizados com a fórmula de que os prováveis retornos futuros de um mercado de ações equivalem a dividendo mais futuro crescimento do dividendo. Ao longo dos últimos cem anos, essa regra vem se provando razoavelmente fidedigna. No Reino Unido, por exemplo, os retornos reais foram de 5,4%; o rendimento dos dividendos somado ao crescimento dos dividendos atingiu os 5,2%.
Na maioria dos países, os retornos efetivos foram ligeiramente superiores ao total sugerido pela equação dividendo mais crescimento. Isso se deve ao fato de que os mercados de ações foram corrigidos, ou seja, os rendimentos de dividendos são mais baixos hoje do que há um século. Isso propiciou aos investidores um ganho de capital adicional.
O fato mais notável que emerge dessa análise é o histórico medíocre do crescimento real de dividendos. Em 11 dos 17 países do grupo estudado com mais detalhes pelos professores, os dividendos caíram, em termos reais, ao longo dos 105 anos passados. Somente dois países, África do Sul e Suécia, registraram dividendos crescendo em ritmo semelhante à renda per capita. Nos Estados Unidos, os dividendos reais cresceram em apenas metade do percentual de crescimento do PIB.
O grosso dos retornos, portanto, veio do rendimento efetivo dos dividendos, e não de seu crescimento. Isso pode explicar por que os mercados "de valor" se deram melhor que os países "de crescimento": os primeiros tinham um rendimento de dividendo alto com que começar.

Explicação
Mas ainda precisamos de uma explicação para o desempenho tão medíocre do crescimento real de dividendos. Três respostas saltam à mente. Primeiro, a proporção distribuída pode ter caído ao longo do período, ou seja, os lucros talvez tenham crescido mais rápido que os dividendos. Isso talvez seja correto, mas infelizmente os dados quanto aos lucros são muito menos confiáveis do que os dados s-obre dividendos. Não conhecemos a resposta.
Mesmo que a explicação fosse verdade, o que as empresas fizeram com o dinheiro? Isso nos conduz à segunda potencial explicação: os lucros foram capturados ou desperdiçados pelo comando executivo. É natural presumir que quanto menor a proporção de lucros distribuída, mais a empresa pode investir e mais rápido crescerão seu lucro e dividendo.
Uma terceira possibilidade é que o mercado de ações formal não capture todo o potencial de crescimento de uma economia. As empresas de crescimento mais rápido muitas vezes podem ser as menores, controladas por empresários individuais.
Isso ajudaria a explicar por que os mercados emergentes apresentaram desempenho tão desfavorável, em longo prazo, a despeito de seus índices superiores de crescimento econômico. Em muitos países, grandes partes da economia não estão representadas nas Bolsas, e mesmo nos casos em que as empresas estão cotadas, executivos e pessoas favorecidas podem controlar o capital.

Esperança
Mas os professores oferecem alguma esperança para os investidores em emergentes. O argumento em favor do crescimento talvez não funcione, mas a defesa da diversificação o faz. Os mercados desenvolvidos apresentaram correlações mais fortes nos cinco anos passados do que nos cinco anteriores. Mas os mercados emergentes individuais agora demonstram baixa uns com os outros, e os mercados emergentes como um todo têm conexão muito frouxa com Wall Street, Tóquio e Bolsas desse porte. Em resumo, você investe em mercados emergentes não porque terão desempenho superior, mas porque podem se sair bem quando o resto de sua carteira de ações não o faz.

Tradução de Paulo Migliacci


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