São Paulo, quarta-feira, 20 de junho de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

EUA chegam mais perto de demanda brasileira

País sinaliza corte maior que proposto em subsídio

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A POTSDAM

Para quem se queixava de que até agora os números nas negociações comerciais globais não iam além de "poltergeists", fantasmas que circulavam pelo ambiente, mas jamais se materializavam à mesa, o ministro Celso Amorim saiu ontem de sete horas de discussões com seus pares do G4 um pouco mais animado:
"Os Estados Unidos não chegaram ainda aonde a gente quer, mas o "poltergeist" começa a aparecer mais favorável", brincou, à porta do Cecilienhof, castelo que abriga a reunião de Brasil, Índia, Estados Unidos e União Européia, o G4.
São os principais atores da Rodada Doha, que praticamente parou desde que lançada, em 2001, na capital do Qatar.
Amorim estava falando especificamente dos subsídios americanos a seus produtores agrícolas, tema principal de ontem.
Washington ofereceu inicialmente cortá-los para US$ 22 bilhões, número inaceitável para seus parceiros.
Amorim relata que, na reunião de ontem, tentou mostrar que "tem toda a legitimidade" a contraproposta do G20, que é a de reduzir os subsídios internos para algo entre US$ 12 bilhões e US$ 15 bilhões.
A portas fechadas, Susan Schwab, a negociadora-chefe norte-americana, disse ser "politicamente inviável" aceitar um corte para US$ 15 bilhões. Demonstrou que, se esse teto já estivesse em vigor, os Estados Unidos o teriam violado em sete dos últimos nove anos.
Mesmo um limite de US$ 17 bilhões seria inaceitável, porque, nessa hipótese, Washington o teria ultrapassado em cinco dos últimos nove anos.
Mas o chanceler brasileiro diz que a média histórica dos subsídios concedidos pelos Estados Unidos demonstra que é perfeitamente factível a redução pretendida pelo G20.
É uma alusão ao fato de que, no ano passado, Washington concedeu US$ 11 bilhões em subsídios internos, a metade, portanto, do que quer fixar como teto. Os norte-americanos sempre alegam que precisam ter um colchão de segurança para poder aumentar o cheque aos produtores rurais em anos ruins para os preços agrícolas.
Ocorre que a perspectiva de anos ruins parece remota, conforme análise de Carin Smaller, do Instituto para Agricultura e Política Comercial dos EUA: "Os preços das commodities estão altos e podem permanecer altos por um bom tempo por causa da crescente demanda por biocombustíveis. Esse fato torna mais fácil aos EUA mover-se na direção desejado pelos outros membros do G4".
A interpretação dos negociadores é a de que, ao tomar a iniciativa de mencionar limites de US$ 15 bilhões e US$ 17 bilhões, mesmo para rejeitá-los, Schwab emite um sinal positivo, uma vez que, até agora, não se movia dos US$ 22 bilhões.
A própria Schwab, em brevíssima fala aos jornalistas, manifestou a disposição de "fazer todo o possível para o sucesso das negociações", o que pode ser apenas uma platitude convencional em momentos assim ou pode, de fato, traduzir a intenção de se aproximar do número demandado pelos parceiros.
Ainda mais que ela diz que se trata de "uma semana crítica" nas negociações, o que é óbvio: se a reunião do G4 em Potsdam não produzir um acordo, a Rodada Doha dificilmente será concluída.
Mesmo que haja acordo, ainda será preciso vendê-lo aos demais 146 países da Organização Mundial do Comércio, tarefa complicada. Aliás, o dia de ontem no Cecilienhof foi demonstração visual dessa dificuldade: o ministro japonês de Agricultura até viajou para a Alemanha, para pedir vaga no clube. O Japão é ainda mais protecionista, em matéria agrícola, do que EUA e União Européia.
Hoje, o G4 faz nova sessão, que, como a de ontem, promete só terminar quando as primeiras sombras da tardia noite do quase-verão europeu começam a cair sobre o castelo que foi da dinastia Hohenzollern, que mandou séculos na Prússia e na Alemanha.


Texto Anterior: Vaivém das commodities
Próximo Texto: YouTube lança a versão brasileira do site de vídeos
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.