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ECONOMIA GLOBAL
Fundo prevê que país crescerá só 3,5% em 2006, menos que o mundo (4,9%) e a América Latina (4,3%)
FMI alerta Brasil sobre gasto em ano eleitoral
FERNANDO CANZIAN
ENVIADO ESPECIAL A WASHINGTON
O FMI (Fundo Monetário Internacional) exortou ontem o Brasil
a "resistir às pressões para afrouxar a atual disciplina fiscal" e a
manter como prioridade os superávits primários elevados para pagar os juros de sua dívida.
A cobrança veio em um momento de desconfiança interna
sobre a capacidade e a real vontade do governo Lula de segurar
despesas neste ano eleitoral, apesar de repetidas promessas de que
o rigor fiscal será mantido.
"Para continuar os progressos
na redução do endividamento, será importante resistir às pressões
para um afrouxamento da atual
disciplina fiscal e manter os superávits primários", diz o FMI no relatório "Perspectivas para a Economia Mundial", divulgado ontem, em Washington.
Uma série de indicadores revelam tanto um inchaço no setor
público federal no Brasil quanto
um crescente aumento nas despesas obrigatórias, como as relacionados à Previdência, e nos gastos
voltados à área social.
Para o FMI, o Brasil permanece
na "zona de risco" que agrupa
países com um nível de endividamento público superior a 50% do
PIB (Produto Interno Bruto).
O superávit primário (economia para pagar juros da dívida)
vem caindo no Brasil. No segundo
semestre do ano passado, o nível
acumulado em 12 meses ficou acima de 5% do PIB. Hoje, a trajetória é de queda, aproximando-se
dos 4,25% da meta estipulada pelo governo.
Deterioração global
Em seu relatório, o FMI afirma
que o Brasil e demais países da
América Latina podem sofrer
com uma queda na demanda
mundial por commodities e que
"uma deterioração no ambiente
financeiro global representa um
risco elevado dado o atual nível de
endividamento".
O Fundo também recomendou
novas reformas para tornar o
"ambiente de negócios" mais favorável a investimentos no país.
"A questão central agora é realizar reformas para tornar o Brasil
mais competitivo. Isso inclui o setor financeiro, para reduzir os
enormes "spreads" nas taxas de juro, e baixar os custos para a abertura de negócios", disse o economista-chefe do Fundo, o indiano
Raghuram Rajan.
Rajan citou o setor agropecuário brasileiro como "exemplo" de
sucesso. "Estender [essa experiência] para outras áreas seria
muito importante", disse.
Previsões de crescimento
Diante dos entraves com o endividamento e a burocracia, o FMI
previu mais uma vez um crescimento para o Brasil em 2006 e
2007 abaixo da média mundial. O
país deve crescer 3,5% nos dois
anos, enquanto o mundo deve alcançar 4,9% e 4,7%, respectivamente. Em 2006, o Brasil também
deve ficar bem aquém da média
da América Latina, de 4,3%. O governo brasileiro é mais otimista e
espera um aumento do PIB ao redor de 4,5% neste ano. O mercado
trabalha com números mais próximos aos do Fundo.
Quase todas as economias tiveram as taxas de crescimento revistas para cima no atual relatório
em relação ao de setembro passado. Uma das poucas exceções é o
Brasil, que ficou nos 3,5%.
O mundo como um todo teve o
crescimento revisado em 0,6 ponto percentual, para os 4,9% previstos neste ano. Será o quarto
ano consecutivo em que a economia global superará os 4% ao ano
-algo inédito em 35 anos.
A principal boa notícia nas estatísticas do Fundo é que, desta vez,
o crescimento mundial está bem
espalhado e não dependente apenas do desempenho da economia
norte-americana ou chinesa. Japão (2,8% em 2006) e a própria
América Latina (4,3%) darão
maior sustentação ao desempenho global.
Entre os riscos apontados pelo
Fundo, constam o elevado preço
do petróleo (haveria uma probabilidade de 15% de o óleo superar
os US$ 80 o barril), a carência de
reformas trabalhistas na Europa e
os desequilíbrios na economia
dos EUA -a maior do planeta.
"Infelizmente, muito pouco tem
sido feito em muitos lugares. Em
vez de enfrentar os problemas de
frente, políticos em muitos países
atacam alvos mais fáceis, como
imigrantes que trabalham duramente por muito pouco dinheiro", disse Rajan.
"Hoje, até seria justo dizer para
a economia global: "Nunca você
esteve tão bem". Mas ocorre que
os problemas estão se amontoando nos bastidores", afirmou o
economista.
Entre todos os riscos, o FMI
aponta o déficit em conta corrente dos EUA como o principal.
"Enquanto esse déficit tem sido financiado facilmente [em particular pela China], os otimistas têm
ganho terreno sobre os pessimistas. O problema é que os otimistas
têm de estar certos todos os dias, e
os pessimistas, uma única vez",
disse Rajan.
Para o FMI, o déficit recorde em
conta corrente dos EUA, de 6,4%
do PIB, mantém o país "vulnerável às percepções dos investidores, que podem colocar pressão
[de desvalorização] sobre o dólar
e levar a um salto repentino nos
juros de longo prazo".
Nesse cenário, os maiores perdedores seriam os países emergentes e, acima de tudo, os mais
endividados, como o Brasil.
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