São Paulo, terça-feira, 20 de julho de 2004

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XADREZ COMERCIAL

Negociadores aceitam, de forma condicional, esboço para liberalização do comércio no âmbito da OMC

Brasil e UE aprovam texto para Rodada Doha

DO ENVIADO ESPECIAL A BRUXELAS

Brasil e União Européia, dois dos cinco principais atores das negociações comerciais globais, deram ontem aprovação, ainda que condicional, ao texto apresentado na semana passada pela OMC (Organização Mundial do Comércio) para definir a "moldura" do que será, se tudo der certo, o quadro resultante da Rodada Doha, a mais recente ronda de liberalização comercial, lançada em 2001 e estancada desde então.
"Tudo somado, é um esboço com o qual podemos e iremos trabalhar em Genebra nos próximos dias", disse ontem Arancha González, a porta-voz para Comércio do conglomerado europeu.
Na mesma linha, afirma o chanceler brasileiro Celso Amorim: "Dá para trabalhar e buscar o entendimento, embora o tempo seja curto". Bem curto, aliás: a OMC se autofixou um prazo até o dia 31 deste mês para estabelecer uma moldura para as negociações, que já está imensamente atrasada. O prazo original dado em 2001 para fechar as modalidades da negociação na área agrícola, por exemplo (agora rebatizadas para "moldura") era fevereiro de 2003.
Esse atraso e a impossibilidade de superá-lo provocaram o colapso da Conferência Ministerial de Cancún, em 2003, e puseram em sério risco a hipótese de cumprir o cronograma de Doha, que prevê fechar a Rodada no início de 2005.
O que anima a diplomacia brasileira é o fato de que há uma imensa diferença entre o texto que chegou a Cancún, "inemendável", no neologismo ouvido pela Folha no Itamaraty, e o novo documento, "trabalhável".
Tanto a aprovação européia como a brasileira ao esboço está condicionada a "precisões e esclarecimentos", como diz Arancha González. Em alguns pontos, os esclarecimentos cobrem áreas de interesse do Brasil. Exemplo: a UE quer que fique claro que o corte nas ajudas às exportações agrícolas, proposto no texto, embora ainda sem data, valha também para os mecanismos americanos de créditos à exportação, na verdade subsídios disfarçados.
"É importante que fique claro esse aspecto agora, porque a Lei Agrícola [dos EUA] vence em 2006, e não pode se repetir o que aconteceu na rodada anterior, em que os subsídios foram aumentados", diz González.
O Brasil coincide inteiramente com essa posição, porque uma de suas grandes prioridades na negociação agrícola é justamente eliminar todas as formas de ajuda às exportações agrícolas. Mas há uma preocupação européia que contraria o Brasil: a UE quer que fique claro que, no corte de tarifas de importação de produtos agrícolas, serão "adequadamente protegidos os itens sensíveis".

Temor
O Brasil teme que o rótulo "sensível" acabe encobrindo um vasto leque de produtos nos quais o país é competitivo, mas não consegue vender no mercado europeu por causa do protecionismo.
O apoio europeu e brasileiro ao esboço está longe, no entanto, de garantir que ele possa ser aprovado nas duas semanas que faltam até o prazo de 31 de julho, mesmo depois de corrigido, como é natural em qualquer esboço.
A Índia, um dos grandes da OMC, disse ontem que o texto carece "do necessário equilíbrio, justiça ou equidade entre as recomendações para países desenvolvidos e em desenvolvimento".
A restrição é feita também pelo Brasil, membro como a Índia do G20, grupo de países em desenvolvimento que luta pela liberalização agrícola dos ricos. De todo modo, em videoconferência ontem de que participaram os cinco grandes da negociação (UE, EUA, Brasil, Índia e Austrália), constatou-se que todos mantêm "a disposição de chegar a um acordo até o fim do mês", diz Arancha González. Se será ou não possível é o que começou a se discutir ontem em Genebra. (CLÓVIS ROSSI)


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