São Paulo, domingo, 21 de abril de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

EMPRESAS

Transora reúne concorrentes como Coca e Pepsi; associação tenta também barrar pressão do grande varejo por preço baixo

Múltis rivais se unem para vender juntas

LÁSZLÓ VARGA
DA REPORTAGEM LOCAL

Até parece história de ficção científica. A partir de julho, grandes conglomerados industriais que concorrem entre si, como a Unilever, Procter & Gamble, Nestlé, Parmalat, Coca-Cola e Pepsi vão trabalhar juntos no Brasil para vender seus produtos.
Esses grupos decidiram trazer ao país a Transora, empresa que já atua nos Estados Unidos e Europa desde dezembro e, oficialmente, foi criada para agilizar a distribuição de mercadorias.
Analistas ouvidos pela Folha afirmam, no entanto, que a Transora pode ser de fato uma arma dos fornecedores para diminuir as pressões do varejo pela redução de preços.
"As indústrias viraram reféns dos grandes varejistas nos últimos dez anos, devido à concentração de mercado. Hipermercados passaram a ditar os preços das mercadorias e a Transora é uma reação contra isso", afirma o economista Edmundo Berensztajn, presidente da empresa Federed, que trabalha com logística.
Ao intermediar transações com o varejo, a Transora teria condições de gerenciar melhor os preços cobrados pelos fornecedores e evitar que eles trabalhem com preços muito baixos.
O presidente do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), João Grandino Rodas, afirma que o órgão está atento a qualquer sinal de cartelização nesse sistema. "Temos que esperar pelo início da operação da Transora. Se forem identificados sinais de que prejudica a concorrência, os órgãos de vigilância vão entrar com medidas contra a companhia", disse à Folha.

"Indústria do terror"
Um diretor de uma das maiores cadeias de varejo do país lembra que a Transora foi considerada logo no seu lançamento, em 2001, como uma arma da "indústria do terror" para barrar descontos excessivos. Ele afirma, no entanto, que a tese ainda não foi comprovada, pois a empresa só começou a funcionar efetivamente em dezembro passado. Não houve tempo suficiente para uma conclusão sobre seus objetivos.
A Transora reúne 55 dos maiores conglomerados industrias do planeta e trabalha da seguinte maneira: substitui as redes eletrônicas de comercialização usadas isoladamente pelas indústrias e concentra as transações em um único portal na internet.
Seu gerente-geral no Brasil, Luiz Martins, afirma que a redução nos custos é mais sensível no transporte. Uma rede de caminhões já se encarrega nos Estados Unidos de entregar ao varejo produtos dos mais diversos tipos, como detergentes e refrigerantes, de marcas concorrentes. "Os custos das empresas com fretes caíram 28%", afirma Martins.
O serviço mais polêmico da Transora, no entanto, são seus leilões de produtos. Com eles, as indústrias tanto podem barganhar on-line os preços de insumos como negociar com o varejo a venda em massa de seus produtos.
A Transora não revela o montante de transações que já intermediou, mas a Folha apurou que seu sistema permite que um fornecedor acompanhe com detalhes os preços ofertados de seus concorrentes. O que possibilita verificar rapidamente se um acordo de limite mínimo de preços fechado pelas indústrias foi rompido ou não.
Em dezembro, por exemplo, uma indústria fez leilão para comprar máquinas de produção de alimentos e conseguiu desconto de 42% com os fornecedores.

Portais do comércio
Os grandes varejistas, no entanto, têm suas armas para impedir a restrição dos descontos da indústria. Portais de vendas eletrônicas como o WWRE (WorldWide Retailers Exchange), que conta com associados como Makro, Royal Ahold (Bompreço no Brasil), Casino e Pão de Açúcar, estão em atividade para reduzir os custos do comércio.
A WWRE já obteve economia de US$ 392 milhões para seus 59 sócios-concorrentes desde julho de 2001. No Brasil, é representada pelo Pão de Açúcar. "Vamos iniciar nossas operações de fato no país em maio. Esse negócio, no entanto, beneficia tanto o comércio como a indústria, porque diminui despesas com informática e logística", diz Silvio Laban Neto, diretor do grupo Pão de Açúcar.
Os portais do comércio podem também servir para beneficiar o varejo, contrariando os interesses da indústria. Recentemente, uma cadeia de varejo realizou um leilão de compra de um grande lote de vinho chileno. Obteve um bom desconto com as vinícolas.
A WWRE afirma que seus sócios conseguem uma redução média de 12,6% nos custos. Laban afirma, porém, que a rixa entre indústria e comércio não existe, pois os portais visam à redução de custos dos dois lados.



Texto Anterior: Imposto: Receita recebe 350 mil declarações por dia
Próximo Texto: Transora tem projeto com a rede D'Avó
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.