São Paulo, sábado, 21 de março de 2009

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Queda dos juros traz dilemas ao governo

Membros da equipe econômica veem taxa anual de 9% como piso para não aumentar "armadilhas" dos juros baixos

Redução da Selic põe pressão sobre setores indexados como poupança, metas de fundos de pensão e crédito habitacional


SHEILA D'AMORIM
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Membros da equipe econômica acreditam que a taxa básica de juros (Selic) a 9% ao ano é o limite que o governo terá para enfrentar as "armadilhas" que os juros baixos trarão à economia brasileira.
Hoje, a taxa que serve de referência para economia está em 11,25% anuais. Essa margem aparente de 2,25 pontos percentuais, no entanto, divide a equipe econômica sobre o momento certo para adotar medidas consideradas impopulares, como mexer na rentabilidade da caderneta de poupança.
Nos últimos dias, retomou-se a discussão sobre o que fazer com os resquícios da indexação e do direcionamento obrigatório que marcaram a história econômica do país das últimas décadas (que envolve, além da correção da poupança, as metas atuariais dos fundos de pensão e o crédito direcionado ao setor imobiliário). O debate foi marcado pela elaboração de cenários sobre a trajetória dos juros e avaliações sobre as condições de a economia manter a Selic em um dígito, num cenário de retomada do crescimento.
Ninguém no governo duvida de que a tendência dos juros é de queda em 2009. Mas há dúvidas se ele cairá abaixo do patamar de 9%, em que prazo e se esse nível mais baixo será mantido no longo prazo.
Nos cálculos anteriores do governo, o Brasil alcançaria uma taxa de juros desse nível somente no segundo semestre do ano que vem. A crise financeira mundial, argumentam os técnicos do governo, antecipou esse cenário e, agora, acredita-se que isso ocorrerá até antes do final deste ano.
Diante disso, surgiu o debate de que juros em um dígito levantam a necessidade de desindexar a correção da caderneta de poupança, que, hoje, na pior das hipóteses, seria de 6,17% ao ano. Por sua vez, mudanças nessas regras em vigor levam a revisões de outras normas, como a correção dos financiamentos habitacionais.
Além disso, problemas semelhantes já despontam em outras áreas, como os fundos de pensão, que têm metas rígidas de rentabilidade para garantir que os passivos sejam cobertos.
Normalmente, essas entidades buscam retornos que levam em conta um índice de preços mais 6% ao ano, o que poderia ficar difícil de atingir com a queda prevista dos juros. É preciso encaixar todos em perfeita sintonia.
"As metas atuariais dos fundos se tornarão inexequíveis com a queda de juros. Este problema e o da poupança são questões estruturais que precisam ser atacadas", afirma o ex-diretor de Normas do Banco Central Sérgio Darcy.
O maior medo na equipe econômica hoje é que a queda dos juros crie uma distorção no mercado, com uma forte migração de recursos que estão aplicados nos fundos de investimentos e nos CDBs (papéis emitidos pelos bancos para se financiarem no mercado) para a poupança.
"Essa é uma preocupação legítima que independe de se e por quanto tempo os juros ficarão baixos", diz o economista-chefe do JPMorgan, Fábio Akira. "Mesmo sendo uma situação temporária, a queda dos juros pode criar uma crise interna no meio da crise financeira mundial que vivemos", afirma.
Por enquanto, esta é a aposta da equipe econômica: há tempo para agir. O Banco Central, no entanto, colocou o debate na rua ao pregar a revisão dessas questões de forma imediata. Nos bastidores do governo, BC e Fazenda se colocam com a certeza de que sabem o que fazer: mudar a forma de correção da poupança, mexer nos direcionamentos para o setor imobiliário, enterrar a TR (Taxa Referencial).


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