São Paulo, quarta-feira, 21 de junho de 2000


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OPINIÃO ECONÔMICA

Seguros, o dia D mais um

ANTONIO PENTEADO MENDONÇA

Ao longo dos últimos três anos a atividade seguradora não só não cresceu em faturamento como viu seu lucro operacional minguar. As razões para isso são conhecidas e podem ser divididas em dois grandes grupos. O primeiro englobando as ações levadas a efeito pelas seguradoras. O segundo compreendendo as consequências da crise econômica que afetou o país. Como essa análise já foi feita, o que importa é olhar para a frente, e, aí, o quadro muda bastante.
Se o passado recente teve céu cinza e chuva no caminho, o futuro promete céu de brigadeiro, para um crescimento mais do que expressivo, em muito pouco tempo. Está nas mãos do setor definir se a viagem vai ser calma ou se as poucas nuvens que aparecem no horizonte serão suficientes para fazer dela um martírio, mantendo uma antiga tradição que faz da atividade seguradora nacional cópia quase fiel do Brasil.
É verdade que boa parte das seguradoras hoje existentes não deve permanecer no mercado, pelo menos com o desenho atual. A maioria por falta de escala ou competência profissional e as outras porque serão compradas ou se associarão, até com empresas estrangeiras.
É importante salientar que as principais seguradoras do mundo já estão no Brasil e que começam a colocar a cabeça para fora. Há cinco anos, entre as dez maiores empresas do setor, apenas duas eram de fora. Atualmente essa relação cresceu e cinco das dez maiores ou são diretamente controladas ou têm parcerias com grandes seguradoras internacionais.
Não é de esperar uma mudança muito grande nessa ordem, mas ainda há espaço para fusões e aquisições envolvendo as maiores companhias de seguros em operação no Brasil e só isso já é combustível suficiente para acelerar o desenvolvimento do mercado. E o melhor de tudo é que esse é o combustível menos potente entre todos os que devem levar o setor de seguros a um patamar muito mais alto do que o atual em relação ao Produto Interno Bruto do país.
Com uma participação ao redor de 2%, a atividade seguradora tem espaço de sobra para crescer até os 5% ou 6% dos países latinos mais desenvolvidos. E isso quer dizer que, só por inércia, por demanda reprimida, a atividade pode, em poucos anos, passar a responder por 3,5% do Produto Interno Bruto, dando, até o final de 2003, um salto impressionante no seu faturamento.
Quando, em 1994 e 1995, o setor de seguros teve o seu grande período de desenvolvimento, crescendo três vezes o seu tamanho em pouco mais de um ano e meio, na base dessa explosão não estavam novas estratégias de marketing nem ações ousadas das seguradoras, mas apenas e tão-somente a estabilidade da moeda, que trouxe à tona uma demanda reprimida muito maior do que a imaginada, mostrando que brasileiro não contratava seguro apenas em razão da inflação.
Uma das principais causas da estagnação do mercado nos últimos três anos foi justamente a volta da crise econômica, que sangrou o poder aquisitivo do país, deixando a população descapitalizada para qualquer tipo de investimento, além da sua subsistência. Não havendo investimentos novos, não há riscos para ser segurados e, mais grave ainda, não havendo emprego nem dinheiro, não há sequer como manter os seguros existentes, porque a renovação das apólices deixa de ser prioritária.
Com a retomada do crescimento nacional, apontada como consistente por todos os indicadores econômicos, o mercado, que é um bom termômetro, já sente de novo o aumento do interesse pela contratação de novos seguros. E esse é o primeiro degrau para o setor chegar aos 5% do PIB anteriormente citados.
O segundo passa pelas reformas constitucionais, que começam a ser implementadas, com ênfase na da Previdência Social, já se refletindo na demanda por planos de previdência privada aberta, que fazem parte da atividade seguradora.
Se tomarmos o número de pessoas que hoje têm um plano de saúde privado e aceitarmos que elas são as contratantes potenciais dos planos de previdência, teremos um número próximo de 40 milhões de indivíduos, dos quais só uma parte ínfima, hoje, possui algum tipo de aposentadoria complementar.
É por isso -e pela certeza de que Previdência Social chegou ao fim da linha- que os produtos como os PGBL estão crescendo e despertando tanta atenção. Além deles, a reforma da Previdência deve incrementar também os seguros de vida e, provavelmente, forçar a privatização do seguro de acidentes do trabalho.
Mas o setor tem também problemas sérios que precisam ser enfrentados. No curto prazo, o mais grave é a alta sinistralidade do seguro de automóveis. Sem ações enérgicas para diminuir esse índice e para reajustar os preços, o mercado continuará perdendo dinheiro com sua maior carteira.
Além disso, o seguro-saúde está ameaçado de ser retirado das seguradoras e, dependendo da privatização do seguro de acidentes do trabalho, o mercado poderá estar recebendo um mico. Assim, as seguradoras, mesmo em um cenário francamente positivo, precisam tomar cuidado e investir em profissionalização para não tropeçar nas próprias pernas.


Antonio Penteado Mendonça, 47, advogado, é consultor especializado em seguro e previdência e professor da FGV-SP (Fundação Getúlio Vargas).
E-mail - pentmend@penteadomendonça.com.br


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