São Paulo, terça-feira, 21 de novembro de 2000

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OPINIÃO ECONÔMICA
Nuvens negras e Sol

BENJAMIN STEINBRUCH

No ano passado, quando o otimismo dominava os discursos públicos, a expressão "exuberância irracional" foi muito usada pelos analistas mais cautelosos. Ela havia sido tirada do título de um livro do economista americano Robert Shiller, que analisava o sentimento geral a respeito da Internet e da nova economia -em 96, a expressão já havia sido utilizada pelo presidente do Fed, o BC dos EUA, Alan Greenspan, para alertar o país sobre os riscos do mercado financeiro.
Parece pouco racional que, em tão pouco tempo, o clima geral de otimismo em relação à economia tenha mudado tão rapidamente. Mas, de qualquer forma, há uma série de fatores reais atuando ao mesmo tempo para determinar esse comportamento: os preços do petróleo subiram muito e continuam bem além da fronteira psicológica de US$ 30 o barril; agravou-se o conflito no Oriente Médio; a economia americana está sob a ameaça do "hard landing", ou a aterrissagem forçada, que significa a queda brusca da taxa de crescimento; e, para nós brasileiros, a Argentina entrou em crise financeira e teve de recorrer outra vez ao Fundo Monetário Internacional para cumprir seus compromissos externos.
Ao analisar aqui na Folha esse tema, o jornalista Celso Pinto lembrou muito apropriadamente a Lei de Murphy, segundo a qual sempre que há uma chance de uma coisa dar errado ela vai dar errado. A sensação, neste momento, é que tudo o que poderia dar errado está dando errado.
Olhando para a economia brasileira, porém, o jornalista observou que ainda é cedo para ser excessivamente pessimista. Há, de fato, nuvens negras no horizonte, mas ninguém pode afirmar com certeza que elas vão descarregar, todas ao mesmo tempo, tempestades sobre a economia. Por isso não convém adotar desde já comportamentos derrotistas. Como escreveu Robert Kutiner, na última edição da revista americana "Business Week", a exuberância irracional não deve dar lugar ao "pessimismo irracional".
Muitas crises ocorrem porque ocorrem. Algumas, como a de 1929, surgem por razões bastante objetivas. Mas nem sempre é assim. A crise das Bolsas brasileiras de 1971, por exemplo, não surgiu por razões muito objetivas. Não havia ainda o choque do petróleo, que só se deu em 1973, e a economia brasileira crescia a taxas bastante elevadas.
Análises objetivas indicam que a economia americana, de fato, desacelerou. Passou de uma taxa anual de crescimento de 5,7% no segundo trimestre para 2,5% no terceiro. Mas já completou 115 meses de crescimento contínuo, e os EUA contam hoje com uma administração muito competente do seu BC no manejo da taxa de juros. A inflação americana, que havia chegado a 0,5% em setembro, já caiu para 0,25% em outubro. Na prática, a queda da inflação indica que não será necessário promover novas elevações dos juros, o que ajuda a manter a economia um pouco mais aquecida.
Assim, não há tanta certeza sobre a inevitabilidade do "hard landing". Isso vai ocorrer se os americanos cultivarem o pessimismo irracional. Eles nunca pouparam tão pouco e gastaram tanto quanto agora. Se, movidos pelo medo, reduzirem drasticamente o consumo, então, sim, virá a aterrissagem forçada.
A crise aguda do Oriente Médio, embora complicada, também não é insolúvel. Apesar de tudo, as duas partes continuam negociando. Os preços do petróleo também não devem subir mais. A crise argentina, tão determinante para o Brasil, igualmente caminha para uma solução. Um acordo com o FMI já está desenhado e pode significar um aporte de recursos da ordem de US$ 20 bilhões para o país vizinho.
Além disso tudo, há outros fatores positivos. A economia japonesa, estagnada há quase dez anos, dá sinais de reativação. A Europa, a despeito da fraqueza do euro, também apresenta bons índices de expansão. No Brasil, estamos em crescimento em praticamente todos os setores, a inflação foi zero em outubro e até as finanças públicas, embora ainda tenham enormes problemas, já não estão tão desarrumadas como antes.
Não é hora, portanto, de dar tanta importância à Lei de Murphy nem de se deixar contagiar pelo pessimismo irracional. Existe o Sol atrás das nuvens negras.


Benjamin Steinbruch, 47, empresário, é presidente dos conselhos de administração da Valepar e da Companhia Siderúrgica Nacional.
E-mail - bvictoria@psi.com.br



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