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OPINIÃO ECONÔMICA
Nota três para o piloto Garcez
GESNER OLIVEIRA
O governo Lula não foi bem
em seu primeiro ano. A nota
seis atribuída pelo ministro do
Desenvolvimento, Luiz Fernando
Furlan, ao desempenho da administração foi generosa e devia ser
reduzida pela metade. O provável
crescimento nulo do PIB em 2003
deverá representar o pior desempenho desde 1992 durante o governo Collor, no qual o PIB caiu
0,5%.
Em 1998 o PIB cresceu apenas
0,13%, porém em meio a uma crise internacional provocada pelo
calote da Rússia. Em contraste, e
felizmente, em 2003 a economia
dos EUA registrou clara recuperação, junto com a Ásia e a União
Européia, e a Argentina acusou
crescimento de 7%.
Apesar dos tropeços internos, a
economia está se recuperando
mais rápido do que os pessimistas
imaginam e o Natal de 2003 será
aproximadamente 4% melhor do
que o do ano passado. Mais importante ainda, as perspectivas
para 2004 são boas, permitindo
uma projeção de crescimento de
4%, ligeiramente inferior à expansão observada em 2000.
A afirmação do presidente Lula
de que seu governo teria salvo o
país de "uma das mais graves crises da história republicana" lembra o piloto Garcez, que em 1989
partiu para Belém do Pará, ficou
distraído ouvindo o jogo Brasil e
Chile (aquele em que o valoroso
Rojas fez um papelão) e se perdeu
na Amazônia, permanecendo três
horas em vôo cego. Depois desse
espetáculo de imperícia, aterrissou milagrosamente à noite sem
visibilidade, no meio da floresta e,
de fato, salvou vidas de passageiros que ele mesmo colocou em risco.
Assim foi o governo Lula. Fez
uma campanha baseada na promessa eleitoreira de ruptura, seduziu o eleitorado e aterrorizou o
mercado, elevando o prêmio de
risco e as expectativas de inflação
a níveis estratosféricos. Terminada a campanha, comprou credibilidade no mesmo mercado à
custa de uma política monetária
mais conservadora do que a do
governo FHC, impondo elevado
custo em termos de emprego e
produção.
Mas o problema maior reside
na ausência de estratégia de médio e longo prazos. Está certo o
presidente ao afirmar que "o desafio do Brasil é voltar a crescer".
Mas como fazê-lo sem assegurar
condições estáveis de rentabilidade para o setor exportador? Por
mais que o presidente aumente
sua milhagem em viagens internacionais (necessárias, diga-se de
passagem), as exportações brasileiras só crescerão em bases permanentes se houver investimentos no setor exportador. E esses,
por sua vez, só ocorrerão se houver um sinal claro de que serão
rentáveis a médio prazo.
Da mesma forma, o crescimento exige o aumento de capacidade
em infra-estrutura em segmentos
tão cruciais como o setor elétrico.
Nesse terreno, o máximo que o
governo conseguiu foi uma polêmica medida provisória que aumentou o risco regulatório e consequentemente diminuiu a rentabilidade esperada do investimento.
A falta de script para governar
coloca em risco até mesmo segmentos que vêm registrando desempenho notável, sistematicamente superior à média da economia, como o agronegócio. As
idas e vindas em relação à política de transgênicos, sobre a qual o
discurso do presidente silenciou, e
as ambiguidades em relação à
violência e ao desrespeito aos direitos de propriedade no campo
podem inibir as inversões em um
segmento em que o Brasil tem vocação para liderar. De acordo
com os dados divulgados no site
do MST (www.mst.org.br), o número de ocupações cresceu 86,3%,
e o de acampamentos, 209%.
A política social padeceu, por
sua vez, de três problemas graves.
Em primeiro lugar, o erro conceitual de privilegiar o assistencialismo e a esmola em vez da criação
de oportunidades de emprego e a
formação de capital humano. Em
segundo, a falta de racionalização de gastos permitiu uma redução em termos reais das despesas
sociais. Em terceiro, o caos gerencial impediu a utilização eficiente
dos escassos recursos disponíveis.
Para completar, na área educacional prevaleceu o corporativismo e, depois de muitas indefinições, o governo promoveu um retrocesso ao diminuir a transparência da avaliação das instituições de ensino por meio do provão.
Assim, o governo foi reprovado
ou na melhor das hipóteses ficou
de recuperação. Mas o Brasil, por
todas as suas virtudes e potencialidades, vai bem obrigado. Mas
não pode prescindir de um plano
de vôo!
Gesner Oliveira, 47, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia
(Berkeley), professor da FGV-EAESP, sócio-diretor da Tendências e ex-presidente do Cade.
Internet: www.gesneroliveira.com.br
E-mail - gesner@fgvsp.br
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