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CONTAS VIGIADAS
Banqueiro afirma que recurso serviu para elevar capital do banco, comprar créditos podres e pagar bônus
Fundo de offshore foi aplicado, diz Edemar
MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL
O banqueiro Edemar Cid Ferreira informou à Folha, por meio
de seus advogados, que os US$
224,6 milhões captados pela Alsace Lorraine foram aplicados integralmente no Banco Santos. O valor corresponde a R$ 577,3 milhões, segundo a cotação do dólar
de anteontem. Edemar afirma
que não foi beneficiado diretamente pelos recursos da Alsace
Lorraine em nenhum momento.
Pela primeira vez ele reconhece
que é o sócio-controlador da offshore sediada nas Ilhas Virgens
Britânicas, no Caribe. "O Edemar
é o dono da Alsace Lorraine", diz
o advogado Ricardo Tepedino.
A Justiça das Ilhas Virgens Britânicas decidiu liqüidar a Alsace
Lorraine em 28 de janeiro último
porque a empresa não honrou
duas promissórias no valor de R$
3 milhões, aproximadamente. A
empresa de auditoria KPMG foi
escolhida para tentar descobrir o
destino dos recursos captados pela Alsace Lorraine.
Taxa de 11% ao ano
O banqueiro informa que a Alsace Lorraine foi criada em 2000
com o objetivo de captar recursos
no exterior para o Banco Santos.
Quem colaborava nessa operação
era o Bank of Europe, instituição
baseada em Antígua, um paraíso
fiscal no Caribe.
Esse banco vendia promissórias
da Alsace Lorraine ou participações numa promissória global
dessa offshore. Os clientes eram
atraídos pela taxa oferecida pelo
Bank of Europe: 11% ao ano para
investimentos em dólar. Os bancos norte-americanos ou europeus remuneram aplicações em
dólar em 4% ao ano, em geral.
"Todos os investidores da Alsace Lorraine sabiam que era uma
aplicação de risco", afirma o advogado Sergio Bermudes.
O Bank of Europe, segundo Bermudes, é controlado por uma holding suíça chamada Beauford.
Edemar diz que não foi proprietário nem integra o quadro de acionistas do Bank of Europe. A Beauford também é dona do braço
brasileiro do Bank of Europe, a
European Advisors, de acordo
com o banqueiro. A Beuaford tem
100% das ações da European, segundo ele.
A irmã de Edemar, Edna Ferreira de Souza e Silva, fez parte da sociedade que criou a European Asset junto com a Beauford e Ricardo Russo Candido de Souza. Tepedino diz que isso ocorreu porque Edna tinha uma empresa de
gaveta, que ainda não havia sido
ativada, e a European Asset aproveitou o número do CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas) dela. Segundo ele, a irmã de
Edemar jamais participou dos negócios da European. Edna foi desligada da sociedade em março de
2003. No ano passado, a European Asset foi rebatizada de European Advisors.
O executivo Candido de Souza
trabalhou no Banco Santos e foi
diretor da E-Financial, empresa
criada por Edemar para atuar na
área de comércio eletrônico.
US$ 27 milhões em bônus
A informação de que a Alsace
Lorraine tinha US$ 224,6 milhões
de investidores em 22 de dezembro do ano passado foi apurada
pelo interventor do Bank of Europe, Peter Queeley. O Bank of Europe sofreu intervenção dias depois de o Banco Central intervir
no Banco Santos, em 12 de novembro do ano passado. Segundo
Queeley, que representa o Banco
Central de Antígua no processo
de intervenção, o Bank of Europe
está insolvente.
A Alsace Lorraine já teve mais
recursos do que os US$ 224,6 milhões contabilizados em dezembro, ainda de acordo com Tepedino. Nos últimos cinco anos, essa
offshore repassou US$ 251,2 milhões para o banco de Edemar ou
para empresas controladas pelo
banqueiro, informa o advogado.
Esse montante, diz Tepedino, foi
aplicado da seguinte forma:
A Procid Participações, a holding de Edemar, recebeu US$
124.775.225,80 da Alsace Lorraine
para aumentar o seu capital e repassou o valor integralmente para
o Banco Santos empregá-lo em
aumento de capital;
A Finsec ficou com US$
98,909 milhões, empregados na
compra de créditos que o Banco
Santos não conseguia receber.
Empresas que fazem esse tipo de
negócio são chamadas de securitizadoras de crédito. Tepedino diz
que não há ilegalidade no fato de
ele controlar o banco que tem os
créditos podres e a empresa que
os comprou. O Banco Central, no
entanto, classificou de "resultados não usuais" o lucro que Edemar teve em 2001 com as compras
de créditos podres da Finsec. O
presidente da Finsec, cujo capital
soma R$ 269,92 milhões, é o corretor de seguros Joaquim Gomes
de Almeida, que trabalhou para
Edemar, conforme a Folha revelou em 24 de janeiro deste ano;
A Alpha Negócios e Participações recebeu US$ 27,55 milhões também para aumento de
capital e distribuiu o montante a
gerentes, executivos e diretores
do Banco Santos nos últimos cinco anos. Tepedino estima que foram beneficiados cerca de cem
executivos por ano. Nos casos de
profissionais renomados, o Banco
Santos pagava luvas para tê-los
em seus quadros, além de bônus
por metas atingidas.
Tepedino diz que a grande
maioria dos recursos captados
pela Alsace Lorraine veio de investidores em busca de uma taxa
de retorno excepcional. A maioria, afirma, não é devedora do
Banco Santos. Um valor muito
pequeno decorre da prática do
Banco Santos de pedir contrapartida a empresas que buscavam
crédito, segundo ele.
Executivos que conhecem as remessas do Banco Santos para o
exterior estimam que só um terço
dos aplicadores da Alsace Lorraine deve recorrer à Justiça para
tentar recuperar o investimento
que fizeram. Dois terços deles não
têm como comprovar a origem
legal do dinheiro, ainda de acordo
com esse raciocínio. Isso ocorre
porque as aplicações predominantes na Alsace Lorraine teriam
saído do caixa dois das empresas.
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