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São Paulo, segunda-feira, 21 de abril de 2003

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DINHEIRO CURTO

Estudo mostra que endividamento cresceu 6% em 2002, enquanto lucro operacional próprio caiu quase 10%

Dívida de empresas sobe e trava investimento

CHICO SANTOS
DA SUCURSAL DO RIO

Um levantamento feito pela consultoria Economática, a pedido da Folha, mostra que em 2002 piorou a capacidade de pagamento de dívidas das empresas brasileiras, exceto bancos, que têm ações em Bolsas de Valores.
A dívida financeira das empresas cresceu 6%, chegando a R$ 241,396 bilhões, enquanto o lucro operacional próprio caiu 9,7%, ficando em R$ 51,057 bilhões. Com isso, a relação entre o lucro e a dívida caiu de 24,8% em 2001 para 21,2%, uma situação classificada como "delicada" por Fernando Exel, presidente da Economática. Todos os números são ajustados pelo IGP-DI (Índice Geral de Preços-Disponibilidade Interna) até 31/12/2002.
O levantamento abrangeu um universo de 153 empresas que, segundo Exel, representam mais de 90% do faturamento das empresas não-financeiras de capital aberto do país. Além dos bancos, o resultado não inclui os números da Petrobras. Segundo Exel, como a estatal é muito grande e seus resultados são sujeitos a fatores externos, como decisões políticas, seus resultados podem causar distorções no conjunto.
O lucro operacional próprio foi uma categoria contábil criada pela Economática para medir o lucro operacional antes das despesas financeiras. Segundo o presidente da consultoria, o problema é que mais da metade dos 21,2% que os lucros representam em relação às dívidas (cerca de 12%) vai para pagamento de juros.
Do que sobra, a empresa tem que pagar impostos e outras despesas não-financeiras, sobrando um lucro líquido muito pequeno, insuficiente para remunerar os acionistas ou para que sejam feitos investimentos com recursos próprios. Nos Estados Unidos, de acordo com Exel, a relação entre dívidas e lucro operacional próprio é de 19%, mas os juros não passam de 5%.
Essa redução da capacidade de pagamento das empresas abertas decorreu da queda nas vendas, a primeira desde o começo do Plano Real, segundo levantamento feito pela Economática, também com números ajustados pelo IGP-DI. A queda foi de 8,84%. Só em 1993 as vendas das empresas abertas haviam tido desempenho negativo (-1,89%).
Exel disse que, como o IGP-DI de 2002 foi muito alto (26,41%), o ajuste feito por ele pode superestimar a queda nas vendas. "Mas, por qualquer índice que seja feito o ajuste, foi o pior ano desde o Plano Real", afirmou.

Investimentos
A alta do dólar está na raiz do aumento das dívidas das empresas abertas no ano passado. Mesmo tendo pago uma parcela substancial das suas dívidas em moeda estrangeira, as empresas não conseguiram reduzi-las, quando convertidas em reais. As dívidas em moeda estrangeira cresceram no ano passado 8,3%, passando de R$ 160,455 milhões para R$ 173,855 bilhões.
Endividadas e com rentabilidade baixa, as empresas estão em situação difícil para investir neste ano. "O cenário que todo mundo quer é aquele no qual as empresas têm coragem de se endividar até o pescoço", disse Exel, explicando que o elevado endividamento, associado à instabilidade cambial e à baixa rentabilidade, prejudica os investimentos.
"A análise é absolutamente correta", disse o presidente da Abrasca (Associação Brasileira das Companhias Abertas), Alfred Plöger. Segundo ele, os investimentos estão comprometidos porque as empresas estão sem acesso ao mercado externo, e o dinheiro do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) "é pouco e privilegia a área de infra-estrutura".
De acordo com Plöger, o problema é das empresas em geral, e não apenas das companhias abertas. "Não há investimento que tenha retorno com essa taxa de juros [do mercado interno]", afirmou.
Ele disse ainda que a saída de muitas empresas para continuar investindo na produção está sendo obter financiamentos de fornecedores. Segundo Plöger, os juros elevados fazem com que os investidores prefiram o mercado de renda fixa em vez de investir no mercado de capitais.
Ele defende a aprovação de projeto que libera recursos do FGTS (Fundo de Garantia dor Tempo de Serviço) para investimentos no mercado de ações.
Para o economista Lauro Vieira de Faria, da FGV (Fundação Getúlio Vargas), o alto endividamento e a descapitalização prejudicam os investimentos, mas o maior obstáculo é a falta de motivação. "As empresas estão com medo de captar no exterior, e o dinheiro interno é muito caro e racionado", disse.
A dificuldade das empresas para retomar os investimentos é uma forte preocupação de economistas que trabalham no governo.
Um deles, que preferiu não se identificar, disse que há uma pergunta afligindo a todos: "De onde virá o investimento neste ano?"
Segundo o IBGE, a taxa de investimentos da economia brasileira em 2002 -18,71% do PIB (Produto Interno Bruto)- já havia sido a menor em dez anos.


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