São Paulo, quarta-feira, 20 de outubro de 2004

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ORTODOXIA

Em estudo encomendado pelo governo, ex-diretor do FMI sugere flexibilização de leis trabalhistas e redução do Estado

Camdessus defende reformas na França

DO "FINANCIAL TIMES"

Quando era diretor-gerente do FMI (Fundo Monetário Internacional), o francês Michel Camdessus costumava viajar pelo mundo receitando soluções duras para as dificuldades econômicas de vários países. Ontem, ao falar apenas em seu nome, receitou pílulas amargas aos seus compatriotas.
Camdessus foi convidado por Nicolas Sarkozy, ministro das Finanças francês, a analisar as razões para a desaceleração na economia do país, ao longo das últimas décadas, e para recomendar maneiras pelas quais o crescimento possa ser revigorado.
Ontem, ele e sua equipe de 20 assessores publicaram uma resposta. O relatório que ele apresentou é a um só tempo alarmante e motivo de esperança, e as reformas prescritas são tanto urgentes quanto viáveis.
O problema, para Camdessus, está em um paradoxo. Por um lado, a França é um país rico, admirado em todo o mundo por sua qualidade de vida, serviços públicos e infra-estrutura. Por outro lado, "nós vivemos obcecados com a perspectiva de declínio, com o sentimento de que o futuro está nos escapando e será uma era menos gratificante que o passado".
Os franceses têm motivos para se sentir assim, de acordo com o relatório, porque a competitividade de seu país está de fato em declínio. A França não vem conseguindo responder adequadamente aos três grandes desafios da era contemporânea: a difusão de novas tecnologias, o envelhecimento da população e a globalização.
No entanto, a gravidade das ameaças vem sendo contrabalançada por taxas de juros historicamente baixas, pelo desempenho comparativamente fraco dos parceiros franceses na União Européia e pela introdução do euro, que protegeu o país da disciplina corretiva dos mercados.
Se nada for feito, o ritmo anual provável de crescimento econômico francês cairá dos 2,25% atuais a 1,75% em 2015, simplesmente por causa do envelhecimento da população. E a França chegará lá tendo acumulado uma montanha de dívidas.

Áreas essenciais
A recomendação de Camdessus é de que o governo se concentre em três áreas essenciais de crescimento: o emprego, o investimento e o progresso tecnológico.
Segundo suas propostas, o rígido mercado de trabalho precisa ser liberalizado a fim de reduzir o nível elevado de desemprego; as dimensões do Estado e da dívida pública precisam ser reduzidas, a fim de criar espaço para o investimento privado; universidades, pesquisadores do setor privado e empresas precisam interagir melhor a fim de criar uma "economia do conhecimento".
As reformas bem-sucedidas de Suécia, Finlândia, Dinamarca e Reino Unido demonstram que é possível mudar o rumo de uma economia, diz Camdessus.
As receitas de Camdessus podem bem abarcar o que existe de mais moderno nas teorias econômicas, mas será que é viável aplicá-las à França? Um líder do Partido Comunista denunciou o relatório por ameaçar explodir os direitos dos trabalhadores.
Ao elogiar as conclusões do relatório, Sarkozy argumentou que um crescimento mais rápido poderia reduzir as dificuldades sociais. "A reforma é politicamente possível quando ela é justa."
Mas há grandes dúvidas sobre a aceitação das propostas pelos franceses ou se Sarkozy, rival político do presidente Jacques Chirac, terá apoio na missão de encontrar soluções dentro do receituário proposto pelo estudo elaborado por Camdessus.


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