São Paulo, quarta-feira, 20 de maio de 2009 |
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PAULO RABELLO DE CASTRO A bolha chinesa: enredo para um suspense
O SUSPENSE , para existir, deve nos conduzir a algo que se revelará inesperado. Estamos neste ponto do filme da bolha de Wall Street: a trama está toda armada, com o sistema financeiro americano quebrado, a maior fabricante de automóveis a minutos de pedir proteção falimentar, os dados de consumo e investimento no chão e a marolinha que virou crise global. Mas, nas sequências recentes do filme, o diretor nos leva a pensar que "o pior já passou". E aparece a eufórica China para nos resgatar da matança de 2009. A economia brasileira seria beneficiária direta da versão sobre o iminente fim da crise mundial. Se o pior já estiver passando, as taxas de crescimento do mercado brasileiro voltarão a patamares atraentes, que o ministro Mantega estima por volta dos 4% em 2010. Nesse cenário otimista, os preços das ações estariam baixos ante o lucro projetável, de 2010 em diante. Há outros indícios, como numa instigante história de suspense, que apontam pistas de uma recuperação à vista: começam a retornar, em grandes volumes, os dólares de fora, que nos abandonaram em polvorosa ao final do ano passado. Vêm atrás dos ganhos especulativos de Bolsa e apostam, sobretudo, numa nova onda de valorização do real. Meu colega colunista de ontem, Benjamin Steinbruch, apelida-os, com fino humor, de "mercados de fé". A moeda brasileira se tornou novamente a campeã de valorização relativa perante o cambaleante dólar americano. O real retorna cheio de moral, embalado pelos altos preços das commodities agrícolas, com destaque para a soja, que se comercializa em nível muito superior ao seu patamar histórico, como se o mundo vivesse uma escassez alimentar, e não uma aguda crise de renda. Parecemos esquecidos de uma regra fundamental: recuperação para valer depende de preços de insumos baratos diante dos bens industriais, nunca o inverso. Para onde, afinal, esse filme da bolha nos está levando? Aposto que seja para os lados da China. Os novos donos do mundo têm muito a ver com o resto dessa trama. Desde o final de 2008, a China jorrou o equivalente a 15% do seu PIB em empréstimos adicionais ao já enorme estoque de financiamentos. É só comparar as proporções. O que a China, no primeiro quadrimestre deste ano, apenas acrescentou à sua massa de crédito é igual a tudo o que, em proporção do PIB, o Brasil tem alocado para o financiamento da indústria nacional. Tal disparidade nos revela o quanto, no Brasil, ainda operamos com rodas travadas diante da crise, enquanto a China responde com ímpeto monetário. Talvez a virtude esteja no meio. Hoje a China corre até o risco de capotar, e, se isso acontecer, a reviravolta no filme da bolha assumirá contornos dramáticos. Lula foi à China para tentar atrair dinheiro, ao que se sabe, para os setores de energia, inclusive pré-sal, e para o agronegócio. É uma pauta convencional, pois esses são dois segmentos que menos necessitariam de suporte de capital externo. Até aqui caminharam com as próprias pernas. O agronegócio precisa, sim, ser destravado nos campos do crédito, logística e ambiente. Isso não é pauta em que a China possa avançar antes de a política agrícola se modernizar. Em compensação, brincamos de ser país de moeda forte e indústria fraca, tudo ao contrário da China, que prega sua moeda ao dólar e faz dumping industrial. Com o real anabolizado e a economia doméstica nanica, o Brasil será presa fácil de uma recessão agravada, caso a bolha chinesa acabar estourando em algum momento do filme. PAULO RABELLO DE CASTRO , 59, doutor em economia pela Universidade de Chicago (Estados Unidos), é vice-presidente do Instituto Atlântico e chairman da SR Rating, classificadora de riscos. Preside também a RC Consultores, consultoria econômica, e o Conselho de Planejamento Estratégico da Fecomercio SP. Escreve às quartas-feiras, a cada 15 dias, nesta coluna. Texto Anterior: Executivos descartam demissões e fechamento de fábricas no país Próximo Texto: Governo socorre empresas que apostaram com câmbio Índice |
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