São Paulo, quarta-feira, 21 de junho de 2000


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TELECOMUNICAÇÕES
Cartas entre executivos mostram que pagamento de ágio e contratação de intermediador geraram impasse
Sócios trocam acusações na negociação

ELVIRA LOBATO
DA SUCURSAL DO RIO

Os cinco dias que antecederam o prazo final fixado pelo governo para que a Telefónica de España concluísse a venda da CRT (Companhia Riograndense de Telecomunicações) à Brasil Telecom foram marcados por acusações entre os integrantes do lado comprador.
A crise entre os acionistas da Brasil Telecom -Opportunity, Telecom Italia e fundos de pensão- explodiu na noite de quinta-feira, após a tensa reunião do conselho de administração da empresa que deveria ter aprovado a proposta de compra da CRT.
Três cartas trocadas entre executivos que participaram da negociação, obtidas pela Folha, revelam os bastidores da crise.
A mais explosiva delas foi assinada, anteontem, pelo presidente do conselho de administração da Brasil Telecom, Modesto Carvalhosa, e enviada à direção da Telecom Italia no Brasil. No texto, Carvalhosa afirma:
""O impasse na efetivação da compra das ações majoritárias da CRT deveu-se à conduta desleal de V. Sas. ao usurparem as competências do conselho de administração da Brasil Telecom, negociando diretamente com a Telefónica de España o pagamento de um ágio de US$ 100 milhões sobre o valor limite que havia sido aprovado pelo órgão em janeiro corrente."
Em outro trecho da carta, ele acusa a Telecom Italia de má-fé e prossegue: ""Confesso que com quase 50 anos de atividade advocatícia, jamais vi um ato tão afrontoso aos interesses de uma companhia e de seus acionistas, praticados por um de seus sócios controladores (...)".
O texto de Carvalhosa foi redigido em resposta a outra carta, de 15 deste mês (quinta-feira), assinada por dois representantes da Telecom Italia no conselho da Brasil Telecom, Carmelo Furci e Altamiro Boscoli, na qual os italianos expunham seu descontentamento com a reunião, estopim da crise.
Durante a reunião, o Opportunity propôs a contratação do publicitário Mauro Salles como negociador com os espanhóis. Sua missão: convencer a Telefónica a aceitar um valor inferior aos US$ 850 milhões que já haviam sido propostos em fevereiro deste ano.
Naquela reunião, a direção da Brasil Telecom entregou aos conselheiros um novo laudo de avaliação da CRT, feita pela consultoria KPMG, que apontava a faixa de US$ 645 milhões a US$ 747 milhões para a empresa. Um laudo anterior, da Salomon Smith Barney, contratado pelos compradores, avaliara a CRT em até US$ 850 milhões.
A Telecom Italia não gostou da contratação do intermediador. ""Estamos muito receosos de que a contratação (...) represente um ato de desconfiança na administração da companhia, que conduziu meses de negociação", afirmava a carta.
Em outro trecho, os italianos diziam temer que o aparecimento do intermediário pudesse arruinar a conclusão da compra e que os acionistas fossem responsabilizados pelo fracasso.
"Desnecessário dizer que a falha em completar a aquisição da CRT neste prazo (até 19 deste mês) pode causar consequências desastrosas para companhia, seus administradores e seus acionistas, que podem ser responsabilizados pelos substanciais danos que podem ocorrer", diz o texto.
A terceira carta, também datada de segunda-feira, foi enviada por Mauro Salles ao presidente da Telefônica, Fernando Xavier Ferreira.
Nela, Salles relata seu desapontamento com o banco Crédit Suisse (indicado pela Telefónica de España para representá-la na negociação com a Brasil Telecom), que se recusara a renegociar o preço de venda da CRT.
Salles tenta convencer Xavier a aceitar a renegociação argumentando que, se não houvesse acordo, a Anatel tomaria providências drásticas, que afetariam a ""imagem vitoriosa" do programa de privatização da telefonia brasileira.
""As consequências políticas, nacionais e internacionais, serão fortes e previsíveis", advertia Mauro Salles.
Além das três cartas obtidas pela Folha, outras correspondências foram trocadas até momentos antes de a Anatel anunciar a intervenção na CRT.
Xavier Ferreira nega que a Telefônica tenha sido inflexível. Segundo ele, a companhia tinha sido avaliada por consultores externos em US$ 1,09 bilhão. ""Apesar disso, aceitamos a oferta de US$ 850 milhões", afirmou.



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