São Paulo, domingo, 21 de maio de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

"Efeito EUA" poderá levar dólar a R$ 2,40

Equipe econômica apresenta a Lula diagnóstico de eventual impacto de alta prolongada dos juros norte-americanos

Para auxiliares, chance de reeleição do presidente não seria afetada por mudança para pior do cenário financeiro internacional

VALDO CRUZ
DIRETOR-EXECUTIVO DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

SHEILA D'AMORIM
KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A equipe econômica prevê que uma ação prolongada de aumento dos juros nos EUA possa elevar o dólar a uma cotação entre R$ 2,30 e R$ 2,40.
Segundo apurou a Folha, essa avaliação foi apresentada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva nos últimos dias, quando auxiliares discutiram o início de uma mudança para pior, ainda que moderada, do cenário econômico internacional.
Ao primeiro sinal de que a trajetória de alta dos juros nos EUA possa se prolongar, desconfiança desencadeada pela alta inesperada da inflação naquele país, Lula pediu uma avaliação da equipe econômica.
Na quinta-feira, o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, e o ministro Guido Mantega (Fazenda) fizeram a avaliação sobre eventuais impactos no Brasil que foi transmitida a Lula. Nos dias anteriores, o mercado financeiro viveu momentos agitados por causa da divulgação dos dados de inflação nos Estados Unidos.
Nas palavras de um auxiliar direto do presidente, concluiu-se que o Brasil está mais preparado para absorver choques externos e que não seria afetada negativamente a possibilidade de o petista se reeleger.
O ano de 2006 estaria economicamente salvo, diz um membro da cúpula do governo. A preocupação será com a sustentabilidade do crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) no longo prazo a partir de 2007. Desde 2003, quando assumiu o poder, Lula convive com um cenário internacional favorável que contribuiu para o país fazer um forte ajuste de suas contas externas.
A equipe econômica avalia que uma turbulência internacional, desde que moderada, ajudaria a resolver o que o governo considera o seu maior "problema" hoje: uma excessiva valorização do real em relação ao dólar.
Daí a avaliação de que um eventual "efeito EUA" levaria o dólar a sair do patamar atual (entre R$ 2,10 e R$ 2,20) para outro entre R$ 2,30 e R$ 2,40.
"Até 2002, quando a economia dos Estados Unidos pegava um resfriado, a economia brasileira contraía uma pneumonia. Hoje, pegaria um resfriado", diz um membro da equipe econômica.

Efeito EUA
Somente o anúncio na semana passada de que o índice de inflação norte-americana ao consumidor havia ficado 0,1 ponto percentual além das expectativas foi suficiente para que a taxa de câmbio, que no início do mês estava abaixo de R$ 2,10, chegasse a R$ 2,18 na quarta-feira.
Além disso, o risco-país subiu mais de 6% e a Bolsa de Valores brasileira caiu 2,86%, acompanhando uma tendência registrada em boa parte das economias emergentes.
No cenário traçado pelo governo, uma mudança no front externo não significa necessariamente uma alta abrupta dos juros nos EUA. Com isso, a avaliação é que só irão sofrer realmente as economias que estão fragilizadas. Isso porque toda vez que os juros americanos se elevam, aumenta a atratividade dos títulos daquele país perante os investidores, que tendem a retirar dinheiro de outras economias para investir nos EUA. A aplicação lá é considerada menos arriscada.
No caso do Brasil, argumenta-se, houve uma preparação com bastante antecedência e isso inclui o aumento das reservas internacionais, que estão em torno de US$ 63 bilhões, a melhora no perfil da dívida, com redução dos títulos corrigidos pela variação do dólar, e o ingresso elevado de dólares por conta do crescimento das exportações.
Com isso, acredita-se que, ao contrário do mercado internacional, que não estava incluindo nos preços dos ativos uma alta mais forte nos juros americanos neste ano, o Brasil já estaria devidamente preparado para essa possibilidade. E os investidores estrangeiros já contariam com isso.
Segundo a Folha apurou, a equipe econômica disse ao presidente que os investimentos no Brasil estão sustentados nos fundamentos econômicos tidos como sólidos. Daí, alegam, é "muito pouco provável que aconteça algo na economia que abale o processo eleitoral".
Por essa análise, o discurso de Lula ressaltando os ganhos com crescimento, queda da inflação e melhora na renda estaria garantido.
Para um interlocutor do governo, a elevação dos juros americanos além do previsto terá mais impacto "para a mídia e na avenida Paulista" do que na economia real, em que as pessoas "continuarão com emprego, aumento da renda e do consumo".
Pelos dados repassados ao presidente Lula, no terceiro trimestre deste ano -às vésperas do primeiro turno da disputa presidencial- a economia brasileira deverá registrar crescimento anualizado superior a 4%, que é a estimativa do encerramento do ano.
No mesmo período de 2005, a produção registrava retração e isso gerou grande desconforto entre a equipe econômica e o presidente.
Esse dado foi decisivo para o presidente optar por um ajuste na política econômica. Como o BC alegava que não era possível baixar os juros rapidamente e ressaltava os riscos disso para 2006, a alternativa foi acelerar gastos os públicos.


Texto Anterior: Luís Nassif: Patiño e o cobre da Bolívia
Próximo Texto: Aloizio Mercadante: Criminalidade e economia
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.