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OPINIÃO ECONÔMICA
O bom investimento público
BENJAMIN STEINBRUCH
John maynard Keynes, morto em 1946, é uma das mais famosas personalidades britânicas,
que combateu teorias ortodoxas
econômicas dominantes nos anos
da Grande Depressão e desempenhou papel decisivo para a própria sobrevivência do capitalismo
naquele momento.
Há algumas semanas, a revista
americana "BusinessWeek" publicou um compacto perfil de Keynes,
colocando-o entre os "grandes
inovadores" do século 20. O artigo
lembra que, durante a depressão
econômica dos anos 1930, embora
houvesse milhões de desempregados nos países industrializados, a
ortodoxia econômica sustentava
que os governos não deveriam fazer nada, apenas cuidar para preservar as forças de mercado, que
por si só resolveriam a crise. Mais
do que isso, os governos deveriam
apertar os cintos e cortar ferozmente os gastos públicos.
O secretário do Tesouro dos Estados Unidos daquela época, Andrew W. Mellon, expressando o
sentimento geral das elites, disse
em 1930 que a depressão seria útil
para expurgar a corrupção do sistema, reduzir o alto custo de vida e
obrigar o povo a trabalhar mais
arduamente. Isso ajustaria os valores morais da sociedade e, finalmente, as pessoas empreendedoras seriam as vitoriosas.
Havia então uma crença quase
teológica no controle de gastos e
no equilíbrio orçamentário dos
governos. Keynes se insurgiu contra isso e mostrou que o investimento público poderia instigar o
investimento privado para tirar a
economia da depressão, criar empregos, aumentar o consumo e restaurar a confiança nos negócios.
Sua receita foi amplamente aplicada pelos países capitalistas no
pós-guerra, quando o pleno emprego passou a ser objetivo explícito e a economia viveu uma época
de grande prosperidade.
Entender Keynes não é privilégio de economistas, embora ele
fosse um matemático. As idéias
são simples na sua essência e muito úteis para ajudar a explicar por
que a economia brasileira vive
longos anos de letargia. O setor
público perdeu grande parte de
sua capacidade de investir. Nos
anos 70, investia até 10% do PIB
por ano e agora investe menos de
5%. Essa redução não teve como
contrapartida o aumento do investimento privado. Assim, o investimento total hoje não passa de
18% do PIB, nível insuficiente para recolocar a economia em crescimento contínuo.
A falta de investimentos públicos, por causa das restrições orçamentárias, representa um empecilho à retomada do crescimento da
economia e do emprego. A crença
quase cega no equilíbrio orçamentário, que Keynes combateu, manifesta-se agora novamente com
grande vigor, a ponto de o governo
produzir superávits de mais de 4%
do PIB. Na semana passada,
anunciou-se que o aperto fiscal
continuará até 2007, com superávits anuais seguidos de 4,25% do
PIB.
Ninguém é a favor da irresponsabilidade fiscal. Equilíbrios orçamentários e até pequenos superávits são saudáveis para reduzir os
níveis de endividamento público.
Mas a experiência mostra que o
início da recuperação de qualquer
economia depende do empurrão
do "bom investimento público",
que é o indutor do investimento
privado. Um parêntese: "bom investimento público" é aquele feito
a preços do setor privado. É uma
triste tradição no Brasil o fato de
os investimentos públicos custarem o dobro ou até o triplo dos privados, o que os torna estimuladores de ineficiências e desonestidades.
Na área da infra-estrutura, o
país precisa de pelo menos R$ 60
bilhões em bons investimentos
anuais para resolver as carências
mais urgentes em estradas, ferrovias, portos, energia e outros setores. O governo espera que as parcerias público-privadas possam ajudar a aliviar o encargo que os orçamentos públicos não suportam.
Mas muita coisa nessa área, principalmente em regiões mais distantes dos grandes centros, só pode
ser feita pela mão do governo.
O sadismo econômico pré-keynesiano, que pregava a necessidade de fazer a economia sofrer para
purgar os pecados de governos
gastadores, não leva a crescimento
nenhum. Só produz estagnação,
desemprego e desânimo entre os
empreendedores do setor privado.
Benjamin Steinbruch, 50, empresário,
é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional e presidente do conselho de administração da empresa.
E-mail - bvictoria@psi.com.br
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