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EUA chegam mais perto de demanda brasileira
País sinaliza corte maior que proposto em subsídio
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A POTSDAM
Para quem se queixava de
que até agora os números nas
negociações comerciais globais
não iam além de "poltergeists",
fantasmas que circulavam pelo
ambiente, mas jamais se materializavam à mesa, o ministro
Celso Amorim saiu ontem de
sete horas de discussões com
seus pares do G4 um pouco
mais animado:
"Os Estados Unidos não chegaram ainda aonde a gente
quer, mas o "poltergeist" começa a aparecer mais favorável",
brincou, à porta do Cecilienhof,
castelo que abriga a reunião de
Brasil, Índia, Estados Unidos e
União Européia, o G4.
São os principais atores da
Rodada Doha, que praticamente parou desde que lançada, em
2001, na capital do Qatar.
Amorim estava falando especificamente dos subsídios americanos a seus produtores agrícolas, tema principal de ontem.
Washington ofereceu inicialmente cortá-los para US$ 22
bilhões, número inaceitável para seus parceiros.
Amorim relata que, na reunião de ontem, tentou mostrar
que "tem toda a legitimidade" a
contraproposta do G20, que é a
de reduzir os subsídios internos para algo entre US$ 12 bilhões e US$ 15 bilhões.
A portas fechadas, Susan
Schwab, a negociadora-chefe
norte-americana, disse ser "politicamente inviável" aceitar
um corte para US$ 15 bilhões.
Demonstrou que, se esse teto já
estivesse em vigor, os Estados
Unidos o teriam violado em sete dos últimos nove anos.
Mesmo um limite de US$ 17
bilhões seria inaceitável, porque, nessa hipótese, Washington o teria ultrapassado em cinco dos últimos nove anos.
Mas o chanceler brasileiro
diz que a média histórica dos
subsídios concedidos pelos Estados Unidos demonstra que é
perfeitamente factível a redução pretendida pelo G20.
É uma alusão ao fato de que,
no ano passado, Washington
concedeu US$ 11 bilhões em
subsídios internos, a metade,
portanto, do que quer fixar como teto. Os norte-americanos
sempre alegam que precisam
ter um colchão de segurança
para poder aumentar o cheque
aos produtores rurais em anos
ruins para os preços agrícolas.
Ocorre que a perspectiva de
anos ruins parece remota, conforme análise de Carin Smaller,
do Instituto para Agricultura e
Política Comercial dos EUA:
"Os preços das commodities
estão altos e podem permanecer altos por um bom tempo
por causa da crescente demanda por biocombustíveis. Esse
fato torna mais fácil aos EUA
mover-se na direção desejado
pelos outros membros do G4".
A interpretação dos negociadores é a de que, ao tomar a iniciativa de mencionar limites de
US$ 15 bilhões e US$ 17 bilhões,
mesmo para rejeitá-los,
Schwab emite um sinal positivo, uma vez que, até agora, não
se movia dos US$ 22 bilhões.
A própria Schwab, em brevíssima fala aos jornalistas, manifestou a disposição de "fazer todo o possível para o sucesso das
negociações", o que pode ser
apenas uma platitude convencional em momentos assim ou
pode, de fato, traduzir a intenção de se aproximar do número
demandado pelos parceiros.
Ainda mais que ela diz que se
trata de "uma semana crítica"
nas negociações, o que é óbvio:
se a reunião do G4 em Potsdam
não produzir um acordo, a Rodada Doha dificilmente será
concluída.
Mesmo que haja acordo, ainda será preciso vendê-lo aos demais 146 países da Organização
Mundial do Comércio, tarefa
complicada. Aliás, o dia de ontem no Cecilienhof foi demonstração visual dessa dificuldade:
o ministro japonês de Agricultura até viajou para a Alemanha, para pedir vaga no clube. O
Japão é ainda mais protecionista, em matéria agrícola, do que
EUA e União Européia.
Hoje, o G4 faz nova sessão,
que, como a de ontem, promete
só terminar quando as primeiras sombras da tardia noite do
quase-verão europeu começam
a cair sobre o castelo que foi da
dinastia Hohenzollern, que
mandou séculos na Prússia e na
Alemanha.
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