São Paulo, domingo, 21 de março de 2004

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RETOMADA?

Expectativa de investimento na indústria cai após Selic diminuir 0,25 ponto percentual no 1º trimestre do ano

Juros derrubam o ânimo de empresários

LEONARDO SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A manutenção dos juros altos no primeiro bimestre de 2004 derrubou as expectativas de investimentos de grande parte do empresariado brasileiro. A decisão do Banco Central de reduzir a taxa em 0,25 ponto percentual neste mês não foi suficiente para reverter o ânimo das empresas.
A constatação é de representantes das federações das indústrias de São Paulo e do Rio (Fiesp e Firjan). Economistas ouvidos pela Folha têm a mesma avaliação.
Não há informações disponíveis para quantificar os investimentos retidos. Mas dados do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e do BC (Banco Central) corroboram as suspeitas.
O número de consultas de empréstimos ao BNDES caiu 7% no primeiro bimestre comparado ao mesmo período de 2003. Os empréstimos concedidos pelo sistema financeiro à indústria também diminuíram. O valor passou de R$ 116,6 bilhões em dezembro passado para R$ 114,8 bilhões em janeiro, de acordo com o BC.
"Verificamos uma cautela hoje [dos empresários para investir] muito maior do que no começo de janeiro", disse Cláudio Vaz, diretor do departamento de estudos econômicos da Fiesp.
"Poucas vezes vi uma mudança de expectativas como essa num espaço de tempo tão curto", afirmou Júlio Gomes de Almeida, diretor-executivo do Iedi (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial).
Vaz ressaltou que os industriais não deram o ano por perdido. Mas disse que a maioria esperava que o nível da atividade econômica estivesse muito melhor. "Tenho ouvido muita gente dizer que está aguardando o reaquecimento da economia para realizar os investimentos."
A Firjan ouviu 242 empresários no final do ano passado, e 67% responderam que, dos custos correntes associados à produção, o mais relevante para a definição de um investimento é o financeiro.
Na opinião de Luciana de Sá, chefe da assessoria de Pesquisas Econômicas da Firjan, os juros altos prejudicam os investimentos de três formas. Em primeiro lugar, afetam a demanda. Ou seja, quanto mais elevada a taxa, mais caro ficam para o consumidor as compras a prazo. Segundo, o custo dos financiamentos destinados ao investimento é maior.
Por último, mas não menos importante, ela cita o chamado "custo de oportunidade" do dinheiro. Em muitos casos, os juros altos tornam as taxas de retorno de aplicações conservadoras mais atraentes do que o investimento no setor produtivo.
"A ortodoxia do BC comprova que ele está comprometido apenas com a meta de inflação, sem se preocupar com o crescimento. Isso é captado pelo empresário, que decide adiar os investimentos quando constata que o ritmo da atividade econômica está fraco", disse o economista-chefe da Sobeet, Fernando Ribeiro.
O professor da FGV-RJ Aloísio Campelo Júnior lembra que a manutenção dos juros afetou principalmente os setores mais voltados para o mercado interno. Muitos dos dados positivos da indústria divulgados nas últimas semanas, como aumento da oferta de emprego e crescimento da produção, se devem fundamentalmente aos segmentos exportadores.
Segundo Vaz, os investimentos relacionados a lançamentos de produtos e formação de estoques têm sido os mais prejudicados. Já os investimentos em capital fixo, como ampliação de plantas de fábricas e compra de equipamentos, costumam ser menos afetados por quebras de expectativa.
Campelo diz também que o nível de ociosidade da capacidade instalada da indústria ainda está muito alto. As empresas ainda têm espaço para aumentar a produção antes de precisar elevar a capacidade instalada.
Segundo dados da FGV, os setores de bens de consumo e de bens de capital tiveram queda na utilização da capacidade instalada de outubro passado para janeiro de 77,1% para 74% e de 77,5% para 76,4%, respectivamente.


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