São Paulo, quarta-feira, 21 de abril de 2004

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LUÍS NASSIF

Os analistas do analista

O carnaval em torno do relatório do banco JP Morgan durou um dia, mas foi completo, com escola de samba e tudo. Durante todo o dia em que o relatório foi divulgado, analistas transbordaram explicações, sustentaram que a ficha do mercado havia finalmente caído e tudo o mais, em uma demonstração acachapante da falta de compreensão sobre estratégias de portfólio.
Há dois tipos de investidor: o que busca retorno no fluxo de resultados e o que trabalha com arbitragem de preços. O primeiro é conservador, aplica em um país ou em uma empresa e fica sentado aguardando os dividendos periódicos que pingam em sua conta.
O segundo é agressivo. Seu negócio é comprar um ativo na baixa e, quando se julga que bateu na alta, vender e comprar outro ativo que esteja na baixa. Depois, quando o primeiro ativo se tornar novamente barato, voltar para ele.
Para tanto, o que vale é a avaliação da perspectiva de valorização dos papéis de cada país, não a qualidade da economia em si. Suponha o país A, que vale 10 no mercado, e o país B, que vale 100. Se o país A pular de 10 para 12, será muito mais atraente que o país B indo de 100 para 102, por exemplo.
Por isso mesmo, supor que o papel de qualquer país, por mais sólida que seja a economia (o que não é o caso da brasileira), permaneça para sempre com recomendação de compra é não entender nada a natureza das estratégias financeiras.
Sempre a um período de recomendação de compra de títulos de qualquer espécie se segue outro de recomendação de venda. Se não, que raios de capital especulativo seria esse?
No caso do JP Morgan, a recomendação do analista foi reduzir o percentual de aplicações no Brasil em pouco mais de um ponto -de 48,7% para 47%- e transferir esse percentual para o México. O estrondo das análises durante o dia dava a impressão de que o analista em questão tinha recomendado a fuga de todo o investimento do país, em desabalada carreira. E a sugestão era simplesmente alocar um ponto percentual da carteira em papéis do México! O que se fez foi julgar que os papéis do México tinham uma pequena possibilidade de se valorizar mais que os papéis brasileiros. E poderia porque se consideraram os papéis mexicanos baratos ou os brasileiros caros. Só isso.
A partir daí, o que se viu foi aquela mesma saraivada de explicações futebolísticas que se seguem a qualquer final de partida de futebol. A razão da recomendação negativa teria sido o receio de aumento do salário do funcionalismo, o aumento do déficit da Previdência Social, o pé chato do presidente Lula, o botox do ministro A, qualquer explicação serve.
Quando é que a análise financeira vai amadurecer? Quando é que se vai entender que essas avaliações de departamentos econômicos de bancos estrangeiros podem eventualmente acertar ou errar, mas não têm a menor importância para a avaliação de um país? Quando é que se vai entender que faz parte da estratégia financeira de qualquer fundo volátil trabalhar com arbitragem de preços, e não com fluxos de retornos?
O problema não é o analista. São os analistas do analista.

E-mail -
Luisnassif@uol.com.br


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