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OPINIÃO ECONÔMICA
As dificuldades de um novo império
MICHEL A. ALABY
Deveríamos refletir sobre a
tentativa de imposição do
novo império norte-americano e
nos preocupar com ela, mesmo
que ainda não tenhamos a clara
certeza de viabilidade de aceitação total deste, apesar de a nova
ordem mundial indicar tal assertiva.
Como ponto de partida, a gestação ocorre de modo muito peculiar, mas, se perguntarmos para
qualquer autoridade norte-americana, com certeza negará o plano de construção do império, mas
aplicará sempre o chamado "direito soberano" dos Estados Unidos da América de se defenderem
contra qualquer ameaça possível,
que possa ocorrer em seu país ou
em qualquer outro país aliado ou
não, para implementar a "democracia". Estamos diante de um
projeto de império defensivo, mas
do início ao fim, não respeitando
as regras internacionais existentes.
Recentemente, dois pensadores
americanos atestaram a idéia do
império em dois artigos publicados no jornal espanhol "El País",
comparando a presença norte-americana no cenário mundial
ao passado de existência dos impérios britânico e espanhol, baseado nos poderios econômico,
militar e tecnológico.
Pensamos realmente que, na
globalização mundial, a existência de um império entra em contradição com os aspectos essenciais da realidade econômica.
O pensador Kennedy compara
a realidade de hoje com a realidade de 200 anos passados, mas a
comparação não é adequada,
pois nem no aspecto econômico,
nem no tecnológico ou no político
podem existir hegemonias indiscutíveis.
A diferença principal dos dias
atuais e de 200 ou 400 anos passados é que o mercado é um fenômeno totalmente descentralizado
e crescentemente liberado de políticas públicas de apoio incondicional a setores ineficientes. Decerto que existem inúmeras empresas norte-americanas globalizadas, mas há também empresas
européias e asiáticas.
De acordo com a revista "Fortune", das 500 maiores empresas
mundiais, cerca de 40% são americanas, 31% são européias e 20%
são asiáticas. As empresas globalizadas possuem o mundo como
seu mercado e a Terra como seu
parque industrial. O poder econômico empresarial tem-se desvinculado dos chamados Estados-nação.
Outro argumento utilizado é "a
questão das estruturas tecnológicas". A supremacia norte-americana, como Schumpeter denominou, é um monopólio de inovação, que, por meio de um ritmo
trepidante de inovações e adaptações etnológicas, desaparecerá relativamente num período muito
breve. As novas tecnologias são de
rede e, por definição, não têm um
epicentro de localização fixo,
mas, sim, variável. Há menos de
dez anos, não se considerava possível o aparecimento de novas
concentrações produtoras de inovação. Depois do vale do Silício,
apareceram Bangalore, na Índia,
Dublin, na Irlanda, e Catânia, na
Itália.
Finalmente, quanto à supremacia política, não se pode esquecer
também que, há 400 anos, a realidade era diferente, pois o mundo
se consolidou em Estados-nação,
cada um com sua soberania e
suas regras internas que particularmente rechaçam qualquer ingerência externa em suas políticas nacionais.
A única hegemonia clara e indiscutível do poderio norte-americano é a militar, com incomensuráveis recursos aplicados que
poderiam ser utilizados no combate à pobreza mundial. A segunda potência armamentista (Alemanha) tem um terço do poder
militar norte-americano.
Sem dúvida, mais de um partidário da chamada "Realpolitik"
diria que os impérios se constroem e se mantêm sobre os pilares do poder, dos músculos e das
armas.
No mundo moderno, a cooperação entre as nações para construir
instituições comuns internacionais deve prevalecer, mas, se uma
nação hegemônica quiser atuar
para defender seus interesses econômicos, a forma de pressão deverá ser por persuasão e força política, e não por força bruta e poder militar.
Os Estados Unidos, após 11 de
setembro de 2001, abandonaram
os princípios de liberalismo econômico, partindo para um nacionalismo defensivo, usando o poder da força bruta, querendo garantir fornecimento incondicional de petróleo e sobrepujando todos os países do mundo pelo poder econômico, isto é, utilizando a
máxima: "Ou se está a favor do
império ou contra o império".
As instituições comuns internacionais foram completamente
abandonadas pelo império. Não
resta nenhuma dúvida de que a
falência da Organização das Nações Unidas é incontestável. A
não-adesão ao Protocolo de Kyoto e ao Tribunal Penal Internacional é outra manobra do império, assim como o fracasso de
qualquer tentativa de negociação
das políticas agrícolas na Organização Mundial do Comércio nos
faz antever a construção de uma
nova ordem mundial, aposentando-se esses órgãos em que o contribuinte principal é o império.
Como tema para reflexão, poder-se-iam revitalizar tais órgãos,
baseados na cooperação internacional, caso contrário teremos o
abandono da teoria do multilateralismo em favor do bilateralismo, com pressões econômicas do
império sobre os demais países.
Em essência, neste século 21,
mesmo que no concerto das nações possam existir lideranças hegemônicas, tais lideranças devem
primar pela força da razão, e não
pela razão da força, atuando como genuínos "Primus Interpares", e não como epicentros absolutos e incontestáveis.
Será prematuro indicar que o
poderio do império prevalecerá
em detrimento das instituições
multilaterais, pois a consciência
da opinião pública mundial, com
uma nova dinâmica de cidadania e ética nas relações internacionais, deverá mudar esse cenário e, com certeza, prevê-se uma
nova ordem mundial, baseada
nos interesses de cooperação internacional. Caso contrário a pobreza e a falta de tolerância instigarão novos conflitos bélicos, e
mais vidas humanas inocentes serão sacrificadas para dar vazão
aos interesses da falsa noção de liderança do império.
Michel A. Alaby, 55, é presidente da
Adebim (Associação de Empresas Brasileiras para a Integração de Mercados) e
consultor de comércio exterior.
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